António Costa está completamente alinhado com Mário Centeno na defesa dos 0,7% como meta do défice para 2018. BE e PCP tinham a expectativa de que o primeiro-ministro pudesse fazer o ministro das Finanças recuar no número inscrito no Programa de Estabilidade, mas Costa não vê motivos para ceder à esquerda.
Mais: António Costa acredita que os 0,7% são já um défice no limite máximo, tendo em conta o ritmo de redução do défice estrutural que já estava previsto no Programa de Estabilidade de 2017.
O crescimento económico, a descida dos juros e a diminuição da despesa com prestações sociais permitem ao Governo baixar o défice do 1% (ou 1,1% se se tiverem em conta os efeitos dos incêndios de 2017) para os 0,7% sem mexer em mais nada. Por isso, no governo não se aceita a ideia – defendida por BE e PCP – de que este novo número comporta uma margem de cerca de 800 milhões de euros que poderia ser usada para aumentar o investimento público.
“Por um lado, há o compromisso assumido com Bruxelas no que toca à redução do défice estrutural, mas além disso há a importância de usar este bom momento da economia para reduzir o peso da dívida. Num momento de crescimento económico, devemos diminuir ao máximo o défice para ter margem para resistir a crises. Isso é o que está nos livros e é o que é sensato fazer. Ninguém sabe durante quanto tempo vamos ter este nível de crescimento”, explica uma fonte próxima do primeiro-ministro.
Ontem, o Conselho de Ministros aprovou o Programa de Estabilidade, mas o Governo optou por não fazer uma conferência de imprensa. No comunicado da Presidência do Conselho de Ministros, lia-se apenas que “o Programa de Estabilidade assume a continuidade da estratégia de política económica e orçamental definida no Programa de governo”.
Hoje, o documento é entregue no parlamento, mas a sua discussão só será feita no dia 24. Nessa altura, o i sabe que o BE deve mesmo avançar com um projeto de resolução.
Os termos em que será redigido ainda estão em aberto, mas o texto dificilmente poderá ser aprovado pela direita – da mesma forma que BE e PCP não irão aprovar o projeto de resolução do CDS – pelo que não terá efeitos práticos.
BE aumenta pressão A ideia do BE é marcar uma posição política, lembrando ao governo que há apenas quatro meses houve acordo em torno de um défice de 1% no Orçamento do Estado para 2018. “Vamos aumentar a pressão”, assume um dirigente bloquista, que recusa a ideia de que isso se traduza num chumbo anunciado do Orçamento do Estado de 2019.
“Ainda é muito cedo. Vamos negociar”, insiste a mesma fonte bloquista, numa declaração que está em linha com o sentimento dominante no PS e no PCP. Nenhum dos partidos que faz parte da solução governativa encara este momento tenso como um sinal de que o próximo Orçamento está em risco.
Por isso, as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa, que abriam esta quarta-feira a porta a eventuais eleições antecipadas, são desvalorizadas no PS, no BE e no PCP. “Ainda é muito cedo para estar a falar no Orçamento de 2019”, vai-se ouvindo nos três partidos à esquerda.
O ponto de partida é o mesmo: BE e PCP não passam cheques em branco e só tomam posição depois de verem o Orçamento. Há, contudo, uma coisa que mudou. Os acordos assinados à esquerda estão esgotados. E isso torna mais difícil e mais imprevisível a negociação do Orçamento do Estado para 2019.
Negociação difícil Se até agora, os acordos firmados com BE e PCP serviam de guião para as negociações, este ano vai ser preciso encontrar novas medidas que assegurem o voto favorável da esquerda.
O problema é que o governo não vai querer assumir compromissos que impliquem despesas que criem patamares de aumento que tenham repercussões não só em 2019, mas em todos os anos que se seguem.
É por isso que António Costa e Mário Centeno não querem aumentar os salários da Função Pública e dificilmente farão novos aumentos extraordinários de pensões. É que o aumento salarial dos funcionários públicos corresponde a assumir um compromisso em relação ao qual não há recuo: em caso de crise, não será possível diminuir essa despesa. E as pensões já devem sofrer aumentos por estarem indexadas ao crescimento económico. “Vai ser uma negociação particularmente sensível”, assume uma fonte socialista.
a resposta a marcelo Com estes dados em cima da mesa e as eleições a começarem a aparecer no horizonte, o discurso vai-se tornando mais duro, quer do lado do BE e do PCP, quer do lado do PS. Mas, pelo menos para já, as palavras não são para passar aos atos.
E, depois de o Presidente da República ter dito que “uma crise política é indesejável e uma crise política envolvendo o OE é duplamente indesejável”, o líder parlamentar do PS veio assegurar que não há crises pré-anunciadas em torno do Orçamento. “A questão que se coloca do ponto de vista da estabilidade política é a aprovação do Orçamento do Estado e sobre esta matérias as declarações dos partidos que apoiam o Governo têm sido de garantir a estabilidade e de garantir uma negociação que permita que o próximo Orçamento seja responsável, que honre e dignifique a maioria que tem apoiado o Governo”, afirmou ontem Carlos César.