Manuel Alegre sempre se assumiu como um apoiante da geringonça, mas isso não o impede de fazer críticas à atuação do governo. Numa carta aberta ao primeiro-ministro, publicada no jornal “Público”, o militante histórico do PS mostra-se contra a proposta do executivo que discrimina a tauromaquia na redução do IVA dos espetáculos. E João Soares, que foi ministro da Cultura do governo de António Costa, concorda.
Para Alegre, o governo está a tentar “interferir nos gostos e comportamentos das pessoas”, sendo que isso “não é democrático” e “cheira a totalitarismo”. “É uma questão de liberdade. Liberdade para não gostar de touradas. Mas liberdade para gostar”, defende. Por isso, o escritor e poeta deixa um pedido ao primeiro-ministro: “interceda pela descida de 6% do IVA para todos os espetáculos, sem discriminar a tauromaquia”.
“Sim, meu caro António Costa, trata-se de uma tradição cultural e social que é parte integrante da nossa civilização. É, também, um problema que diz respeito ao emprego e à vida de milhares de pessoas. E é, sobretudo, uma questão de liberdade, que sempre foi a essência e a alma do Partido Socialista”, acrescenta.
Manuel Alegre não é o único socialista contra esta medida. João Soares, o primeiro titular da pasta da Cultura no executivo de António Costa, tem a mesma opinião. “Estou de acordo”, escreveu o socialista no Facebook ao partilhar o texto de Alegre. Contactado pelo i, João Soares não quis fazer mais comentários.
Mas as declarações do histórico socialista não foram bem aceites por todos. O único deputado do PAN, acusado por Manuel Alegre de tentar “virar o país do avesso”, classificou a posição do histórico militante socialista como “infeliz e irresponsável”, típica de alguém que “está fechado à mudança”.
“Quando queremos alterar mentalidades e temos de dar informação, isso provoca desconforto em quem sempre pensou da mesma forma, tem padrões culturais sedimentados e não está aberto à mudança”, disse à Lusa André Silva.
Também Vital Moreira deixou críticas a Manuel Alegre. Num texto publicado no blogue Causa Nossa, o ex-deputado do PS afirma que não se surpreende que a “direita mais tradicional” defenda as touradas – uma vez que “elas fazem parte integrante da cultura marialva” -, mas refere que não compreende “o que leva alguma esquerda a admirar um espetáculo tão violento e tão sangrento, assente no sofrimento causado a seres vivos indefesos, para gozo público”.
O constitucionalista considera que “não faz nenhum sentido invocar a liberdade do gosto contra uma prática violenta, cruel, sangrenta e degradante”. E garante que as touradas vão acabar e que “os intelectuais que hoje as defendem” serão olhados com “a mesma estranheza com que hoje olhamos os defensores pretéritos de outras ‘tradições’ execráveis”.