O Ruanda honra os seus mortos 25 anos depois do genocídio

França investiga a sua cumplicidade com o massacre e os órfãos ainda procuram as suas famílias

O Ruanda recordou ontem os seus mortos, 25 anos depois de um dos mais brutais genocídios da história moderna. O Presidente do Ruanda, Paul Kagame, decretou 100 dias de luto, o mesmo tempo que durou o massacre de cerca de 800 mil tútsis e hutus moderados em 1994, perante a inação da comunidade internacional. Kagame liderou as forças tútsis que acabaram com o genocídio. Ontem acendeu uma tocha no memorial na capital, Kigali, onde cerca de 250 mil vítimas estão sepultadas.

“Em 1994 não havia esperança, apenas trevas. Hoje, a luz emana deste local”, disse Kagame, que lidera o país desde o genocídio. “Somos melhores ruandeses do que éramos. Mas ainda podemos ser melhores”, considerou o Presidente, antes de se juntar à vigília no Estádio Nacional Amahoro, usado pelas forças da Nações Unidas para proteger tútsis durante a matança. 

As celebrações em honra dos caídos contaram com pelo menos dez chefes de Estado, sobretudo africanos, juntamente com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker. Foi notada a ausência do Presidente francês, Emmanuel Macron, que ainda esta semana ordenou investigações às acusações de cumplicidade francesa, através de apoio diplomático, militar e económico ao Governo supremacista hutu, que levou a cabo o genocídio. Após o assassinato do então Presidente, Juvenal Habya, setenta por cento da população tútsi foi exterminada – perto de 10% da população do país – antes da derrota do Governo. 

As sequelas ainda se fazem sentir das mais variadas formas, e muitas das 9500 crianças que ficaram órfãs no conflito ainda procuram as suas famílias. É o caso de Oswald, encontrado entre uma pilha de corpos na capital, enquanto tentava mamar no peito de uma mulher morta. Oswald contou à BBC que ainda procura rostos familiares entre a multidão, questionando-se se a sua família estará entre os sobreviventes. “Cinquenta por cento de mim pensa que os meus pais estão mortos, outros cinquenta que ainda os consigo encontrar”, explicou o jovem, que desconhece o seu apelido e a sua idade. 

“Não há nenhuma maneira de compreender completamente a solidão e a raiva dos sobreviventes. Mas, apesar disso, pedimos uma e outra vez que fizessem os sacrifícios necessários para dar uma nova vida à nossa nação”, confessou o Presidente do Ruanda. Kagame mantém um pulso firme quanto a desencorajar um discurso étnico, originando acusações de autoritarismo pela oposição. “O que aconteceu aqui nunca mais voltará a acontecer”, garantiu.