Não ao Racismo. Foi o que Marega disse. Contra tudo e todos. Gritou, gesticulou e abandonou o relvado do D. Afonso Henriques. O racismo tornou-se o principal adversário do jogador do FC Porto no jogo com o Vitória. E o maliano reagiu.
O episódio voltou a despertar a atenção para o tema e tornou-se o principal destaque da semana, em Portugal e lá fora – com o episódio a ir muito além do contexto desportivo. Apesar das opiniões divergentes sobre o sucedido, o atacante deixou a sua posição vincada: sentiu-se humilhado e continuar no terreno de jogo era, para ele, dar luz verde à situação. No final, Marega, ex-jogador do emblema vimaranense, recorreu às redes sociais para lamentar sobretudo a postura do árbitro.
Na mesma publicação, o futebolista assevera que só quis “defender a cor da pele”. Nos relatórios do árbitro Luís Godinho e dos delegados da Liga no jogo referente à 21.ª jornada da I Liga é mencionada a existência de insultos racistas dirigidos ao maliano. De resto, tudo indica que os regulamentos estipulados nestas circunstâncias terão sido cumpridos – não foi preciso, contudo, interromper o jogo, uma vez que o mesmo já se encontrava parado. Entretanto, e após a saída voluntária de Marega, não terão sido ouvidos mais insultos racistas, pelo que o encontro foi disputado na íntegra.
De sublinhar que, em julho último, o novo código disciplinar da FIFA sofreu várias alterações em áreas como o racismo e a discriminação, sendo uma das modificações mais notórias neste âmbito o poder atribuído aos árbitros para suspender um jogo de futebol por incidentes racistas, podendo mesmo dá-lo por encerrado e até atribuir a derrota à equipa infratora (ou dos adeptos infratores).
Sérgio Conceição, treinador dos azuis-e-brancos, foi o primeiro a reagir ao incidente, quando ainda o seu jogador seguia para os balneários. “Vergonha”, gritou várias vezes o técnico portista para as bancadas. Mais tarde, Conceição voltou a abordar o caso, lembrando que se tratou de uma situação inédita no futebol português. “Pergunto quantos treinadores e jogadores sabem dos regulamentos e o que fazer numa situação que foi única em Portugal? Quando vamos para o banco, levamos um caderno com esquemas táticos, não levamos um caderno com os regulamentos. Na altura, não sabíamos o que fazer. O que fizemos logo foi acalmar e estar com o Moussa Marega, isso é que é importante. Estamos e continuamos a estar”, afirmou. Uma resposta às declarações de Peter Bosz, técnico do Bayer Leverkusen, que garantiu que, se um jogador seu fosse alvo de insultos racistas, “toda a equipa abandonaria o campo”. “Aqui ninguém dá lições de moral a ninguém, temos um balneário muito unido, muito coeso, com todos a remar para todo o lado, somos uma família. No final do jogo não interessa a nacionalidade, cor da pele, altura ou cor do cabelo. É exatamente igual, somos uma família”, acrescentou ainda o técnico portista.
“Um caso de estupidez”
No universo do FC Porto destacou-se ainda o comentário de Pinto da Costa, presidente dos dragões. “Mais do que racismo foi um caso de estupidez”, afirmou o líder portista à chegada ao Tribunal, no Porto, para testemunhar no julgamento do ataque à Academia do Sporting.
“Aquilo foi uma atitude infeliz. Foi uma maneira de atingir Marega. O Guimarães também tem jogadores de outras raças e não foram ofendidos. Foi lamentável, têm de ser castigados exemplarmente para que não volte a acontecer. Mais do que racismo, foi uma estupidez”, continuou. “Para mim sempre houve igualdade, sempre vivi assim na minha infância, quando os meus ídolos no FC Porto eram de cor. As crianças têm como ídolos jogadores de muitas raças, o futebol serviu para que não exista racismo”, concluiu o presidente portista.
Ainda no início da semana, a Procuradoria-Geral da República (PGR) confirmou que foi aberto um inquérito, estando a investigação entregue ao Departamento de Investigação e Ação Penal de Guimarães.
Também o Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) instaurou um processo disciplinar ao Vitória de Guimarães. O processo já seguiu para a Comissão de Instrutores da Liga de Clubes, com os vimaranenses a correrem o risco de serem punidos com um a três jogos à porta fechada, além de uma multa.
Entretanto, a Polícia de Segurança Pública (PSP) já terá identificado alguns dos adeptos que insultaram Marega. As imagens de videovigilância têm sido fundamentais no processo de identificação de suspeitos de infrações criminais.
Segundo a lei da segurança e combate ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos estão previstas várias sanções para quem cometer este tipo de crime: impedimento de entrar em recintos deportivos, pena de prisão de seis meses a cinco anos e ainda a possibilidade de serem aplicadas coimas entre os mil e os dez mil euros.