Há um episódio da ‘crise do secretariado’ que os socialistas têm recordado especialmente nos últimos dias e que demonstram que Mário Soares – animal político e de uma raríssima intuição e capacidade de antecipação políticas – também ‘falhava’ nas suas previsões. E que envolve diretamente o atual primeiro-ministro e líder do partido.
Em plena rutura do secretariado, no início dos anos 80, António Costa perfilava-se como candidato à liderança da Juventude Socialista, apoiado pela direção cessante encabeçada por Margarida Marques, contra o algarvio José Apolinário.
António Costa decide entretanto assinar a petição para a convocação de um Congresso do PS (o IV Congresso), ao lado dos membros demissionários do secretariado e da própria Margarida Marques.
E vai pessoalmente comunicar a Mário Soares que acabara de assinar tal documento, ao que o histórico líder socialista lhe retorquiu mais ou menos nestes termos: «É pena. Você acaba de abdicar de uma carreira política brilhante por causa de uma caneta».
A verdade é que nenhum dos alinhados com os chamados ‘ex-secretariado’ – de Salgado Zenha a António Guterres e Ferro Rodrigues – acabaria por fazer parte das listas de candidatos a deputados do PS nas legislativas seguintes, com exceção da líder cessante da Juventude Socialista, Guida Marques. E António Costa acabaria por não concorrer à liderança da JS, que acabou por ser ganha por José Apolinário a Porfírio Silva.
Curiosamente, António Costa já fazia parte do secretariado da JS desde a direção de José Leitão – antecessor de Margarida Marques – lado a lado com o açoriano Carlos César, que é atualmente o presidente do partido.
Hoje, José Apolinário continua secretário de Estado das Pescas, cargo que também desempenhou com António Guterres e no primeiro Governo liderado por António Costa.