Novo regime de layoff, novas linhas de financiamento, proteção de rendimentos e o reforço do Servilço Nacional de Saúde (SNS), prorrogação automática das prestações do subsídio social de desemprego ao final do ano são algumas das linhas mestres do Programa de Estabilização Económica e Social (PEES). Os valores e medidas já foram reveladas. António Costa falou em programa «para estancar a hemorragia» provocada pela covid-19. E deixou um recado: «Não há plano que nos salve da dor» e que «esta crise está a doer e vai doer».
Certo é que os dados não são animadores. O Governo está a prever uma contração da economia de 6,9% em 2020 e uma taxa de desemprego de 9,6%, um aumento face aos 6,2% que se registavam antes da crise pandémica. E bem longe do cenário apresentado no Orçamento de Estado, que entrou em vigor em abril: um crescimento de 1,9% do PIB, uma taxa de desemprego de 6,1%, um excedente orçamental de 0,2% e uma dívida pública de 116,2% do PIB.
E apesar do PIB ter caído 25% nos últimos dias de março, estimando uma derrapagem de 13 mil milhões de euros nas contas públicas nacionais, Mário Centeno afastou a necessidade de avançar com uma política de austeridade ao lembrar que a crise não teve origem no sistema financeiro e, por isso, afastou a adoção de medidas de austeridade.
«Austeridade significa em períodos recessivos cortar despesa ou aumentar impostos. Não vamos fazer isso. Mas não vamos colocar o Estado numa situação débil», afirmou o governante, acrescentando que não está prevista igualmente uma redução de impostos para as empresas.
«Não estamos em condições de erodir a base tributária, senão o Estado não consegue responder», justificou.
Certo é que uma das medidas mais emblemáticas para aliviar os bolsos dos portugueses diz respeito ao prolongamento até 31 de março de 2021 da moratória que permite suspender o pagamento das prestações dos empréstimos bancários.
Recorde-se que desde final de março que está em vigor uma lei que permite a suspensão dos pagamentos das prestações de créditos à habitação e créditos de empresas (capital e/ou juros) por seis meses, ou seja, até setembro.
Mas com a medida agora aprovada, esta suspensão dos pagamentos com prestações de créditos é prolongada por mais seis meses, sendo também alargado o seu âmbito a despesas de saúde.
Layoff
O layoff foi uma das medidas mais aplaudidas pelas empresas e, para muitas, foi a sua salvação numa altura em que as receitas são praticamente nulas. Como forma de continuar a ajudar as empresas, o Governo anunciou a continuidade desta medida – da forma como está a ser praticada – até ao final do mês de julho, seguindo depois por outros moldes.
Segundo o PEES, depois do mês de julho serão criados três mecanismos ao layoff simplificado apesar de a atual medida continuar a funcionar para empresas encerradas.
«As empresas que permanecem encerradas por determinação do Governo continuam a poder beneficiar do regime de layoff simplificado», esclareceu o primeiro-ministro.
Por outro lado, «as empresas que tenham uma quebra de faturação entre 40% a 60% ou superior a 60% podem beneficiar, entre agosto e até ao final de 2020, de um mecanismo de apoio à retoma progressiva».
Mas as novidades quanto a este mecanismo anunciadas por António Costa não se ficam por aqui: as empresas que beneficiaram do layoff podem agora beneficiar de um incentivo financeiro extraordinário para poderem normalizar a atividade e podem escolher uma de duas modalidades: ou um salário mínimo ou dois salários mínimos por um período de meio ano.
Já as grandes empresas em layoff vão deixar de ter isenção da Taxa Social Única (TSU) em agosto. «A partir de agosto, as grandes empresas passarão a pagar a Taxa Social Única na íntegra», anunciou o primeiro-ministro, referindo-se às empresas que aderiram a este regime. No entanto, o mecanismo de apoio vai manter-se para as micro e pequenas empresas. «As micro, pequenas e médias manterão a isenção e, a partir de outubro, passam a pagar 50% da TSU», explicou. Este pagamento de 50% vigorará até ao final do ano.
Apoios extra
O apoio para trabalhadores sem proteção social, como os informais ou independentes que não descontam, será duplicado para 483,81 euros. Este apoio, que entrou em vigor em maio, abrange as pessoas que não se encontrem obrigatoriamente abrangidas por um regime de Segurança Social e que declarem o início ou reinício de atividade independente junto da administração fiscal.
O apoio é mensal e pode ser prorrogado uma vez, sendo atribuído por um período máximo de dois meses, mas implica o enquadramento no regime dos trabalhadores independentes e a manutenção do exercício de atividade por um período mínimo de 24 meses após a cessação do pagamento do apoio.
Também será criado um subsídio social de desemprego que vai ser prorrogado automaticamente até ao final do ano.
Além da prorrogação automática das prestações do subsídio social de desemprego até ao fim de 2020, o líder do Executivo referiu que será atribuído um abono de família extra em setembro com um montante correspondente ao valor base desta prestação para todas as crianças do primeiro, segundo e terceiro escalões.
Ao mesmo tempo, está previsto um novo complemento de estabilização que, de acordo com o primeiro-ministro, será «um apoio extraordinário aos trabalhadores que tiveram redução de rendimento, a pagar em julho, no montante da perda de rendimento de um mês de layoff». Este valor será no mínimo de 100 euros e no máximo 351 euros.
Novas linhas de financiamento
O programa Adaptar vai conhecer uma segunda edição, mas um dos objetivos mantém-se: ajudar as micro e as PME a adaptarem-se ao novo cenário provocado pela pandemia. Para isso, o Governo vai aumentar as linhas de crédito com garantia de Estado, no valor máximo autorizado pela Comissão Europeia, ou seja, 13 mil milhões de euros.
As empresas que já concorreram não estão automaticamente excluídas do acesso à nova linha, no entanto, «tendo em conta a sua limitação», o Governo irá procurar «assegurar a maior distribuição e o maior rateio possível entre todos», revelou António Costa.
Ao mesmo tempo, será lançado um outro programa, o Comércio.pt, no qual irá criar «incentivos à transição digital do modelo de negócio das micro e pequenas empresas, mediante a promoção do comércio eletrónico (apoio à adesão a plataformas já existentes, reformulação dos websites, etc.)».
Mas as novidades não ficam por aqui. O Banco do Fomento vai gerir um fundo de capitalização de empresas e o Estado vai pedir a Bruxelas que possa funcionar como banco de retalho. As medidas deste programa incluem um «fundo de capitalização de empresas, a ser gerido pelo Banco de Fomento, para participação em operações de capitalização de empresas viáveis com elevado potencial de crescimento, em setores estratégicos e com orientação para mercados externos», avançou o primeiro-ministro.
O Governo pretende assim ainda incentivar o «financiamento de PME [pequenas e médias empresas] no mercado de capitais, mediante um veículo especial de aquisição de dívida emitida por PME e colocação dessa dívida no mercado de capitais, através da emissão de obrigações». Mas Costa garantiu que a instituição «não vai concorrer com a banca comercial», mas «canalizar as linhas de crédito» e criar «mecanismos de financiamento», nomeadamente do Banco Europeu de Investimento (BEI) tendo em vista a agilização do seu acesso às empresas, poupar mais um grau de intermediação e, assim estimular a banca comercial a ser mais competitiva na oferta dos seus próprios produtos para o apoio às empresas.
Reforço na saúde
O Serviço Nacional de Saúde tem recebido um grande apoio nesta altura de pandemia, com o objetivo principal de suprir todas as necessidades. E o reforço vai continuar, garantiu o primeiro-ministro.
O objetivo é contratar mais 2.700 profissionais de saúde até ao final do ano para que se consiga «aumentar a capacidade de resposta do SNS nas suas diferentes dimensões».
O PEES prevê ainda um reforço de resposta de medicina intensiva. Para isso, será feito um investimento que tem como objetivo chegar a uma média europeia de 11,5 camas de medicina intensiva por cada 100 mil habitantes.
A modernização do sistema de vigilância epidemiológica e homogeneização do sistema de retribuição aplicável é também uma prioridade para que se possa «rapidamente identificar focos de infeção e cadeias de transmissão de modo a prevenir o alastramento».
Escola digital
Escolas, alunos e professores não têm ficado alheios aos efeitos da pandemia. Numa altura, em que o digital é cada vez mais usado, mesmo nas escolas, este ponto faz também parte do novo programa. Assim, está contemplado um investimento de 400 milhões de euros que visa assegurar a universalização do acesso e utilização de recursos educativos digitais. Para as escolas públicas, a aquisição de computadores, licenças software, entre outros, são algumas das prioridades, que vão incidir principalmente para alunos com mais necessidades.
O processo inclui ainda «a desmaterialização de manuais escolares e a produção de novos recursos digitais». Para que isto aconteça, também a capacitação digital dos professores está incluída.
Investimento em infraestruturas
O Governo vai lançar 523 milhões de euros em obras em escolas, equipamentos sociais, reabilitação habitacional e no combate a incêndios.
Este programa inclui trabalhos de prevenção estrutural de incêndios florestais, com faixas de interrupção de combustíveis, sendo que o Executivo prevê a «realização de 2.500 hectares/ano de faixas, para criação de condições favoráveis à supressão de incêndios rurais».
O Executivo vai também lançar um programa para a erradicação do amianto em 700 escolas do país, no valor de 60 milhões de euros, aproveitando o encerramento dos estabelecimentos de ensino devido à covid-19.