As negociações para o Orçamento do Estado de 2021 entraram numa nova fase (e decisiva) e o primeiro-ministro, António Costa, recebeu ontem em São Bento os parceiros de esquerda da anterior legislatura e o PAN. Mas não foram todos. O PCP alegou motivos de agenda para não se reunir presencialmente. Haverá um encontro, mas ainda não há data. Mais, dificilmente se realizará antes da Festa do Avante!, avançou o Observador.
Oficialmente, o PCP diz ao SOL que a reunião «está prevista e realizar-se-á de acordo com a agenda das duas partes». Os comunistas acrescentam que o Orçamento para 2021 «tem de responder a problemas inadiáveis que condicionam a vida de centenas de milhar de portugueses. Mas tem sobretudo de abrir caminho a uma política que responda plenamente dos problemas nacionais, só possível com a rutura com opções de subordinação aos interesses do grande capital e de submissão às imposições da União Europeia». O recado está dado e o tom segue a linha do PCP, que tem endurecido o discurso no diálogo com os socialistas.
Esta resposta acontece numa altura em que o próprio Presidente da República fez questão de dar alguns recados aos partidos. «Não contem com o Presidente para uma crise política», declarou Marcelo Rebelo de Sousa à margem da inauguração da Feira do Livro, em Lisboa, na passada quinta-feira. O momento escolhido por Belém para o aviso não é inocente, porque foi feito na véspera dos encontros entre António Costa e três partidos: o BE, o PAN e o PEV, recebidos em separado.
Marcelo carregou nas palavras para dizer que não alinha em crises políticas, porque «isso é uma aventura» ou mesmo uma «ficção». A caracterização deste cenário, recorde-se, foi feita na Feira do Livro. «Desenganem-se os que pensam que, se não houver um esforço de entendimento, vai haver dissolução do Parlamento no curto espaço de tempo que o Presidente tem pela frente para isso, que é até ao dia 8 de Setembro», reforçou o chefe de Estado, aludindo aos impedimentos constitucionais para dissolver o Parlamento, seis meses antes do fim do mandato presidencial, e seis meses depois. Por fim, deixou um conselho: «Ninguém é obrigado a violar a sua consciência, mas estão todos obrigados a pensar no interesse nacional», argumentou Marcelo Rebelo de Sousa.
Ora, do lado do BE qualquer entendimento com o PS (que já pediu um acordo para a legislatura com os parceiros da anterior legislatura) tem que acautelar o que foi acordado no anterior orçamento. E aqui entram três motivos: o fim do fator de sustentabilidade para as chamadas profissões de desgaste rápido (aprovado já em Conselho de Ministros na passada quinta-feira), a descida do IVA da eletricidade, uma bandeira com vários anos do partido, mas também o reforço e a contratação de profissionais de Saúde – que ficou definido no Orçamento de 2020.
Em relação à descida do IVA na eletricidade, o Governo já recebeu luz verde de Bruxelas. Por isso, é expectável que possa ser concretizada ainda este ano.
O PAN não fez parte dos acordos da ‘geringonça’ de há cinco anos, mas foi sempre uma força política com a qual o primeiro-ministro contou.
Além das negociações para o Orçamento propriamente dito, há ainda um outro aspeto a ser avaliado nestas reuniões (sem espaço para recolha de imagens ou declarações públicas): o plano de recuperação desenhado pelo professor e gestor António Costa Silva. O documento deverá seguir para Bruxelas até 15 de outubro.
Neste ponto, ficou claro o que pensa a coordenadora do BE: «O Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030, elaborado por Costa Silva a pedido do Governo, olha para o interior e vê minas e eucaliptos. Nós vemos pessoas. Pessoas que têm direito à mobilidade, a mais transportes públicos e de qualidade. O investimento na ferrovia tem de ser uma prioridade. Investir no interior é fundamental para responder à crise que estamos a viver», declarou Catarina Martins na quinta-feira.