1.Esta semana foi particularmente rica em declarações relevantes, a propósito da tomada de posse de Marcelo. Inesperadamente, Ramalho Eanes e Cavaco Silva saíram dos silêncios a que há muito se remeteram, marcando a agenda política de forma clara. Um e outro não se coibiram de vir à liça, referindo aspetos que reputo de fundamentais na atualidade nacional.
Homem de cariz eminentemente social, Ramalho Eanes referiu que «o país atravessa uma mega-crise social, económica, sanitária e também de valores». Não podia ser mais claro e a chamada de atenção para o drama dos lares foi de plena oportunidade. De facto, fazíamos alguma ideia de que, no Portugal de hoje, cerca de 20 mil idosos vivem em três mil lares ilegais (os conhecidos…)?
Ainda enfatizou a urgente necessidade de reconstruir a economia, recomendando ao Governo para se deixar de ideologias e desenhar estratégias para o benefício de todos, relembrando que sendo «a crise de todos, compete aos mais instruídos e que mais receberam do país a obrigação de dar ao país tudo o que podem».
Finalmente, teve a coragem de dizer que não podemos ter vergonha da nossa história que, tendo coisas positivas e negativas, deve ser compreendida no seu tempo e espaço (como os Descobrimentos), ao contrário, digo eu, de uns quantos esquerdistas ávidos de renegar o passado em nome de uma qualquer Internacional. Salvé!
Cavaco Silva fez mossa no discurso que antecedeu esta tomada de posse, sobretudo ao referir que «a democracia está amordaçada», sustentando a afirmação em exemplos que considera ferirem a democracia, como os temas da justiça e os números da pandemia (em janeiro 2021), que são objetivos e irrebatíveis. Acrescentou ainda «a não-recondução do presidente do Tribunal de Contas e as tentativas de controlo e desqualificação e desrespeito das entidades independentes da nossa democracia, como Banco de Portugal, Conselho das Finanças Públicas, UTAO ou Cresap».
Como se vê, nada meigo para o Governo, mas sobretudo para Marcelo. Se algumas dúvidas existissem, o facto de não o ter cumprimentado no final da tomada de posse é, de per si, demonstrativo de quem era o principal alvo das suas críticas, à laia de dizer que estas situações só decorrem porque Marcelo consente.
Como respondeu Marcelo? Na tomada de posse, procurou olimpicamente seguir um caminho que não se pudesse inferir como resposta a ambos. Depois de tecer loas à democracia, preocupou-se em dar mensagens, sobretudo ao Governo, para o futuro próximo de Portugal. Referiu como vetores principais: (i) estabilidade política, (ii) desconfinar com critério, (iii) utilizar os fundos europeus (vulgo a ‘bazuca’) com clareza estratégica e transparência, (iv) preservar a coesão social na recuperação da economia, (v) renovar o patriotismo de forma integrante, centrado nas pessoas, como garante da inexistência de isolamentos (‘ilhas’).
Recados para a frente, recados para trás, fica claro que Marcelo afinal todos ouve, mas segue o seu caminho visando acima de tudo a estabilidade, absolutamente convencido que somar uma crise de Governo à crise financeira só tem uma consequência: «O povo é que sofre», como diria Variações.
Uma observação final, já que não se esqueceu de dar ênfase ao imperativo da recuperação económica, em particular, à supervisão e controlo deste Plano de Recuperação de Resiliência (PRR) que vale Eur 14 MM. Poderia ter ido mais longe, em defesa de todas as restantes preocupações expressas, sugerindo aplicações em investimentos que ajudassem a construir algo de maior benefício futuro.
2.Ora, aqui está o busílis da questão: este PRR deve ser uma oportunidade e nunca repetir os erros do passado, porque fundos não faltaram (Eur 147 MM entre 2000 e 2012) e a verdade é que continuamos a descer nos rankings europeus, sendo ultrapassados pelos países de leste, que os aproveitam para se desenvolverem estruturalmente.
Na minha opinião, este PRR como está (ideologicamente) desenhado, com uma escassa aposta no incrementar do investimento produtivo e, consequentemente, na competitividade internacional de Portugal, será um flop. Hoje vamos a tempo, amanhã pagaremos com língua de palmo as opções prioritárias deste Plano que não contribuem para o desenvolvimento do país, esquecendo que é o investimento que cria emprego e sustenta a criação de riqueza (nacional) para poder ser distribuída.
3.O futebol português de vez em quando consegue surpreender pela positiva como foi o caso da notável exibição do FC Porto em Turim. Esta exibição demonstra que quando se joga ‘dentro do campo’, temos muito mais categoria que quando se joga ‘fora do campo’. Ou se quiserem, os jogadores e treinadores são muito melhores que os dirigentes.
Claro que a semana no futebol não podia passar sem mais um escândalo, demonstrando a mediocridade dos jogos ‘fora de campo’: o caso de Rúben Amorim que aparece ‘por acaso’ quando o Sporting está no 1.º lugar, como disse António Simões, benfiquista como eu. Vamos à essência da questão: a competência, como treinador, de Rúben Amorim, é inquestionável! O resto? Secundário, mas denotando muita inveja.