Uma escolha «muito consensual», como defendeu Marcelo Rebelo de Sousa, ou um «insulto aos portugueses», como acusou o líder do CDS? A quase três anos de distância, as celebrações das cinco décadas do 25 de Abril (2024) já estão envoltas em controvérsia. Muitos sugerem que Pedro Adão e Silva, o nome apontado pelo Governo para comissariar as festividades, está a recolher os dividendos de anos de comentário político favorável ao Partido Socialista, de que se tornou militante aos 18 anos e cujo Secretariado Nacional integrou entre 2002 e 2004. Mas o próprio já reagiu às acusações. À TVI revelou que vai suspender o vínculo ao ISCTE para se dedicar a tempo inteiro à preparação das comemorações e garantiu: «Não ando à procura de empregos».
A polémica estalou quando o Porto Canal, no seu Telejornal Editorial da noite de segunda-feira, revelou as condições de que Adão e Silva iria beneficiar, em particular o salário mensal de cerca de 4500 euros (equiparado ao de um secretário de Estado), que se estende por um período de cinco anos e meio. No total, o comentador e professor universitário vai auferir qualquer coisa como 300 mil euros. E terá ainda, a coadjuvá-lo, uma ‘estrutura de missão’ composta três técnicos especialistas, um secretário pessoal e um motorista. A resolução do Conselho de Ministros determina que «podem ainda vir a integrar a estrutura de apoio técnico até quatro técnicos superiores, recrutados em regime de mobilidade».
As vozes de indignação não demoraram a surgir. Rui Rio está convicto de que a nomeação serviu de moeda de troca pelos comentários favoráveis de Adão e Silva no espaço mediático: «O PS tem os seus ‘comentadores independentes’ espalhados pelos diversos canais para vender a propaganda socialista e tentar destruir os adversários… mas esse trabalhinho tem um preço», escreveu no Twitter. «Chegou a vez de Pedro Adão e Silva receber a compensação. Pagamos nós; com os nossos impostos». André Ventura afinou pelo mesmo diapasão, dizendo que Adão e Silva, «esse comentador independente de coração socialista […] acabou por ver recompensada a subserviência a António Costa em tantos programas televisivos».
O líder do PSD exigiu explicações ao Governo, mas António Costa furtou-se à questão, respondendo apenas que considerava a «declaração tão insultuosa que, por uma questão de respeito com o líder da oposição, me exige que a ignore».
Francisco Rodrigues dos Santos, líder do CDS, também não teve meias palavras para criticar a nomeação, que considera «um insulto aos portugueses». «Num momento em que o país se vê a braços com uma grave crise económica […] o Governo não olha a meios para promover um dos protegidos do ‘socialistão’, amplamente conhecido enquanto porta-voz da propaganda socialista e comentador da bola, e oferece-lhe um cargo durante seis anos pago a peso de ouro e recheado de mordomias», denunciou em comunicado.
E até figuras da área socialista mostraram as suas reservas. No Twitter, Ana Gomes, não pondo em causa o nome do comissário – que até considera «1 boa escolha p/ organizar celebrações» – defendeu que se devia trabalhar «com a ‘prata da casa’: assessorias de PR e Governo. Qual ‘estrutura de missão’, qual carapuça…».
Face à contestação, o Presidente tentou deitar água na fervura. Revelou ter dado o seu aval ao nome de Adão e Silva, descrevendo-o como uma escolha «muito consensual». Ogeneral Ramalho Eanes, escolhido por Marcelo Rebelo de Sousa para presidir à Comissão Nacional das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, mostrou estar atento à polémica. Ao Observador, alertou contra «situações de facto consumado» e avisou que «se houver necessidade de criar problemas e assumi-los, fá-lo-ei».
Pedro Adão e Silva nasceu precisamente em 1974, o ano da Revolução dos Cravos.