"Aqui se fizeram mais de 500 anos de história. Aqui se afirmou e se afirma tanta da nossa História, tanta da nossa cultura, tanto nosso humanismo, tanto da nossa portugalidade. História de grandezas e provações. (…) Aqui o que sentimos como nosso, só o pode e dever ser por nos lembrar universal. Aqui amar o que somos é amar pessoas com nome, com rosto, com biografia escrita pelos dramas de todos os dias. Aqui tem sentido educar alguns dos nossos maiores e agradecer-lhes a vida que deram à nossa vida. Jorge Sampaio é um desses maiores – na História que sentiu, que pensou, que construiu com a suprema delicadeza de quase pedir desculpa por estar a construí-la. Na cultura que era o seu respirar, no que lia, no que via, no que ouvia, no que discernia, no que ensinava. No humanismo fundado numa ética de compaixão, de partilha e de serviço. Compaixão não condescendente, não sobranceira, não assistencial. Antes de identificação plena com o sofrimento, a privação, o abandono sem esperança. E, por isso, partilha integral e compromisso de serviço dos outros. Amou Portugal não idealmente, emoldurando-o para que permanecesse fixo numa imagem de glória e desejando que ela não se modificasse jamais. Amou Portugal como algo que precisamente por estar dentro da História, sujeito aos seus solavancos, está exposto a tantos riscos. Jorge Sampaio não amou Portugal pela força, amou Portugal pela fragilidade. Quando é o reconhecimento da fragilidade a inflamar o nosso amor a chama deste é muito mais pura. Jorge Sampaio amou Portugal no calor imparável dos seus sonhos de jovem, liberdade, igualdade, democracia, socialismo, universalidade. Amou Portugal na fraternidade para com os perseguidos e na sua defesa na barra de uma justiça pré-ordenada. Amou Portugal na militância solidária com os seus próximos, mas também com os mais distantes no universo. Amou Portugal dos sem tecto a quem ajudou a dar tecto, dos sem horizonte a quem ajudou a dar razões de esperança, o sujar as mãos de intelectual nas obras de que se fazem as casas, as escolas, as ruas, os bairros, as cidades, as metrópoles. Amou Portugal na saga do povo timorense, no abraço aos pobres vindos de fora, falando português com os moçambicanos aquando os ciclones, ou aprendendo essa fala com os estudantes refugiados sírios e ainda há dias afegãos. Amou Portugal pela fragilidade e tantas vezes na fragilidade. Mais do que isso: fez dessa fragilidade sua, de todos nós, força sua, nossa, de todos nós. Nunca quis ser herói, mas foi em tantos e tantos lanços de vida heroico – daquele heroísmo discreto, mais lírico do que épico, mais doce do que impulsivo, firme mas doce. E também por isso o recordamos com doçura e agradecemos o amor que nunca negou a Portugal, à sua maneira de amar Portugal. (…) E também por isso, Jorge Sampaio foi um grande senhor da sua e nossa pátria. Foi um grande senhor do seu e nosso mundo. Uma pequenina mas enorme luz bruxuleante, que deu e dá vida a Portugal, que deu e dá vida ao mundo".
Leia o discurso na íntegra de Marcelo Rebelo de Sousa na homenagem a Jorge Sampaio
“Foi um grande senhor do seu e nosso mundo. Uma pequenina mas enorme luz bruxuleante, que deu e dá vida a Portugal, que deu e dá vida ao mundo”, realçou o dirigente.