Sebastião Bugalho: “A direita para chegar ao poder tem de deixar de ser lobista”

Não quis entrar no Parlamento para não fazer parte da guerra interna do CDS e acredita que a direita terá de ‘descobrir o Marcelismo sem Marcelo’.

Por Vítor Rainho e Henrique Pinto de Mesquita

Disse que o seu interesse na política era praticamente romântico. Não aceitou ser deputado. Perdeu o romantismo?

Não penso que isso tenha acontecido. Não ir para o Parlamento não significa sair da política.

O Parlamento, digamos, é o casamento da política: um momento solene, de prestígio. Como conservador, ao recusar o Parlamento, está a dizer que recusa pôr uma aliança.

Mas os solteiros também se apaixonam.

Mas no seu caso é um conservador. Ou deixou de o ser?

Entendo que seja surpreendente, para alguns até incompreensível, que um tipo que se diz institucionalista não queira servir na instituição da democracia por excelência. Mas como disse no esclarecimento que enviei ao grupo parlamentar e à Lusa, depois de dar a minha resposta ao líder parlamentar Telmo Correia, as circunstâncias políticas no CDS e profissionais minhas – estou totalmente dedicado à televisão e à escrita nos jornais – não eram compatíveis, do meu ponto de vista, com ser deputado do CDS.

Já disse que o Presidente da República gosta de si por ‘ser muito bom analista político’. Falou com o Marcelo sobre esta decisão?

O Presidente da República não me deu opinião sobre este assunto (e também não lha pedi, verdade seja dita). Parece-me que, num período de convulsão política pós-autárquicas, de pandemia, de início da aplicação dos fundos europeus, o chefe de Estado tem muito mais que fazer do que falar ao telefone com um miúdo de 25 anos.

Por que não quis ir verdadeiramente?

Como lhe dizia, não só estou empenhado com o projeto televisivo que tenho – e que está em crescimento –, como o CDS está a entrar num período de convulsão interna. Como sou independente, por respeito aos militantes, não iria tomar partido nessa disputa interna. Não fazia sentido. Se me perguntar ‘se fosse presidente do CDS, preferiria ter um crítico no Parlamento – onde ele estaria limitado pelos seus deveres de lealdade institucional –, ou preferia ter esse crítico todas as semanas na televisão com a liberdade de me criticar?’ Eu, que não faço gestão política a partir de estados d’alma, preferia que ele estivesse no Parlamento.

Põe a hipótese de entrar num novo partido?

Isso seria totalmente contraditório com a minha opção de agora. Se não fui para o Parlamento é porque não tenho interesse na vida partidária neste momento.

Neste momento…

Nunca fui militante de nada: de nenhuma juventude partidária, de nenhum partido. Sou um homem livre e vou continuar um homem livre.

Nunca vai investir na carreira política e apostará numa carreira de comentador na televisão?

Estou na praça pública desde os 19 anos. Escrevo um artigo semanal há 6 anos. Nunca fiz planos. Nunca planeei ser jornalista, nunca planeei ser político, nunca planeei ser deputado, nunca planeei renunciar a ser deputado. Lido com as circunstâncias conforme elas me chegam, portanto, o futuro a Deus pertence.

Identifica-se mais com o PSD ou o CDS?

Sou um homem de centro-direita.

O PSD atual é de centro-esquerda.

Não. O líder do PSD atual é de centro-esquerda. O partido é de centro-direita.

Dizia que ‘a política é a busca constante da nobreza na dissimulação’. Está mais dissimulado do que nunca? Está no reino da dissimulação?

Não, estou no reino da liberdade. Sou senhor de mim mesmo. Aliás, isto é muito importante dizer: não represento interesses, não trabalho para empresas nenhumas, não sou lobista de nada nem de ninguém. Não sou membro de nenhum partido. Sou provavelmente dos poucos comentadores em Portugal que pode dizer isso. Digo aquilo que penso. A única pessoa a quem presto contas é a mim mesmo. Sou um homem livre.

Pode continuar a dizer mal da China?

Então não posso…

Há tempos dizia que a China era uma grande afronta para a liberdade. Continua a pensar isso? 

Continuo absolutamente. Creio que, apesar de ser um assunto que não chega nem às páginas do jornal em Portugal nem aos noticiários da televisão, houve eleições em Macau no mês passado. Estas tiveram altas limitações à liberdade por parte do Partido Comunista Chinês (PCC). Houve candidatos não alinhados com o PCC que foram impedidos de serem candidatos e de fazer campanha. E creio que, do mesmo modo que nós vimos na imprensa internacional a liberdade dos cidadãos de Hong Kong ser atacada e condicionada por Pequim e pelo Governo central chinês, também vamos assistir a isso em Macau, apesar de ser menos falado. Do mesmo modo que, pela primeira vez desde o massacre de Tianamen, Hong Kong não pôde fazer a vigília anual que sempre faz no aniversário, em Macau essa vigília também não aconteceu pela primeira vez. E é importante falar disto porquê? Para já, porque nós temos uma declaração conjunta entre Portugal e a China que diz que até 2049 as liberdades públicas e a lei portuguesa se aplicam em Macau. E, neste momento, a China está a violar diariamente e ativamente a declaração conjunta com Portugal. O caso das eleições no mês passado foi um caso flagrante disso. Houve pessoas que foram impedidas de fazer campanha e de serem candidatos. Como sabem, nada disto foi falado em Portugal. Portanto aquilo que se está a passar em Hong Kong e no Tibete está a passar-se e vai passar-se com cada vez mais força em Macau. Os únicos portugueses que vejo a falarem disto são as eurodeputadas Isabel Santos – que até é do PS e eu não conheço – e a jovem Lídia Pereira, do PSD. Os portugueses têm razões para terem orgulho na sua representação parlamentar na Europa muito graças a esta defesa da liberdade. Portugal tem uma obrigação para com os macaenses. Defendo que Portugal tem que ter as portas abertas para todas as famílias e todos os empreendedores que queiram vir de Hong Kong e Macau para Portugal. E defendo que nós, que o nosso Governo, deve facilitar a porta para a nacionalidade, deve garantir que todos os macaenses que queiram ser cidadãos portugueses possam vir para Portugal por a sua liberdade estar a ser ameaçada pela China.

Como define o estado da direita em Portugal?

A fragmentação que nós vemos na direita era a fragmentação que nós víamos na esquerda até à ‘geringonça’. Está desencontrada e perdeu a adesão popular, havendo vários motivos para isso. Não foi só o período muito difícil, mesmo que heroico, durante o tempo da governação de Pedro Passos Coelho, que teve consequências eleitorais. Por mais defensor de Pedro Passos Coelho que seja, todos temos que ter consciência disso: foi uma ferida que se abriu no eleitorado da direita (ou do centro-direita).

E ganhou as eleições, apesar dessa fratura.

A direita está cada vez mais diversa e desencontrada. Diria que o resultado autárquico de Rui Rio surpreendeu muitos, inclusivamente a mim que sou um crítico de Rui Rio. Falando do atual presidente do PSD, acredito que ele tem condições tanto para ser recandidato ao partido como para sair de cabeça erguida, porque de facto tem um belíssimo resultado autárquico. Acho que o Chega conseguiu uma implantação territorial que também ninguém estava à espera. Tem neste momento 5 vezes o número de vereadores do BE. É uma coisa impensável, teve um grande resultado autárquico. O CDS está manifestamente em queda e com vários problemas. A Iniciativa Liberal tem um crescimento mais lento porque tem uma estratégia mais cautelosa e menos populista do que o Chega. E creio que, por mais dividido que o Partido Socialista esteja, a direita ainda tem muito que caminhar até poder voltar a pensar em regressar ao poder. Parece-me que a direita, para recuperar alguma adesão e credibilidade popular e para sobreviver à ameaça populista que o Chega representa – porque o Chega ataca todos os eleitorados dos partidos originais da direita, até o da IL, porque há muito liberalismo económico no Chega –, tem de deixar de ser uma área política feita de lobistas. A direita democrática não vai sobreviver à ameaça populista do Chega se continuar a ser representada por interesses e negócios.

E esses negócios é que levam essa direita a defender a China

Não só! A direita e o PS. Por isso é que a China penetra tão facilmente em Portugal.

Porque tem apoios de um lado e de outro.

Claro! E é por isso que não há muita gente à direita que fale contra a China. E é por isso que eu digo que é importante haver comentadores livres, imparciais e que não representem interesses em Portugal. E é por isso que eu escolhi a análise política ao Parlamento: porque quero ser uma voz livre.

Mas então mudou isso no espaço de quanto tempo? Um ano e tal?

Não fui eu que mudei, quem mudou foi o CDS.
 
Não acha que é um pouco desprestigiante para si entrar num nível de discussão com Rodrigues dos Santos que chega a estar ao nível de taberna?

Tem de citar, meu caro.

Aquilo que diz de Rodrigues dos Santos e que Rodrigues dos Santos diz de si….

Fiz uma crítica política à liderança do CDS. Fazer críticas políticas é o meu trabalho.

O que tem a dizer sobre o vice-presidente do CDS, Pedro Melo, afirmar que o seu comportamento é ‘indecoroso’ quando fala do partido na televisão?

Não sei quem é esse indivíduo e duvido que a maioria dos portugueses saiba. E digo mais: se alguém desta direção do CDS considera indecoroso ter opiniões políticas distintas das dos próprios, significa que lidam mal com a democracia. E nós em Portugal estamos numa democracia, não estamos numa Igreja Maná.

Nas autárquicas, pelo que disse do CDS, quase que se esquece que manteve as 6 câmaras. 

O resultado do CDS nacional, em número de votos, é 1.4%.

Votos como? Sozinho?

Sim. Manter as câmaras era o dever de qualquer presidente do CDS.

Mas se tivesse uma desgraça tão grande seria normal que não mantivesse, não é? 

O CDS é um partido fundador do regime e é muito mais importante do que eu ou o seu atual líder. Uma coisa é certa: se o atual líder fosse sozinho a Lisboa como Assunção Cristas foi, não teria nem por sombras 21% como ela teve. E se o atual líder do CDS fosse sozinho nas legislativas como ela foi, não teria nem por sombras 4,2% como ela teve.

E continua a dizer que ‘ainda vão ter saudades desses 4,2%’?

Não é ‘ainda vão ter’. É têm. Basta olhar para as sondagens.

Há dois cenários de que se falam sobre não ter avançado para o Parlamento. Um é que não queria estar debaixo de fogo outra vez e que a comunicação social fosse buscar coisas da sua vida pessoal. Outra é que seria por uma questão meramente financeira. 

A decisão de aceitar ou não o mandato para alguém com o respeito pelo Parlamento que eu tenho nunca seria fácil. Não havia uma resposta óbvia: se aceitasse seria oportunista, se rejeitasse seria um cobarde. Portanto não havia exatamente uma decisão correta. Da vida pessoal, sou uma figura pública e tenho noção da exposição que isso representa. Ou seja, estou na televisão todas as semanas. Esse argumento não colhe. Sobre a parte financeira, não tenho por hábito falar em dinheiro nem em privado nem em público, mas esse argumento também não colhe porque teria mais um ordenado que recusei ter.

Como foi viver o drama de ter sido acusado de violência doméstica?

Não faço comentários sobre o inquérito até ele estar concluído.

Voltando ao CDS. Tem 25 anos, Rodrigues dos Santos 33. Ambos preenchem o mesmo espaço político. Fazem 8 anos de diferença e têm muitos anos pela frente. Pelo que se sabe não morrem de amores um pelo outro. Como vê esta relação no futuro, sendo que passará, talvez, pelo futuro da direita? 

O Francisco trabalha num partido, eu trabalho numa televisão. Os jornais escrevem que somos rivais e arqui-inimigos. Mas nós não concorremos em nada.

Sendo a atual direção do PSD de centro-esquerda e sendo o Francisco de uma ala democrata-cristã, logo mais conservadora, eles estão os dois suficientemente alinhados ideologicamente para representarem o mesmo eleitorado e se coligarem?

A direita está mais divergente dentro de si própria do que alguma vez teve. Nós antes tínhamos uma esquerda que não se entendia e a geringonça acabou com isso. Agora temos uma direita que não se entende – isso é factual.

E coloca o atual PSD nessa ‘direita que não se entende’?

Há uma situação no nosso sistema político que é muito peculiar: nós em Portugal, ao fim de 47 anos de democracia, temos a esquerda a representar a situação: no fundo é muito conservadora na sua ação política e nas suas políticas públicas (a única reforma que o PS fez neste segundo Governo foi a lei orgânica das Forças Armadas). A esquerda, que ancestralmente é revolucionária, tornou-se situacionista, ou seja, não se mexe. E a direita, que é ancestralmente, do ponto de vista ideológico, conservadora, tornou-se mais revolucionária: tem um discurso antissistema, contra o regime (como tem Rio). A IL tem um discurso antissistema, o Chega quer um novo regime e o CDS às vezes não se percebe muito bem mas também enveredará por aí se tiver que ir. Diria que o problema é que os polos ideológicos estão invertidos: a esquerda passou a representar aquilo que não mexe, e a direita passou a representar aquilo que quer romper. 

Se calhar isso é um ponto que sustenta o facto dos termos ‘direita’ e ‘esquerda’ estarem vazios, como dizia Ulrich Beck.

Não, acho que os homens de esquerda continuam a ser homens de esquerda e que os homens de direita continuam a ser homens de direita. 

Então a ideologia não está esvaziada?

Acho só que está ao contrário. Acho que a direita se quer voltar a ser alternativa e se quer voltar a ganhar eleições tem de fazer duas coisas: tem de recuperar a sua adesão popular – tem que deixar de representar interesses e tem de criar interessados, que é uma coisa que ainda não tem –, e depois tem de voltar a ter credibilidade e tem de voltar a fazer oposição. Tem de voltar a ter um elo de ligação com os portugueses reais. E hoje em dia essa ligação está muito apagada. Acho que Marcelo Rebelo de Sousa é uma réstia de esperança numa direita cristã, humanista, moderada, que deve inspirar quem de facto quiser ser Governo. Nós temos de descobrir o Marcelismo sem Marcelo. É a única maneira de voltarmos para o Governo.

Mas diz então que a direita tem de se rever no Marcelo?

Não. A popularidade e o sucesso eleitoral de Marcelo dizem-nos que nós temos de descobrir onde está esse espaço eleitoral – cristão, humanista, democrata liberal – só que sem o Presidente da República. Mas sobre Marcelo queria acrescentar uma nota: ao contrário do muito que se tem dito e escrito, acho que Marcelo está preparado para ser um Presidente – e atenção pois estou a ser atento às palavras – irrelevante. É muitas vezes acusado de ânsia de popularidade e até de algum populismo na sua relação com o povo. Acho que Marcelo está preparado para constar nos livros de história como um Presidente discreto. Vejam bem as palavras dele na sua última entrevista: «Não vou dissolver o Parlamento nem vou fazer um partido a partir do Palácio de Belém como os meus antecessores». Ele disse-o com respeito a Jorge Sampaio – que dissolveu o Parlamento – e pelo General Eanes – que criou um partido a partir de Belém, o PRD –, mas reparem como ele, apesar de ser uma presença constante no espaço mediático, não é particularmente interventivo do ponto de vista dos poderes presidenciais. Ou seja, é um verdadeiro magistrado de influência, e não alguém que intervém em excesso. Isso vai contra muitas das coisas que se têm dito, mas eu acho que se está a preparar para isso – e isso não é necessariamente mau para um chefe de Estado.

Muita gente de direita critica a mão que Marcelo deu à esquerda no seu primeiro mandato. Muitos sentiram-no como uma traição. 

Penso que seja uma leitura errada. Marcelo não deu a mão à esquerda, deu a mão à estabilidade política que é, como já se tornou evidente para todos, a prioridade dos seus mandatos presidenciais.

O que acha da última votação do PS?

Acho que o PS teve uma grande derrota em Lisboa, perdeu 25 mil votos – enquanto a direita só ganhou três mil votos em relação ao resultado de 2017. Duas notas: primeiro, a enorme dignidade de Medina e o modo como se tem comportado do ponto de vista institucional até agora – convidar Moedas para o 5 de Outubro ou fazer todos os possíveis para a transição ser democrática e respeitosa. Acredito que Medina ganhou dez anos de vida política com aquele discurso. As pessoas ouviram aquela dignidade na derrota, e era uma coisa que já não se via há muitos anos no PS. Depois, sobre a derrota do PS em Lisboa, também me parece ser sintomática do enorme abalroar do peso político nos centros urbanos nestas autárquicas. Perderam 11% do seu peso nos grandes centros urbanos. E isso quer dizer o quê? Três coisas: a importação que o PS fez dos chavões europeus – transição digital, energética, verde – não diz absolutamente nada ao português comum. O PS tem uma ausência de discurso sobre o presente e futuro do país. A segunda coisa é que o PS tem, hoje em dia, uma liderança bicéfala: ninguém o diz mas toda a gente o sabe. O PS é um, o Governo é um, mas há dois rostos, duas vozes e dois rumos: o de António Costa e o de Pedro Nuno Santos, e essa fratura é sem dúvida a maior fragilidade da área da esquerda hoje em dia. E uma terceira nota: não serve à direita, nem para cumprir com o seu dever dos equilíbrios constitucionais – que é fazer oposição –, ficar à espera de que o PS caia. A direita tem de fazer oposição. Tem de apresentar construtivamente uma alternativa que diga algo ao país. Aliás, o crescimento do Chega deve-se em muito à falta de energia e à falta de oposição que Rio tem feito. 

Imaginemos que era líder do PSD. Como faria oposição ao governo?

Para já, não me imagino em tais funções: não me imagino como líder do PSD nem me imagino como líder partidário nenhum se não teria ido para o Parlamento. Mas, aquilo que julgo ser mais acertado para a área do centro-direita fazer, em oposição ao governo da esquerda, é apresentar um projeto de aliança da direita democrática – como aliás Moedas fez em Lisboa com sucesso eleitoral: provou que era possível vencer a esquerda juntando só a direita democrática, ou seja, sem o Chega – e fazer uma oposição respeitosa, séria e assertiva. Um exemplo onde acho que isso não tem sido feito e que podia ter sido feito: a área da Defesa. O legado dos Governos de Costa na Defesa é absolutamente desastroso, e não falo apenas de Tancos ou desta crise institucional da demissão de Mendes Calado. É evidente que o PS não tem mão na Defesa: não só pelo modo como deixou que os feitos e o contributo inestimável das Forças Armadas no combate à pandemia fosse contaminado por polémicas e a falta de gestão do Governo nesta questão do CEMA, como também no escândalo do Hospital Militar de Belém – uma obra orçamentada em €700 mil, custou €3,2 milhões aos contribuintes e já está uma auditoria no Tribunal de Contas e no Ministério Público. A única reforma estrutural que o PS fez neste Governo foi a Defesa. E não só provocou esta crise institucional do CEMA, como não teve qualquer tipo de debate na sociedade portuguesa. Qual era a posição do PSD sobre essa reforma estrutural? Não sabemos. Na Defesa e na política externa, em particular, o PSD está completamente sonâmbulo em relação ao PS. Como é que vivemos num país, fundador da NATO, historicamente democrata e ocidental e europeísta, e nem o líder da oposição nem o primeiro-ministro falaram sobre a queda do Afeganistão? Como é possível? Portugal não tem um posicionamento no mundo? Não tem uma política externa? Não quer saber da geoestratégia? Queremos ser insignificantes?

Escreveu no DN, em agosto, que o Chega iria ‘trucidar’ o PSD. Face aos bons resultados do PSD, acha que o artigo envelheceu mal?

Não, o Chega elegeu 19 vereadores. O PSD depende do Chega para governar em Santarém.

Acha que Marcelo foi o melhor Presidente da República? 

Como eu dizia há pouco sobre Marcelo, é um Presidente que ironicamente será muito mais discreto do que todos os seus antecessores. Cavaco tentou um acordo entre António José Seguro e Passos Coelho, Sampaio dissolveu o Parlamento, Mário Soares era Mário Soares – fazia oposição ao Governo e até ao secretário-geral do seu partido a partir de Belém –, Eanes tentou fazer um partido através de Belém e teve vários governos de iniciativa presidencial. Marcelo será muito mais discreto do que os seus antecessores. 

Alguém fez um melhor primeiro mandato que Marcelo?

Ninguém foi confrontando com tantas crises quanto Marcelo: teve um país que ainda estava em procedimento de défice excessivo, um sistema político em convulsão com uma solução política inédita – a ‘geringonça’, conseguindo que ela tivesse estabilidade económica e política –, teve a crise dos incêndios e teve a crise pandémica. Nenhum outro Presidente se viu confrontando com tantas crises. A comparação com outros primeiros mandatos seria sempre injusta porque, obviamente, ele teve que lidar com muitos mais problemas.

Não obstante o saldo é positivo?

Se a sua pergunta é se o saldo é positivo, a minha resposta é que votei nele.