Orçamento de Estado. Marcelo mexe peças rumo ao “entendimento”

Marcelo quer evitar uma crise política. Nesse sentido, apela ao “entendimento” entre os partidos para o OE. Salvaguarda, todavia, não tapar os ouvidos à “democracia”.

Marcelo Rebelo de Sousa apela ao bom senso e a todos os esforços dos partidos com assento parlamentar para evitar um chumbo do Orçamento de Estado, que implicará eleições antecipadas. Estas, a acontecer, seriam em janeiro, sendo formado o Governo em fevereiro e discutido um novo Orçamento de Estado lá para abril. O mapa cronológico é do próprio Presidente da República. 

Aos jornalistas, Marcelo Rebelo de Sousa mostrou-se, além de convicto de que o Orçamento passará, favorável a que tal aconteça. O objetivo desta sua posição, claro está, é consonante com aquelas que têm sido as suas estrelas norteadores em Belém: a estabilidade política e a recuperação pós-pandémica.

Para o Presidente da República, é “natural” que, “com mais entendimento ou menos entendimento, com mais paciência ou menos paciência”, o Orçamento passe. Isto porque “o bom senso mostra que os custos são muito elevados”. E que custos são esses? Acrescendo à “paragem em muitos fundos europeus que o país precisa para a sua reconstrução”, Marcelo sublinhou o timing em que o tema surge: ou seja, “um país que sai de uma pandemia” e que, naturalmente, sairá prejudicado com uma crise política. Coloca-se então a questão: “Será que o Orçamento a aparecer em abril – supondo que era fácil aprová-lo em abril – compensava os custos todos disto?”. Respondendo à sua própria pergunta, o Presidente conclui que não: “À primeira vista, [o país] não deve ter seis meses de paragem no pior momento por causa de eleições, por causa da formação do novo Governo e da aprovação de um novo Orçamento”.

“À primeira vista”  Note-se que, não obstante a “convicção” de que o OE passará, o Presidente abre uma reserva “democrática”. E abre-a porque acredita que, em democracia, “haja sempre quem pense melhor” e quem lhe possa explicar que o novo Orçamento poderá “compensar” os custos deste chumbo. E é nesse sentido que Marcelo irá, hoje, receber em Belém todos os partidos com representação parlamentar: “Admito que haja sempre, em democracia, quem pense melhor e quem me explique que o Orçamento a sair em abril vai ser muito diferente e muito melhor, [compensando assim] tudo aquilo que é seis meses de paragem na vida nacional”. Curiosamente, o Presidente insistiu neste cenário hipotético, quase que como convidando os partidos a seguirem o seu raciocínio: “Pode ser que me digam: olhe, senhor Presidente, está enganado, porque as eleições são boas, porque vai haver uma solução mais clara no Parlamento, vai ser mais fácil chegar a entendimentos no Orçamento e o Orçamento não só vai ser muito diferente, muito melhor, como ainda por cima vai compensar esse tempo que entretanto se perdeu”.

Não obstante esta insurgência de Marcelo pelo campo do inesperado, espera-se que, perante os partidos – sobretudo perante o PCP e o BE (os que estão a bloquear a aprovação do Orçamento de Estado) –, Marcelo tenha o mesmo discurso que tem tido em público: ou seja, de procura de “entendimento”. A esses, aliás, alertou para que pensassem “duas vezes nas consequências dos passos que dão”, não querendo, todavia, ferir a sua soberania partidária: “Se entendem em consciência que vale a pena dar o passo, dão. Se entendem que o passo dado tem mais custos do que o procurar entendimentos até ao último minuto em relação a este Orçamento, não dão o passo”.

A laranja mecânica ainda treme Rui Rio agarrou-se ao facto político (eventual chumbo do Orçamento e consequente crise política com eleições antecipadas) para criar ele próprio um novo facto político inesperado: o pedido para adiar as diretas no PSD. 

Enquanto, durante a tarde de quarta-feira, José Silvano (seu secretário-geral) fazia circular uma minuta que celebrava o calendário proposto para as diretas e o congresso – 4 de dezembro e 14, 15 e 16 de janeiro, respetivamente –, passadas umas horas Rui Rio falou aos jornalistas a defender algo diferente: que fosse adiada a reunião de marcação das diretas para uma data posterior à da decisão quanto ao Orçamento. Ora, sendo que o Orçamento será, no limite, decidido a 25 de novembro, Rui Rio apela a que apenas por essa altura se decida a data das diretas. Em cima da mesa estão ainda outras opções: diretas a 8 ou 15 de janeiro e congresso em fevereiro.

O processo de clarificação no PSD começou no Conselho Nacional do partido, que reuniu ontem à noite num hotel em Lisboa e que se prolongou pela madrugada de hoje.

À entrada para a reunião, os conselheiros sociais-democratas tinham como praticamente certo que o processo eleitoral interno contará com, pelo menos, dois candidatos: o presidente em exercício, Rui Rio, e o seu concorrente Paulo Rangel.

Aliás, ontem mesmo Miguel Pinto Luz, que concorreu contra Rio há dois anos e apoiou Luís Montenegro na segunda volta, anunciou estar fora da corrida. E se aproveitou para voltar a criticar o líder, antecipou também o seu apoio à candidatura de Paulo Rangel para o momento imediatamente seguinte ao da sua confirmação pelo próprio eurodeputado.

E a confirmação chegou ao início da noite, antes mesmo de começar a reunião dos sociais-democratas. A noticia foi avançada pelo Observador: “Paulo Rangel dirá ao Conselho Nacional que avançará independentemente de qualquer calendário: com ou sem adiamento”.