Restrições podem travar crescimento

PIB, desemprego, turismo ou dívida estão a mostrar sinais de recuperação. E estão previstos crescimentos da economia. Mas as novas restrições podem travar essas subidas, alertam especialistas ouvidos pelo Nascer do SOL.

As últimas previsões económicas sobre o país não deixam dúvidas de que estamos a recuperar e as perspetivas para o futuro são as melhores. No entanto, deixa alertas: aponta para uma subida de possíveis falências, logo para um aumento do desemprego e desaconselha o aumento do salário mínimo nacional.

Ainda assim, esta semana, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) apresentou as projeções económicas para Portugal e os números são animadores: preveem uma forte recuperação da economia portuguesa, com o produto interno bruto (PIB) a aumentar 14%, entre 2021 e 2023. Na prática, a organização prevê um crescimento de 4,8% este ano, 5,8% em 2022 e 2,8% em 2023. O PIB deverá ultrapassar o nível pré-crise só à volta de meados de 2022. 

Para a OCDE «o crescimento robusto é sobretudo fomentado pela procura doméstica, e será acelerado pela absorção de fundos da UE», lê-se nas previsões económicas, onde a organização acrescenta que «o aumento atual nos custos de produção, guiado essencialmente pelos preços da energia, não deverá fomentar substancialmente as pressões subjacentes aos preços».

Para Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, não há dúvidas que as «projeções da OCDE espelham otimismo e superação da pandemia, bem como aceleração da recuperação económica afetada nos últimos meses pelas restrições nas cadeias de abastecimento e preços da energia mais elevados», diz ao Nascer do SOL.

Já Nuno Mello, analista da XTB, defende que estas previsões são «um bom sinal para a economia portuguesa», não apenas porque constituem uma revisão em alta da anterior previsão de maio de 3,7% mas também porque ficam acima das várias previsões portuguesas: do Governo,  BdP e do Conselho das Finanças Públicas (4,7%) e até da Comissão Europeia (4,5%) e do Fundo Monetário Internacional (4,4%). No entanto, o analista lembra que estas previsões, apesar de otimistas, «não têm em conta as eventuais novas medidas restritivas que possam ainda vigorar no primeiro trimestre de 2022 de modo a controlar a quinta onda pandémica».

Nas suas estimativas, a OCDE avança também que Portugal vai retomar, já este ano, uma trajetória clara da dívida pública. Paulo Rosa lembra que a proposta de Orçamento do Estado para 2022 «projetava a continuidade da redução gradual do rácio da dívida pública iniciada este ano». E acrescenta: essa proposta «esperava que a relação da dívida pública face ao PIB nominal descesse 4,1 pontos percentuais em 2022 para 122,8% de 126,9% estimado para o presente ano de 2021».

Para o economista, estes eram «números realistas face a uma projeção de crescimento do PIB nominal de 6,9% e um défice orçamental que projetava uma descida para 3,2%». Ou seja, «desde que o crescimento do PIB nominal supere o défice orçamental há lugar a uma descida do rácio da dívida pública em relação à riqueza criada em termos nominais». 

Nuno Mello destaca ao Nascer do SOL que «o endividamento da economia portuguesa continua a aumentar, mas está a subir a um ritmo mais lento que o PIB». E recorda que a economia cresceu 4,2% no terceiro trimestre deste ano. No entanto, o endividamento subiu 600 milhões de euros em setembro face ao mês anterior, fixando-se nos 764,5 mil milhões de euros.

«Ou seja, o alívio do peso do endividamento no PIB é principalmente explicado pelo crescimento económico uma vez que o volume de dívida é até superior ao registado anteriormente», diz ao nosso jornal, alertando que se as medidas restritivas se agravarem «e as administrações públicas tiverem que adotar novas medidas de apoio à economia, então muito dificilmente Portugal conseguirá começar a reduzir a dívida em 2022 e processo de ajustamento da economia portuguesa».

PIB cresce, Leão satisfeito

Certo é que os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística apontam para um crescimento do PIB de 4,2% devido ao confinamento e o ministro das Finanças, João Leão, já garantiu que a «forte recuperação da economia» vai continuar. Mas atenção: Se as restrições fruto da pandemia «aumentarem significativamente, então poderíamos ter um expressivo impacto negativo na economia», alerta Paulo Rosa. E acrescenta que «as atuais restrições parecem não ser suficientes para invalidarem uma recuperação económica e impulsionarem o crescimento económico em 2022 e 2023». 

Uma opinião partilhada também pelo analista da XTB que defende, no entanto, que este futuro crescimento não dependerá apenas da pandemia como da inflação. «Se os preços da energia e das matérias-primas continuarem a subir ao ritmo dos últimos dois anos, esse fator poderá comprometer seriamente a recuperação da economia portuguesa».

Turismo: bons indicadores 

Em Portugal, o turismo vai mostrando vários sinais de recuperação e algumas regiões até já ultrapassaram os valores pré-pandémicos. Os mais recentes dados do INE revelam que o setor do alojamento turístico registou 2,1 milhões de hóspedes e 5,5 milhões de dormidas em outubro deste ano. Crescimentos de 115,5% e 139%, respetivamente, face ao ano passado mas ainda aquém de 2019. Ainda assim, Alentejo e Madeira já registaram crescimentos acima de 2019.

No entanto, o que podemos esperar deste setor que tanto deu à economia portuguesa? «Novas medidas de restrição à mobilidade das pessoas, viagens e controlo de fronteiras poderão travar pontualmente a retoma do turismo», diz o economista do Banco Carregosa mas defende que «depois do inverno espera-se que os casos de covid-19 recuem e a economia e a vida social regressem a uma maior normalidade». 

Para Nuno Mello não há dúvidas: «Sendo o turismo um dos setores com maior peso no PIB nacional, cerca de 20%, é claro que a reabertura do setor do alojamento e hotelaria contribuiu fortemente para o crescimento de 4,2% no terceiro trimestre do ano». Mas lembra que as novas medidas em vigor desde 1 de dezembro vão afetar o setor. «Se a estas medidas forem adicionadas mais algumas, é expectável um primeiro trimestre de 2022 bastante complicado para o setor».

E como vai o desemprego?

Ainda esta semana o INE revelou que a taxa de desemprego se manteve inalterada em outubro nos 6,4%. Paulo Rosa diz que «a redução da taxa de desemprego é fundamental para mitigar as desigualdades sociais e impulsionar o crescimento económico». E, por isso, considera ser «normal que a atual taxa de desemprego espelhe ainda uma fraqueza no setor da restauração, hotelaria e turismo».

Por seu turno, Nuno Mello defende que «o mercado de trabalho tem passado quase incólume aos efeitos nefastos da pandemia na atividade económica», devido às medidas de apoio ao emprego e da adoção do teletrabalho. Mas recorda que a população empregada em outubro deste ano ainda é inferior à de 2019. Os motivos? Por exemplo o prolongamento dos subsídios de desemprego, «o que faz com que várias pessoas deixem de estar ativamente à procura de trabalho». E atira: «Neste contexto, e perante a recuperação da economia portuguesa e do maior controlo da pandemia do que no passado, considero que o emprego se poderá manter estável nos próximos meses».

Questionado sobre se esta taxa poderia ainda ser inferior quando se fala tanto da falta de mão de obra nos mais variados setores, Paulo Rosa diz que «a existir alguma divergência e fricção entre a procura e a oferta de trabalho, esta deverá ser mitigada para impulsionar a economia».

Já Nuno Mello garante que a falta de mão de obra «reflete precisamente o prolongamento dos subsídios de desemprego, o que faz com que várias pessoas deixem de estar ativamente à procura de trabalho, e os baixos salários». E não tem dúvidas que «compensa mais estar em casa do que a trabalhar».