Ao terceiro dia do novo ano, o Presidente da República promulgou o diploma do Governo que reconhece o estatuto do cuidador informal, sendo que em causa está a definição dos termos e condições deste, tal como das medidas de apoio a cuidadores e doentes. A informação foi veiculada esta segunda-feira no site oficial da Presidência da República e, nesta nota, Marcelo Rebelo de Sousa frisou que a promulgação em causa representa um “pequeno passo dado num domínio tão importante para muitos portugueses”. Importa lembrar que a primeira proposta foi apresentada em 2019, aquando da aprovação da proposta de Lei de Bases da Saúde.
No início de julho desse mesmo ano, o i explicou que a resposta não oficial para a definição de cuidador informal é cuidar de alguém, por amor, preocupação e devido aos laços familiares, sem receber remuneração. No entanto, adiantou que também há um conceito oficial: “O cônjuge ou unido de facto, parente ou afim até ao 4.o grau da linha reta ou da linha colateral da pessoa cuidada”. Esta última (pessoa cuidada) sofre de alguma incapacidade que não lhe permite desenvolver ações básicas do quotidiano, necessárias à sobrevivência, de modo independente. No entanto, a oficialização não era antiga, pois datava da sexta-feira anterior, dia em que o Estatuto do Cuidador Informal, que regula os direitos e os deveres do cuidador informal, assim como os da pessoa cuidada, havia sido aprovado por unanimidade no Parlamento.
A lei aprovada visava então 827 mil cuidadores informais e entre 230 e 240 mil pessoas cuidadas em situação de dependência. No site da Assembleia da República era possível concluir que este texto de substituição resultara da união de esforços governamentais – o projeto “estabelece medidas de apoio ao cuidador informal e regula os direitos e os deveres do cuidador e da pessoa cuidada” – mas também partidários, com projetos de resolução do BE, do PCP, do CDS-PP, do PSD e do PAN. Por outro lado, em novembro do ano passado, o i noticiou que, até ao fim do mês anterior, 2.700 cuidadores informais haviam pedido o reconhecimento do seu estatuto, tendo tentado entender o quotidiano cinco dos já 1 milhão e 400 mil cuidadores portugueses e as dificuldades que enfrentavam. Estefânia Neves, com 25 anos na altura, havia sido cuidadora informal principal da avó que teve um AVC e perdeu a independência. Infelizmente, a mesma viria a morrer no final de dezembro passado, tal como a avó de Carla Catarina Neves, jornalista em standby, como se autodefine, com 45 anos. A idosa viria a perder a vida poucos dias depois da avó da jovem anteriormente referida mas, neste caso, havia estado acamada por mais de uma década devido à doença de Alzheimer.
Apesar de serem agora "ex-cuidadoras", não desistem de lutar pelos direitos daqueles que ainda desempenham estas tarefas. Inclusivamente, nas redes sociais, Carla deixou clara a sua posição: "É só para avisar que o facto de me ter tornado ex-cuidadora informal, ao fim de 12 anos, não me vai calar nem me vai tornar menos exigente. Bem pelo contrário, vou andar muito por aqui", escreveu no Twitter, obtendo mais de 100 'gostos' até às 18h desta segunda-feira. Para além de Estefânia e Carla – fundadora da página de Facebook 'E de nós, quem cuida?' -, o i teve a oportunidade de narrar a história de Regina Mendes, de 29 anos, cuidadora informal da avó – que faleceu em novembro – a tempo parcial e residente em Amarante; de Carlos Costa, pai de um jovem com 24 anos que sofre de paralisia cerebral grave e de Tânia Vargas, de 30 anos que, em 2018, criou a página de Facebook 'O Mundo de Gonçalinho' aquando da celebração do primeiro ano de vida do filho que nasceu com osteogénese imperfeita e síndrome de Ehlers-Danlos.
É de referir que o diploma hoje promulgado havia sido aprovado no Conselho de Ministros, a 16 de dezembro, onde foram aprovadas e alargadas a todo o território continental as medidas de apoio aos cuidadores informais após o período de experiências-piloto em 30 concelhos. Neste sentido, no início de agosto do ano corrente, o i deu a conhecer que o subsídio de apoio ao cuidador informal fora atribuído apenas a 383 pessoas até ao quarto trimestre deste ano, com um valor médio de 281,96 euros. Contudo, em novembro de 2020, a Associação Nacional de Cuidadores Informais (ANCI) informara que o número de cuidadores informais, em Portugal, rondava 1 milhão e 400 mil pessoas – já frisado acima -, isto é, um valor impulsionado pela pandemia, essencialmente devido ao fecho das respostas sociais.
Segundo o relatório final de avaliação e conclusões da implementação desta e de outras medidas, elaborado por uma comissão presidida pela Segurança Social, até maio, tinham sido recebidos 2198 pedidos de reconhecimento do estatuto (ECI). Destes, 1724 (78%) diziam respeito à tentativa de reconhecimento de cuidadores principais com direito a subsídio. Acabaram por ter o reconhecimento como cuidador informal 977 pessoas, 797 das quais como cuidadoras principais. À sua vez, 474 (22%) correspondiam ao cuidador informal não principal. Mais de 400 pedidos de subsídio permaneciam ainda em análise, 94 a aguardar documentação, 5 em processo de análise adiantado e já encaminhados para deferimento e 13 perto do indeferimento.
No âmbito deste diploma, estão previstas medidas como o descanso do cuidador, a promoção na integração no mercado de trabalho ou o subsídio de apoio ao cuidador informal. Segundo o Governo, "entre as principais alterações está a simplificação do processo de reconhecimento e de atribuição do subsídio, diminuindo os prazos de deferimento e eliminando alguns documentos probatórios" e "prevê-se ainda o alargamento das referidas medidas de apoio, nomeadamente de descanso do cuidador no âmbito da Rede Nacional de Cuidados Continuados em Saúde Mental e o alargamento das condições de acesso ao Estatuto".
De acordo com dados veiculados, em 2017, pelo investigador Bruno Alves, e citados na obra 'Cuidar de Quem Cuida' – lançada em setembro de 2020 e da autoria do deputado José Soeiro, da socióloga Mafalda Araújo e de Sofia Figueiredo, da ANCI, em 2017, o valor económico estimado dos cuidados informais correspondia a 4 mil milhões de euros anuais, equivalentes a aproximadamente 333 milhões de euros mensais.