O Rio que já não corre pela sua aldeia

Rio teve a maior derrota do PSD nos últimos 39 anos. Há duvidas quanto a ter-se ou não demitido. A nova corrida para o partido começa a aquecer, com Moedas no bolso e Rangel, em princípio, de fora.

Estava tudo excitadíssimo. O ‘efeito Moedas’ era tal que a rolha do champanhe quase saía por si própria. O Zé Albino já trepava as paredes de casa. As arruadas do PSD em Guimarães e no Porto faziam lembrar as da Aliança Democrática. O cavalo ruivo ia tão acelerado que a certa altura Costa teve de pedir a Rio que tivesse “humildade”. A ‘pica’ com que os sociais-democratas se apresentavam dava a entender uma noite eleitoral com vitória prometida para seu lado.

O movimento ascendente que o PSD protagonizava nas ‘famosas’ sondagens alimentava a febre laranjinha. As tais sondagens que, mais uma vez, revelaram-se famosamente incorretas: uma, da Aximage para o DN/JN/TSF, chegou mesmo a dar a vitória ao PSD (com 34,4% contra 33,8% o PS). Erro crasso: e tudo o Costa levou.

Confirma-se, portanto, pela enésima vez, existir um país fora da bolha dos media: o dito ‘país real’. Este pronunciou-se para declarar amor a Costa e desprezo a Rio. E que desprezo: Rio teve o pior resultado do PSD nos últimos 39 anos.

Nestes, os 27,8% de ontem só encontram valor mais baixo nos 27,2% de 1983. O homem que vence tudo em casa não consegue vencer um jogo fora dela. Estas eleições tornaram claro o caso – tanto que Rio admitiu demitir-se, afirmando não saber como “seria útil  mais quatro anos”. A demissão como líder está, a esta hora, anunciada e não anunciada: formulando assim uma espécie de paradoxo de Schrödinger.

O partido está, por isso, evidentemente, em tempos complicados. E porque ficar sentado na calçada da São Caetano à Lapa à espera que Passos Coelho venha numa manhã de nevoeiro não será solução, esperam-se novidades em breve sobre quem concorrerá à liderança do partido. Para já, sabe-se que Moedas ficará no bolso e que Rangel não se deverá voltar a atirar à piscina.

Da toca já saiu Miguel Pinto Luz, que aproveitou o dia de ontem para, na TSF, recordar que no último congresso do PSD foi “o único a fazer notar que não concordava” com o caminho seguido pelo partido. Além disso, observou ainda que o partido, antes de iniciar a procura por um líder novo, deve entrar num “debate interno profundo”. A derrota de Rio, essa, considerou-a “traumática a vários níveis”, uma vez que contrastou com as garrafas de champanhe esperançosamente transportadas para o Epic Sana. Aponta, desde já, que o PSD esteja numa crise “estrutural que exige responsabilidade de todos os seus dirigentes”.

Quanto ao mistério da demissão ou não de Rio, Pinto Luz coloca-se do lado que defende que esta não aconteceu, aproveitando para elogiar o líder pelo facto de ter aberto tal porta: “Não se demitiu, dando assim tempo para que o partido respire fundo e recupere desta noite muito difícil. Isto é muito importante e, por isso, sendo eu um crítico de Rui Rio – podia-se esperar de mim outra posição –, acho que o partido tem tempo”, afirmou Miguel Pinto Luz.

Também Alberto Machado, líder da distrital do Porto, aproveitou a luz de Miguel para tecer críticas a Rio: no seu entender, os resultados no distrito são o “espelho” dos resultados nacionais do PSD: “Encontramos neste resultado eleitoral o falhanço de uma estratégia de colocar o enfoque do PSD ao centro do espetro ideológico, quando o PSD, nos últimos 30 anos, era um partido com um espetro ideológico bastante mais alargado que ia da Direita moderada ao Centro-Esquerda”, afirmou à Lusa. Ademais, notou que essa tal convergência ao centro “abriu espaço a que os partidos recém-criados” à Direita assumissem proporções “muito significativas” do ponto de vista eleitoral.