Quem irá integrar o Governo que tomará posse no próximo dia 23 de fevereiro – data já confirmada pelo Presidente da República na terça-feira – é um segredo dos deuses. António Costa diz que ainda não tem a “estrutura definitiva” do novo Executivo e só conta fazer convites “nas vésperas” daquela data. “Até lá vão circulando especulações”, garantiu esta quarta-feira, antes de receber os representantes de vários setores da sociedade civil, no âmbito de uma série de reuniões que está a levar a cabo em preparação da nova legislatura.
Feita a posse, o debate do programa do Governo deverá realizar-se na semana seguinte, ou seja, entre 28 de fevereiro e 4 de março, data em que Costa conta já estar no “pleno” da governação.
Para já, o que se sabe é que este novo Governo deverá primar pela pequena dimensão, com António Costa a prometer um Executivo “mais curto e enxuto”, como uma “task force”, ou seja, que funcione com menos ministros e apresente resultados.
A estratégia que resultou na Saúde, com Gouveia e Melo, é a que o primeiro-ministro quer ver repetida para a Economia, com o apoio dos fundos europeus e metas bem definidas, como um crescimento de 1% acima da média da Zona Euro por ano, até 2026. Neste cenário há quem antecipe um regresso de Fernando Medina à atividade política, para ocupar o lugar de ministro da Economia, que Pedro Siza Vieira deixará vago caso seja promovido a ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros – e formalmente número dois do Executivo –, uma vez que Augusto Santos Silva é o melhor colocado para presidir à Assembleia da República.
Dois meses antes das eleições legislativas, a SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) avançou com uma proposta para que haja apenas 11 ministérios, o mesmo número que tinha a primeira formação do Governo PSD/CDS em 2011, liderado por Pedro Passos Coelho.
A ideia recebeu a apreciação favorável de Marcelo Rebelo de Sousa, mas está longe dos números recordistas de António Costa nesta área. Note-se que o socialista formou o maior Governo da história da democracia portuguesa em 2019, com 19 ministérios e 50 secretários de Estado, ultrapassando o Governo de Pedro Santana Lopes que tinha 18 ministérios.
Quem também vê com bons olhos esta estratégia é Medina: “Creio que uma estrutura mais coesa, mais enxuta, com maior concentração de poder e das cadeias de decisão pode ser útil do ponto de vista da eficácia da ação do Governo”, declarou na semana passada, repetindo o chavão de Costa.
E lembrou, aliás, que um executivo mais reduzido seria o ideal, tendo em conta que o país vai “entrar numa fase em que a prioridade tem de ser a execução do PRR e estabilização dos serviços públicos, assoberbados depois de uma pandemia”.
Além de querer consolidar o poder em figuras fortes do PS, o primeiro-ministro também já admitiu a reinstalação dos serviços do Governo no edifício da sede da Caixa Geral de Depósitos, na Avenida João XXI, em Lisboa, adiantando que “a matéria tem vindo a ser estudada” e que a concentração dos serviços “permitiria muitas sinergias, uma melhor articulação do trabalho em equipa e poupar muitos recursos ao nível do funcionamento da ação do Governo” por “permitir a centralização dos serviços dos vários ministérios num único edifício”.
No entanto, a ideia de concentrar os serviços do Estado no mesmo edifício deverá ser um processo demorado e “ainda não há decisão definitiva”. “É uma longa aspiração e remonta aos anos 70. Não é seguramente para a semana que estará disponível”, ressalvou.
Na ótica do politólogo José Adelino Maltez, a hipótese de os serviços do Governo serem agregados no edifício da Caixa Geral de Depósitos é uma “boa ideia”.
“Serviços como as secretarias gerais dos ministérios poderiam ser concentrados e não haveria estes meses longos que sucedem depois de nomear um Governo, à espera da lei orgânica, que é das coisas mais ridículas do sistema político português”, afirma, em declarações ao i.
De acordo com o professor catedrático do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa, a eficácia do Governo “não depende do seu tamanho”, mas sim da “qualidade dos titulares da pasta”. Neste sentido, defende uma solução que passa pela capacidade do primeiro-ministro escolher formas de articulação em que o mesmo ministro pode acumular pastas diferentes. “Uma espécie de superministro”, aponta, dando como exemplo Mariana Vieira da Silva, atual ministra de Estado e da Presidência.
Para o investigador de Ciência Política, o grande problema atual é o artigo da Constituição que estipula que os ministérios dependem do ministro e são criados pelo ato de nomeação do Governo. “Esta fragmentação em ministérios, com nomes esquisitos, não tem lógica nenhuma. Portugal não precisa de mais que 12 ministros”, considera.
A solução que encontra diz ser “muito simples” e já adotada em vários países europeus, ou seja, a manutenção dos ministérios clássicos de soberania, como por exemplo a Defesa e Finanças, tal como estão, e, nos outros casos, devem ser nomeados ministros ‘task force’, isto é, “ministros comissários, que acumulam várias pastas, por delegação de competências”.
“Isso permitiria um Governo mais enxuto, sem sombra de dúvida. É uma questão de poupança”, argumenta, acrescentando que é necessária uma concentração tal para Portugal ter novas formas de gestão mais eficazes.
“Isso facilitaria a coordenação e estaríamos melhor servidos, porque os ministros estilo ‘task force’ poupam, concentram, disciplinam e são mais da confiança do primeiro-ministro. Não podemos ter ministérios tecnocratas”, continua.
Apesar de reconhecer que há políticos capazes de assegurar este trabalho, desconfia que se mostrem disponíveis para o fazer. Contudo, salienta que as maiorias absolutas têm essa vantagem de mobilizar os políticos para assumir cargos de ministros, porque “oferecem garantias de mais tempo” e “não há tanto clientelismo”.