A tensão entre a Rússia e Ucrânia está já a ter impactos nos mercados. O mercado bolsista não fica alheio, assim como o preço do barril do petróleo e do mercado do gás natural, de acordo com os especialistas contactados pelo i. Para Steven Santos, gestor do Banco BiG, “o sentimento de mercado já estava fragilizado pelas várias subidas de taxas de juros previstas pela Reserva Federal ao longo do ano, sendo agravado pelos riscos geopolíticos que poderão culminar numa guerra mundial”.
Uma opinião partilhada por Ricardo Evangelista, diretor executivo da ActivTrades Europe. “As ações europeias abriram esta segunda-feira em clara tendência de baixa, refletindo as perdas verificadas na Ásia e, no final da semana passada, nos EUA. Este aumento da instabilidade geopolítica é muito negativo para o apetite pelo risco, penalizando as bolsas e gerando um maior fluxo de investimentos para ativos de refúgio, como o ouro, o iene japonês e o franco suíço”.
Os impactos também se fazem sentir no petróleo que está a ser alvo de importante valorização, tendo o petróleo Brent alcançado na manhã de segunda-feira os 96 dólares por barril. “Num contexto já difícil de inflação crescente e de retirada de estímulos monetários pelos maiores bancos centrais, junta-se agora uma possível guerra mundial, iniciada por uma potência na produção energética”, diz o gestor do Banco BiG.
Também para Ricardo Evangelista, a probabilidade de que o preço do petróleo atinja os 100 dólares por barril é cada vez maior. “Dentro de um contexto de mercado em que os preços têm subido devido a oferta ficar aquém da procura, uma invasão Russa da Ucrânia iria acentuar ainda mais essa dinâmica. É praticamente certo que tanto os EUA como a UE, reagiriam através de sanções a exportações russas, incluindo o petróleo e o gás natural. Em tal cenário o preço do barril com certeza que ultrapassará os 100 dólares”, refere ao nosso jornal.
O mesmo cenário repete-se no gás natural que também negoceia em alta, “reagindo às preocupações sobre uma eventual perturbação no abastecimento a partir da Rússia, que é a principal fonte de combustível do continente europeu”. Steven Santos lembra que, “mesmo que a guerra não se materialize, eventuais sanções económicas do Ocidente contra a Rússia poderão motivar uma perturbação no fornecimento de gás natural à Europa em pleno inverno”, enquanto o diretor executivo da ActivTrades Europe chama a atenção para o facto de a Rússia ser o principal produtor e exportador de gás natural a nível global e, como tal, defende, que um eventual bloqueio das suas exportações para a Europa com certeza iria acentuar ainda mais a crise energética que se vive no continente, fazendo disparar os preços”. A eletricidade, que continua a ser gerada maioritariamente a partir de combustíveis fósseis, com certeza que também está exposta a esta dinâmica, sendo provável que um agravar da situação geopolítica provoque mais subidas dos preços”, salienta.
E os alertas não ficam por aqui. Henrique Tomé, analista da XTB, garante que a “Europa continua muito dependente do exterior, uma vez que grande parte do fornecimento de gás natural é proveniente da Rússia”, acrescentando que “embora os EUA já tenham vindo a manifestar a intenção de apoiar a Europa no fornecimento de gás natural, esse apoio poderá não ser suficiente”.
O gestor do BiG diz ainda que a Rússia e a Ucrânia são responsáveis por quase um terço da produção de trigo e cevada, sendo que o milho e a soja também negoceiam em alta, pelo que o impacto na inflação global está além do petróleo e do gás natural.
“A principal consequência seria um aumento do custo de vida, com os riscos da política monetária agressiva a serem reforçados pelos riscos da inflação por via da subida dos preços das matérias-primas”, refere ao i. Por seu lado, Ricardo Evangelista admite que existe um risco claro de subidas generalizadas dos preços da energia, incluindo eletricidade e combustíveis. “Existe também um outro risco, que é mais difícil de quantificar mas não deve ser ignorado, que é o de cortes no fornecimento. Falamos de um cenário em que o bloqueio a importações da Rússia leve a uma escassez súbita, que não se consiga mitigar de forma atempada através do recurso a fontes alternativas”.
Também Henrique Tomé admite que as “principais consequências incidem no setor da energia, com o preço do petróleo e do gás natural expostos a períodos de maior volatilidade”. E vai mais longe: “O consumidor pode vir a ser o mais prejudicado. Numa altura em que já se começa a sentir o aumento dos preços de vários produtos e serviços devido aos efeitos da inflação, o preço dos combustíveis poderá voltar a subir também de forma significativa se este conflito se vier a materializar”.