O Global Media Group solicitou a Mariana Mortágua que regularize a sua situação remuneratória, uma vez que os recibos que a deputada do Bloco de Esquerda emitiu pela sua colaboração com o Jornal de Notícias, que é detido por aquele grupo, não configuravam remunerações provenientes de propriedade intelectual como estipula o regime de exclusividade.
Numa carta enviada à deputada do Bloco de Esquerda, a que o i teve acesso, o grupo que detém o Jornal de Notícias, Diário de Notícias, TSF e outras publicações, alega que “tendo tomado conhecimento de que [Mariana Mortágua] se encontra em regime de exclusividade no Parlamento e sendo certo que ‘o regime dos titulares de cargos públicos determina que o exercício do mandato em exclusividade é compatível com remunerações provenientes de propriedade intelectual’”, por essa razão, solicitou “a regularização da situação remuneratória junto da Global Notícias – Media Group, porquanto os recibos emitidos não configuram remuneração de propriedade intelectual (…), mas sim uma prestação de serviços, como se confirma, ademais, pela atividade indicada no recibo, pela sujeição a IVA e pela retenção a fonte realizada pela Senhora Deputada”.
Na fatura-recibo emitida pela bloquista, e que o i consultou, Mariana Mortágua enquadra a sua colaboração no JN enquanto prestadora de serviços em atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares.
A deputada que exerce o seu mandato em regime de exclusividade admitiu, recentemente, que é remunerada pelo JN, onde assina uma coluna de opinião, desde 2015. Na altura, o Nascer do SOL questionou o Bloco quanto à legalidade da situação, que argumentou que “o regime de exclusividade excepciona direitos de autor, nomeadamente no caso de artigos de opinião”.
E segundo a Comissão de Transparência, “as colaborações remuneradas com a imprensa escrita são consideradas como percepção de rendimentos provenientes de direitos de autor, não sendo por isso, em linha com a doutrina estabilizada nesta matéria, incompatíveis com o exercício do mandato em regime de exclusividade”.
Contudo, o quadro legal da categoria de prestadora de serviços em atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares, não contempla as remunerações por direitos de autor.
Confrontado pelo i, o Bloco de Esquerda refuta qualquer ilegalidade e deixa um recado ao presidente do Conselho de Administração do Grupo Bel e do GMG. “Não deixamos de estranhar que a empresa de Marco Galinha tenha decidido tornar pública esta exigência, que desconhecíamos, pelos jornais. Tendo prestado todos os esclarecimentos que comprovam que Mariana Mortágua não infringiu qualquer lei, não contribuiremos para esta campanha de Marco Galinha”, declarou ao i fonte oficial do BE.
Recorde-se que, na semana passada, foi tornado público que Mariana Mortágua violou o regime de exclusividade durante cerca de cinco meses, por acumular, desde outubro do ano passado, o salário que recebe enquanto deputada com a remuneração pelo programa Linhas Vermelhas, na SIC Notícias.
A bloquista, que já regularizou a situação, disse ter cometido “um erro” por estar “convencida de que essa participação, sendo remunerada, era compatível com o estatuto de exclusividade que sempre” teve no Parlamento e “porque era esse o entendimento da Assembleia da República, no passado”. A deputada alegou igualmente desconhecer que, em 2020, esse entendimento do regime de exclusividade tinha sido alterado.
No entanto, no final de junho de 2021, o Bloco de Esquerda apresentou o projeto de lei “Protege o regime de exclusividade no mandato dos deputados e deputadas”, em que se lia: “A nova interpretação da lei destrói parte da motivação para a existência de um regime de exclusividade que é a dedicação integral ao mandato e ao interesse público que lhe é inerente. Por outro lado, mina a confiança no regime de exclusividade porque passa a permitir o desempenho de atividade económica em paralelo com esse regime. Esta é uma forma de esvaziar a intenção do legislador e cria opacidade no sistema democrático quando o clamor popular é por maior transparência. É uma escolha em contraciclo com as aspirações populares de aprofundamento da democracia”.
O Bloco de Esquerda havia feito a mesma proposta, isto é, a existência do regime de exclusividade com as exceções das atividades de docência, investigação e de criação artística e literária, em abril de 2018.