Por Joana Mourão Carvalho e José Miguel Pires
Luís Montenegro e Jorge Moreira da Silva estão a uma semana de saber quem será, afinal, o próximo presidente do Partido Social-Democrata. As hostes ‘laranja’ estão a ferro e fogo e o principal duelo entre os dois candidatos prende-se precisamente com… a falta de duelo público. É que Jorge Moreira da Silva tem, praticamente numa base diária, instado Luís Montenegro a aceitar um debate para dar a conhecer aos sociais-democratas – e ao país – o eventual futuro líder do segundo partido mais votado da Assembleia da República.
Montenegro, no entanto, deixou a mensagem de Moreira da Silva em ‘visto’, alegando falta de tempo na sua agenda até dia 28 de maio para poder combinar um debate com o seu rival. Quer dizer, isto antes de, na quarta-feira, numa apresentação de mandatários distritais, em Lisboa, ter garantido: «Quero que fique muito claro, eu nunca recusei debates, se há característica que me podem imputar é que adoro debates, tenho centenas de debates realizados».
De repente, afinal, Montenegro não falava de agendas preenchidas, mas sim de uma falta de resposta de Moreira da Silva. «Havia dois debates pré-agendados», um na próxima semana na rádio, disse Montenegro, garantindo que «só não se realiza» porque Moreira da Silva «não pôde confirmar». «E outro na televisão, esta semana, que por vicissitudes que têm a ver com o confinamento obrigatório a que o nosso oponente está sujeito por ter testado positivo à covid-19, não se pode realizar», afirmou ainda Montenegro.
Mas esse comentário não caiu bem na candidatura de Moreira da Silva. Fonte próxima contou ao Nascer do SOL que o facto de o candidato ter testado positivo à covid-19 não é, na sua visão, impeditivo da realização de um debate, podendo recorrer a meios remotos para realizar o mesmo. «Isto é tudo uma questão de cobardia política», diz a mesma fonte ao nosso jornal, argumentando que Luís Montenegro não respondeu aos vários pedidos de realização de debate, «assobiando para o lado» até que, por limitações de tempo, fosse possível alegar que a curta agenda até às eleições diretas é impeditiva da realização de um debate.
«Quem tem este tipo de atitudes demonstra, sobretudo, fragilidade e alguma cobardia política. Isto parece que estamos na JSD», lamenta a mesma fonte, que garante que os pedidos para a realização de debates vão continuar nos próximos dias. «Vamos tentar fazer ainda mais barulho, porque mau é que numa semana não se possa fazer um debate. É obrigatório, era a mesma coisa que irmos para legislativas e não haver debates. Isto faz parte da lógica da democracia», concluiu a mesma fonte.
Esta não é a primeira vez que a realização de debates desencadeia uma novela interna, instrumentalizada para potenciar a troca de acusações entre candidaturas. Em 2007, a mesma questão resultaria numa das disputas mais feias da história do PSD, protagonizada por Luís Marques Mendes e Luís Filipe Menezes.
De resto, esta prática é uma tradição desde que existem eleições diretas e sempre que há mais do que um candidato a ir a votos. Só entre 2011 e 2018 é que não se realizariam debates, uma vez que Pedro Passos Coelho foi sempre recandidato sem adversário. O PSD regressaria ao formato dos debates quando Rui Rio e Pedro Santana Lopes foram a jogo em 2018.
Covid não é desculpa
É certo que Jorge Moreira da Silva testou positivo à covid-19 no início da semana, o que o obrigou a reagendar as suas ações de campanha, acabando por falhar algumas. E, apesar da garantia de fontes próximas da sua candidatura de que esse não é um fator impeditivo da realização de uma debate com Luís Montenegro, o outro candidato tem uma opinião diferente: «A verdade é que na segunda fomos confrontados com notícias de que tinha testado positivo e fizemos o exercício normal de partir do princípio de que esta semana não haveria essa disponibilidade. É só por isso que não há debates», revelou aos jornalistas, desvalorizando que se chegue ao dia das eleições diretas sem ter sido feito qualquer debate.
«Quer eu, quer o outro candidato, teremos muitas oportunidades de apresentar os nossos projetos, as nossas ideias», afirmou Luís Montenegro.
O que não tem faltado do lado de Moreira da Silva é uma insistente vontade de se defrontar em debate com Luís Montenegro. Em visita à Madeira, Moreira da Silva voltou a deixar novo desafio ao seu rival: «Não vale a pena dizer que não tem medo de debater com ninguém ou dizer que gosta muito de debates. Os estados de alma não são para aqui chamados. Em termos práticos, só é preciso saber se está disponível para debater comigo, como eu acho que é do interesse de todos os cidadãos», argumentou o candidato à liderança do PSD, na quinta-feira, dia em que retomou a campanha presencial após ter testado positivo à covid-19.
«Se estiver disponível, como eu estou, seguramente encontrará espaço na sua agenda, porque faltam oito dias para o final desta campanha. Eu alterarei o que tiver de ser alterado para poder fazer os debates», insistiu.
A Madeira, aliás e como é sabido, é um dos grandes bastiões do PSD e é um dos grandes terrenos de batalha naquelas que são as principais eleições internas do PSD.
Miguel Albuquerque, presidente do Governo Regional do arquipélago, já expressou o seu apoio a Luís Montenegro, mas esse detalhe não desmoralizou Moreira da Silva. «Não, não me sinto em desvantagem porque verdadeiramente olho para os últimos 30 anos e os militantes, aqui, conhecem-me, sabem que eu não estou nesta campanha eleitoral a tentar reclamar uma vantagem ou afirmar uma afinidade com a região momentânea ou recente. São 30 anos», frisou o antigo ministro do Ambiente de Pedro Passos Coelho, no Funchal.
E atirou mais uma farpa a Montenegro: «Não apareci agora, de repente, a dizer coisas bonitas sobre a Madeira para poder mobilizar votos», argumentando que durante os últimos 30 anos tem «dado sinais concretos de um empenhamento no aprofundamento da autonomia regional», desde os tempos em que era presidente da JSD, com um projeto para eliminar a figura de ministro da República, e enquanto ministro na proteção dos madeirenses dos «cortes ao financiamento que a troika queria impor».
Ainda sobre a Madeira, Moreira da Silva aproveitou para deixar uma certeza: as leis das finanças locais e regionais são para revolucionar. «Considero que, no dia em que o ministro das Finanças entregue o Orçamento do Estado à Assembleia da República deve passar a entregar também as contas públicas de capital natural, para que se saiba qual foi o capital natural que valorizou, qual foi o capital natural que se depreciou e, no fundo, para que possamos ter um racional de financiamento às regiões e às autarquias que alinhem crescimento económico com proteção ambiental e bem-estar social», declarou aos jornalistas numa visita ao Mercado dos Lavradores.
Moreira da Silva argumentou não ser possível continuar «a ter uma situação em que quem vive numa área protegida, quem vive num património natural, sente um ónus e uma desvantagem». «Temos de inverter as coisas e eu espero sinceramente que, sendo eleito presidente do PSD, que na minha proposta nacional se possa revolucionar as finanças locais e as finanças regionais».
Costa é flop, diz Montenegro
Por sua vez, a campanha de Luís Montenegro também tem estado plena de soundbites e opiniões impactantes, não só relativamente ao PSD mas ao país em si. «O PSD tem de se concentrar em dizer ao país que o rei vai nu. O doutor António Costa é um ‘flop’ como primeiro-ministro», afirmou o antigo líder parlamentar, durante uma sessão com militantes em Viana do Castelo. E, para defender a sua tese, o candidato recorreu ao exemplo da falta de médicos de família no SNS. «António Costa prometeu a Portugal, por exemplo, que todos os portugueses tinham direito a um médico de família. Havia um milhão e quarenta e cinco mil portugueses que, em 2015, não tinham médico de família. Ele prometeu que todos iriam ter. Hoje são mais 250 mil, nos números oficiais», disparou.
A inflação galopante, a maior carga fiscal de sempre e o nivelar os salários por baixo foram outros três exemplos utilizados por Montenegro, que regressou à metáfora do ‘rei vai nu’: «O PSD tem de fazer, nos próximos anos, um combate político de oposição firme, exigente, que não dê tréguas ao Governo, que assinale todos os fracassos, todos estes ‘flops’, que diga que o rei vai nu, porque o rei vai nu em Portugal».