O presidente da Assembleia da República esteve na Associação 25 de Abril para um almoço com os capitães que, no passado, fizeram a Revolução dos Cravos, mas os recados que deixou foram para o presente e para o futuro, falando do ressurgimento do fascismo e sobre o contágio à direita democrática.
Um dia depois do partido de Giorgia Meloni ter conquistado uma vitória histórica nas eleições legislativas de Itália, Augusto Santos Silva apontou para um futuro europeu com uma extrema-direita em crescimento.
“Aquilo a que assistimos na Suécia e em Itália vamos assistir noutros países, que é a direita democrática não ter nenhum pejo em aceitar a aliança com a direita extrema se esse for o preço que tiver de pagar para voltar ao poder”, traçou.
Puxando a fita atrás, recordou o exemplo da Alemanha para pedir um cordão sanitário à extrema-direita. “Quem não compreender que o que Angela Merkel fez na Alemanha é exceção e não a regra no comportamento do PPE, não está a compreender nada”, considerou, referindo-se ao facto de a ex-chanceler alemã ter recusado qualquer acordo, a nível local ou nacional, com o partido de extrema-direita AfD.
Na ótica de Santos Silva, Angela Merkel pagou “um preço eleitoral” por essa posição, mas salvaguardou a “pureza, a firmeza” e o “futuro dos democratas cristãos e conservadores alemães”.
“Incredulidade” e “estupefação” – foram estes os sentimentos com que os sociais-democratas, que acusam a segunda figura do Estado de não ter “vergonha”, receberam os recados de Santos Silva, já que o conselho sem destinatário foi também dirigido ao PSD, numa altura em que o partido tem sido alvo de acusações de aproximação à extrema-direita, depois de Luís Montenegro ter feito um apelo ao seu grupo parlamentar para votar a favor da candidatura do Chega para a vice-presidência do Parlamento e de ter feito um pedido ao Presidente da Assembleia da República para desbloquear a eleição dos membros da Mesa.
Contudo, os avisos da esquerda não convencem o líder dos sociais-democratas, que, na segunda-feira, considerou mesmo “anedótico” que o PS, juntamente com o Bloco de Esquerda e o PCP, o acusem de normalizar o Chega.
“É um bocadinho anedótico a deputada Catarina Martins e o deputado Jerónimo de Sousa falarem nesse aspeto e ainda mais anedótico se vier de dirigentes do PS. Se há normalização em termos de presença governativa de partidos da extrema-esquerda do espetro político é a que aconteceu em Portugal em 2015, quando o PS decidiu governar com dois partidos da extrema-esquerda”, recordou Montenegro, numa referência à aliança governativa firmada por António Costa quando o PSD de Passos Coelho ganhou as eleições legislativas.
O social-democrata defendeu ainda que “quanto mais ataques se desferir querendo dar uma conceção antissistema a partidos com representação parlamentar, mais valorizam esses partidos”, acrescentando que o PS “faz isso de propósito para favorecer os seus resultados”.
“O PS puxa muito pelo Chega a ver se o Chega ocupa um espaço político, mas claro que se vai enganar. O que vai acontecer é o reforço do espaço político que o PSD representa”, afirmou, reiterando que uma eventual coligação com o Chega nas próximas legislativas, previstas para 2026, “é uma questão que não tem nenhum tipo atualidade”.