As incertezas continuam a ser muitas e o cenário de recessão ainda não está totalmente afastado, como admitem os economistas ao nosso jornal. César das Neves não se quer comprometer com perspetivas, por entender que «o cenário é muito nebuloso». Mas acredita que «o mais provável é a continuação da trajetória positiva mas fraca e ambígua dos últimos tempos».
Também Mário Martins, analista da ActivTrades, aponta para o atual cenário de «muita volatilidade» e lembra que caso o mercado laboral comece a ceder «fará precipitar rapidamente o consumo privado para um patamar que empurrará a economia dos EUA e da UE para a recessão».
Mais otimista está o economista do Banco Carregosa, Paulo Rosa ao referir que, «apesar de alguma relutância em alta dos números da inflação em janeiro, espera-se que o aumento dos preços no consumidor desacelere significativamente ao longo do ano», ainda assim, lembra que os juros elevados ameaçam o desempenho económico, mantendo vivo um cenário de recessão nos próximos semestres.
Por seu lado, os analistas da XTB, Henrique Tomé e Vítor Madeira, referem que conseguir travar a inflação «sem ferir demasiado a economia» é um dos principais desafios para os próximos meses. «Os desafios do ano passado deverão manter-se este ano, uma vez que a inflação permanece em níveis elevados. O BCE está empenhado em trazer os níveis de inflação para as metas desejáveis, e apesar de se notar um abrandamento na atividade económica, ainda não é evidente o impacto deste abrandamento na taxa de inflação», referem ao nosso jornal.
Para já, as notícias são animadoras. De acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), no conjunto do ano 2022, o Produto Interno Bruto (PIB) registou um crescimento de 6,7% em volume, o mais elevado desde 1987, após o aumento de 5,5% em 2021 que se seguiu à diminuição histórica de 8,3% em 2020, na sequência dos efeitos adversos da pandemia na atividade económica. «A procura interna apresentou um contributo positivo expressivo para a variação do PIB, embora inferior ao observado no ano anterior, verificando-se uma aceleração do consumo privado e uma desaceleração do Investimento. O contributo da procura externa líquida passou a positivo em 2022, tendo-se registado uma aceleração das exportações de bens e de serviços mais intensa que a das importações de bens e serviços», revelou o gabinete.
Em termos nominais, o PIB aumentou 11,5% em 2022, atingindo cerca de 239 mil milhões de euros.
Já em relação ao 4.º trimestre, o PIB registou uma variação homóloga de 3,2%, uma redução face aos 4,8% registados no trimestre anterior. O INE explicou esta queda com «um crescimento menos acentuado do consumo privado e uma diminuição do investimento».
Também o contributo positivo da procura externa líquida para a variação homóloga do PIB também diminuiu, para 1,3 p.p. (1,6 p.p. no trimestre anterior), traduzindo a desaceleração das exportações de bens e serviços, em volume, mais intensa que a das importações de bens e serviços.
Saldo ultrapassa os 2 mil milhões
Mesmo com a ‘nebulosidade’ apontada pelos economistas, as administrações públicas registaram um saldo orçamental de 2.013 milhões de euros em janeiro, na ótica da contabilidade pública, o que representa uma melhoria de 184 milhões de euros em relação ao mesmo mês de 2022. Esta melhoria, de acordo com o ministério das Finanças, deve-se aos acréscimos da receita de 6,2% e de 5% na despesa efetiva, mas refere que «excluindo o efeito das medidas covid-19, que deixam de ser necessárias fora do contexto pandémico, e do choque geopolítico (que se mantêm, mas têm também uma natureza extraordinária), a despesa primária cresceu 8,2% em termos homólogos e 18,2% face a igual período de 2019».
Segundo os mesmos dados, as despesas com pessoal aumentaram 6,6% em janeiro de 2023 face ao período homólogo de 2022 e deve-se maioritariamente a despesa com salários «traduzindo, entre outros, a atualização transversal remuneratória dos trabalhadores das administrações públicas, bem como o impacto do aumento da remuneração mínima mensal garantida», referindo que se destaca o contributo do SNS (+13%) e da PSP e GNR (+7,8%).
O gabinete de Fernando Medina diz também que o crescimento das prestações sociais esteve fortemente influenciado pelas prestações de parentalidade (17%) e a prestação social para a inclusão (11,5%). O crescimento das pensões incorpora a atualização regular que impactou a componente preço entre 3,89% e 4,83%.
No entanto, excluindo as parcerias público-privadas (PPP), o investimento aumentou 15,4% até janeiro, «destacando-se o crescimento no setor da saúde (+41,2%) e na administração local (+44,9%)».
Por seu lado, a despesa com juros e outros encargos aumentou 34,6% em janeiro de 2023, invertendo a tendência decrescente verificada nos últimos anos. «Cerca de 90% da melhoria da receita deve-se ao bom momento do mercado de trabalho», enquanto a receita fiscal e contributiva arrecadada em janeiro de 2023 aumentou 10,5% face ao mesmo período de 2022, destacando-se a evolução no IRS (+14%) e no IVA (+11,9%). Já as contribuições para a Segurança Social registaram um aumento de 11%.
Os dados apontam também para um crescimento da despesa com a aquisição de bens e serviços que concorre sobretudo com o impacto do SNS (12,4% em termos homólogos e 29,4% em relação a 2019), destacando-se os meios complementares de diagnóstico e terapêutica (9%) e a componente de produtos vendidos em farmácias (8,9%), bem como o perfil de despesa da administração local (+23%).