“É exagerado dizer que o futebol é um dos motores da economia”

Os dados do último Anuário do Futebol Profissional Português mostram que este desporto teve um contributo de 617 milhões de euros para o PIB na época 2021-22. Daniel Sá, diretor executivo do IPAM diz que os dados são positivos mas não se podem comparar a outros setores. Ainda assim, diz que o impacto vai continuar…

O contributo do futebol profissional para o PIB (produto interno bruto) português aumentou para 617 milhões de euros na época 2021-22, segundo os dados que constam na sexta edição do Anuário do Futebol Profissional Português, produzido pela EY, numa parceria com a Liga Portugal. Este é um valor que mostra um crescimento de 12,2% face à época anterior. Os números mostram também que a Liga Portugal e as 34 sociedades desportivas representadas pagaram, em relação à época anterior, mais 11,5% de impostos ao Estado, alcançando os 214 milhões de euros.

O Anuário dá mais números: “a Liga Portugal e as Sociedades Desportivas da Liga Portugal bwin e Liga Portugal SABSEG foram diretamente responsáveis por 3595 postos de trabalho”.

Para Daniel Sá, diretor executivo do Instituto Português de Administração de Marketing (IPAM), é certo que este setor “tem um peso pequeno quando comparamos com outras indústrias, como a indústria automóvel, o turismo ou o calçado, hotéis ou retalho”. E defende que “não pode ser classificada como uma indústria dessa dimensão, porque não é, é uma indústria pequena na economia portuguesa”.

Mesmo “sendo pequena, é de muita qualidade. É uma indústria que produz alguns dos melhores produtos do mundo. E entenda-se produtos como seleções, jogadores, treinadores, clubes, instalações desportivas. E que, paralelamente, tem um contributo muito importante para o reforço do que esta marca Portugal como um todo”.

Por isso, os últimos valores apresentados no anuário “são grandes dentro da perspetiva do que é a indústria do futebol português”. Mas, acrescenta Daniel Sá, “quando olhamos para a economia do país eles são muito pequenos, naturalmente que sim. Mesmo assim, é a prova muito clara de que para quem olha para o futebol apenas como uma mera modalidade desportiva, tem que olhar mais do que isso. Porque na verdade é uma indústria e emprega pessoas e gera receitas e paga impostos. E este movimento tem crescido muito nos últimos anos”. Com base nos números, o também especialista em marketing desportivo diz que o futebol “vai continuar a crescer nos próximos anos”.

Já Vítor Madeira, analista da corretora XTB, não vê “o futebol português como um fator chave para a economia portuguesa”, sendo da opinião que “o futebol seria um ramo chave no que toca ao entretenimento em Portugal: ajuda a economia portuguesa, como tantos outros, mas o seu contributo é quase irrisório”.

Também Daniel Sá diz que não se pode dizer que o futebol é um dos motores do país como tantos outros setores que existem. “Na mesma proporção, não. E os números são incomparáveis. Não podemos fazer uma análise fria do impacto da indústria do turismo que ultrapassa os 12% do PIB português. Não é comparável. Ou seja, não acho que podemos, nem de longe nem de perto, colocar as coisas ao mesmo nível”.

Ainda assim, nem tudo é mau, defende do diretor executivo do IPAM. “Agora, para além deste efeito direto, há o efeito indireto e esse sim eu acho que provavelmente – não há estudos que o digam de uma forma clara – se calhar é a indústria que faz Portugal ser mais reconhecida no mundo. Aí dificilmente o vinho, o calçado, o têxtil ou o turismo dificilmente têm a visibilidade do ponto de vista global que o futebol gera para o país. E acho que provavelmente é a indústria mais importante”.

A opinião de ser exagerado dizer que o futebol é um dos motores da economia do país é também partilhada por Vítor Madeira que justifica a sua opinião. “Se olharmos para os números o PIB projetado para Portugal em 2023 é de cerca de 251 mil milhões de euros. Assumindo que o futebol contribui com 617 milhões de euros por ano para essa criação de riqueza, trata-se apenas de 0.245%, o que é um número demasiado pequeno para ser um motor chave da economia nacional”.

 

E as receitas?

Os dados do Anuário do Futebol mostram ainda que a Liga Portugal fechou a época com o sétimo ano consecutivo de resultados positivos. “Com receitas recorde de quase 22 milhões de euros, a Liga Portugal fechou a época passada com lucros de quase 1,2 milhões de euros, tendo libertado 8,2 milhões de euros para distribuir pelas sociedades desportivas”.

Daniel Sá considera que estes números “são bons” e acontecem por dois ou três fatores. “Um deles é a competência da própria Liga”, diz o especialista explicando que “os resultados positivos e o aumento de receitas é competência de quem a gere. É evidente que há aí know how e competência da Liga”.

Já o segundo fator está relacionado com o interesse do futebol. “Estas receitas geram-se porque há espetadores a ir aos estádios, direitos televisivos a ser vendidos e patrocinadores a quererem estar envolvidos. É um sinal de saúde desta indústria e é também, de alguma forma, o reflexo da própria profissionalização da indústria. Ou seja, cada vez mais há profissionais ligados a estas áreas da gestão, do marketing, da comunicação, na Federação, nas Ligas, nos clubes e evidentemente, isto depois tem impacto nas receitas porque têm profissionais que as sabem gerar”.

Por sua vez, o analista da XTB defende que este resultado “poderá ser o facto das empresas estarem dispostas a gastar mais com publicidade, cada vez temos transferências de jogadores com valores superiores e em simultâneo, a população continua a sentir o futebol como um meio de entretenimento valioso”. Por último, acrescenta que “não devemos esquecer que esse aumento de resultados pode estar a ter influência nas escaladas da inflação”.