As ‘esplanadas -covid’, de cafés, restaurantes e bares que surgiram em Lisboa durante a pandemia de covid-19, estão a desaparecer, especificamente nas freguesias de Arroios e Santo António. Os comerciantes dessas áreas foram notificados por carta para removerem as esplanadas que ocupam lugares de estacionamento até ao final do ano passado, uma vez que as licenças extraordinárias concedidas em 2020 expiraram.
Em resposta aos desafios impostos pela pandemia, em 2020 a autarquia permitiu a criação de 365 esplanadas – 49 em Arroios, 51 em Santo António, 31 na Penha de França, 22 em Alcântara, entre outras – em lugares de estacionamento, com o intuito de apoiar o comércio que tinha apenas espaço interior. No entanto, muitas dessas esplanadas ainda permaneciam em algumas freguesias, levando as autoridades locais a tomar medidas.
Apesar de alguns comerciantes terem contestado a decisão, o presidente da junta de freguesia de Santo António assegurou que, desta vez, o prazo de licenciamento não será prolongado. Cerca de 100 proprietários serão afetados, vendo os seus negócios perderem as esplanadas que se tornaram parte integrante da paisagem urbana nos últimos anos.
“Acho isto inadmissível. As esplanadas são espaços muito agradáveis e só trazem benefícios tanto aos comerciantes como aos moradores. Não entendo, não deviam fazer isto. Estão a destruir parte dos negócios”, desabafa Maria da Conceição, residente na freguesia de Santo António, lamentando a existência desta medida. “Há tantas coisas que os políticos devem fazer e não lhes prestam atenção, mas agora acham que retirar esplanadas é que é urgente. Se fossem eles a viver do dia-a-dia da restauração ficariam quietinhos porque saberiam que quem tem um negócio precisa do máximo de lugares possível. E, principalmente, os exteriores são muito apreciados”, diz. Morador na mesma freguesia, João Pedro concorda. “Mesmo que fiquemos sem tantos lugares de estacionamento, vale a pena porque podemos usufruir dos espaços ao ar livre. Pelo menos, é esta a minha opinião. Obrigarem os estabelecimentos a ficarem sem esplanadas não é uma ideia nada boa. A Penha de França e a Ajuda, por exemplo, vão prolongar as licenças. Façam o mesmo nas outras freguesias!”, apela.
Questionada pelo Nascer do SOL, a Câmara Municipal de Lisboa responde que “estando em causa decisões das Juntas de Freguesia, deverão ser estas as entidades a contactar para a obtenção de esclarecimentos sobre o assunto”. Em 2022, foi criada a petição ‘Pelas esplanadas de Lisboa’, por um grupo de proprietários de estabelecimentos comerciais da freguesia de Arroios. “À nossa voz juntam-se clientes e comerciantes de outras freguesias”, lê-se na petição que conta com mais de 2500 assinaturas.
Durante a pandemia e no período pós-pandemia, dizem ter colaborado ativamente com a Junta de Freguesia e a Câmara Municipal de Lisboa para estabelecer novas esplanadas, enfrentando os desafios económicos decorrentes da crise. Essas esplanadas foram uma resposta necessária, ocupando espaços de estacionamento devido à limitação de passeios.
Numa altura de severas limitação no convívio e na proximidade entre pessoas em espaços fechados, a expansão das áreas dos estabelecimentos resultou em benefícios sociais significativos, gerando novos empregos para dezenas de pessoas num momento de necessidade. Assim, foi com grande preocupação que os comerciantes receberam o pedido da Junta de Freguesia para remover as esplanadas, o que representa a perda de um considerável investimento, muitas vezes financiado por empréstimos.
“A nossa preocupação tem várias dimensões: a incapacidade de recuperar o investimento com a perda das esplanadas; o pagamento dos empréstimos efetuados e a perda de postos de trabalho. E isto num momento em que os custos subiram mais de 20% para a restauração por causa da guerra. A ampliação da área de esplanadas teve muitos aspetos positivos na economia de inúmeras famílias e veio enriquecer a vida do bairro. Todos estamos cientes, enquanto proprietários e clientes, do efeito das novas esplanadas no espaço público da cidade”, escreveram. “A troca de um carro por uma esplanada é um caminho para uma cidade mais saudável, mais amigável e mais vivida, mais amiga do ambiente. Este é, aliás, o caminho que o novo governo da cidade está a delinear com o novo programa de espaço público para a cidade de Lisboa – ‘Há vida no meu Bairro’”.
Mas este problema repete-se noutros pontos do país. No ano passado, era noticiado que “a falta de acordo entre a Câmara Municipal e a concessionária do estacionamento pago à superfície, a Sociparque, obriga os espaços de restauração e similares a retirar as esplanadas montadas em Vila Verde”, em Braga, “durante a pandemia covid-19, uma medida para ajudar a suprir a falta de espaço e algumas regras decorrentes das obrigações legais impostas pela DGS”, como escrevia o jornal O Vilaverdense.
No início de abril de 2021, as esplanadas reabriram como parte da então segunda fase do desconfinamento. No entanto, as regras da Direção-Geral da Saúde (DGS) foram divulgadas apenas no final do mês, através do guia de boas práticas da AHRESP. O documento aconselhava a promoção do agendamento prévio para reservas sempre que possível. Quanto à disposição das mesas nas esplanadas, era necessário garantir uma distância mínima de dois metros entre as pessoas. O corredor entre as mesas devia manter uma distância de pelo menos 1,5 metros. Lugares em pé eram desaconselhados devido à dificuldade de manter distância, entre outros.
O Nascer do SOL contactou outras autarquias para entender como é que estão a proceder em relação a este tema. A Câmara Municipal do Porto deixou claro que “a ocupação do Espaço Público para esplanadas está definida no Código Regulamentar do Município do Porto” e frisou que “desde que o pedido respeite o referido regulamento e o Decreto-Lei 163/2006, na sua atual redação, a licença é emitida e/ou renovada”, adiantando que “o Município não pretende limitar a ocupação do espaço público para ocupação das esplanadas concedidas durante a pandemia”. A Câmara Municipal de Oeiras esclareceu que «prolongou o licenciamento das esplanadas que foram autorizadas durante a pandemia como forma de continuar a apoiar os comerciantes da restauração local». A Câmara Municipal de Cascais, à sua vez, retirou as ‘esplanadas-covid’ durante o ano de 2022, como explicou ao Nascer do SOL.
‘Esplanadas-covid’: retirar ou não retirar, eis a questão
Algumas das esplanadas de cafés, restaurantes e bares que surgiram em Lisboa durante a pandemia de covid-19 estão a desaparecer. O que pensam os moradores disto? E as outras autarquias?