Pedro Nuno quer mesmo livrar-se da herança de António Costa

É hora de reagrupar e apostar numa estratégia autónoma. Pedro Nuno Santos vai para a oposição afirmar a sua liderança e aposta nas europeias para marcar o virar de página do costismo. No partido nem todos estão de acordo.

“Acabou o tempo da tática política”. Com esta frase, na noite de 10 de março, Pedro Nuno Santos não só assumiu uma derrota eleitoral quando ainda não estavam contados todos os votos, como, com a mesma expressão, encerrou em definitovo o consulado de António Costa à frente do partido.

O ainda primeiro-ministro tinha acabado de fazer uma aparição na sede eleitoral dos socialistas para uma conferência de imprensa improvisada onde abria a porta para uma discussão sobre quem tinha vencido as eleições, que poderia prolongar-se por mais quinze dias. 

Sem aviso prévio a Pedro Nuno Santos, Costa queria mais uma vez ditar as regras do jogo, apostando num resultado que, apesar de teoricamente possível, era já dado como irrealista, ou seja, para o PS ficar à frente da AD teria que conquistar pelo menos três dos quatro mandatos dos círculos da emigração e a AD não assegurar nenhum. 

A leitura de Costa foi vista por alguns pedronunistas como uma tomada de posição extemporânea para alguém que está de saída e que já não decide os destinos do partido. Para outros, foi sentida como uma tentativa de fazer uma leitura criativa dos resultados que ainda permitisse ao PSmanter-se no Governo.

Terá sido essa a razão para o secretário-geral do partido fazer uma declaração de derrota inequívoca e, ao mesmo tempo, ter afirmado: «O nosso tempo começa agora». O tempo de que o líder do PS falava não era o tempo do partido, mas, sim, o tempo de afirmação de Pedro Nuno Santos, cortando com o costismo.

Desde a noite eleitoral que Pedro Nuno, tal como Montenegro, está longe dos holofotes da comunicação social e também dos compromissos públicos.

A especulação sobre as contas finais e como se contabilizam as maiorias (se é só contando com os votos e mandatos do PSD, ou se são os mandatos conquistados também pelo CDS, parceiro de coligação) tem animado os debates. Mas, para tal, não têm contribuído os mais próximos de Pedro Nuno Santos, que está apostado em organizar o partido para os próximos desafios: a liderança da oposição num Parlamento fragmentado e as eleições europeias.

A resistência em aceitar uma derrota antecipada vem sobretudo da ala mais costista, que considera que não se deveria entregar o poder assim tão facilmente.

Ao fim de oito anos no poder, o rombo na bancada socialista, em cojunto com a perda do Governo, preocupa muitos socialistas que perdem lugares de destaque e temem não ser relevantes na nova fase que o partido vai viver a partir de agora.

No Largo do Rato, Pedro Nuno Santos tem várias decisões para tomar. Como vai querer liderar a oposição sem correr o risco de que o partido seja visto como irresponsável? E como preparar as eleições europeias de junho?

A nova liderança socialista já tem no cadastro duas derrotas eleitorais, mas os resultados das legislativas permitem pensar que as europeias podem ser diferentes e que o PS pode ambicionar ganhar. Para isso é preciso escolher um cabeça de lista e uma lista fortes. 

Ascenso Simões já veio publicamente defender a candidatura de António Costa às europeias. Seria uma forma de o ainda primeiro-ministro se manter no palco político para daqui a dois anos surgir como candidato presidencial.

É um cenário que desagrada à atual direção, porque perpetua a ideia de que a liderança de Pedro Nuno Santos está sob tutela. O próprio já mostrou que quer cortar com esse passado recente e que agora é para fazer o seu próprio percurso.

Com a ameaça de que a sombra de António Costa não o abandone, Pedro Nuno Santos procura por estes dias um cabeça de lista para as eleições europeias. A antecipação da estratégia é determinante para evitar que a hipótese Costa vá fazendo caminho. A seu favor, o líder socialista tem o facto de o próprio António Costa ter colocado o seu futuro político dependente de uma decisão judicial, que ninguém espera que surja nos próximos tempos, nem talvez a horas de uma candidatura à Presidência da República no final de 2025. São declarações que têm caído no esquecimento, mas que são o argumento perfeito para que a hipótese Costa às europeias seja elegantemente afastada pela atual direção.