Automóvel. Setor que puxa pela economia

Apesar do peso que tem para o PIB nacional e para criação de emprego, tanto a produção como a venda de veículos têm vindo a cair nos últimos meses. A indústria de componentes segue a mesma tendência, o que leva a que os responsáveis do setor se mostrem apreensivos

A indústria automóvel é um dos principais motores da economia portuguesa. E os números falam por si: representa 5,5% do Produto Interno Bruto (PIB)e mais de 20% das receitas cobradas pela máquina fiscal. Um peso que, acusa o secretário-geral da Associação Automóvel de Portugal (ACAP), é desvalorizado tendo em conta o comportamento do Governo.

Em entrevista, Hélder Pedro reconhece que há medidas que deviam ter entrado em vigor no Orçamento do Estado deste ano, como o incentivo ao abate de veículos, que continua a não ser implementado. “Tivemos algumas reuniões com o Governo, mas até o momento nada se verificou, o que nos deixa muito preocupados porque já estamos a caminhar para o novo Orçamento e o Governo ainda não implementou o que está no atual”.

Uma questão que ganha maior relevo já que, segundo a ACAP, 1,5 de automóveis a circular em Portugal (26% do total do parque automóvel) têm mais de 20 anos. “Este número assume um peso relevante, tendo em conta que, em 2000, os carros com mais de duas décadas de vida representavam apenas 1% do total do parque”, diz a entidade, acrescentando que “outro problema que perdura é o envelhecimento do parque automóvel, particularmente quando comparado com a média europeia. Em Portugal, no último ano, a idade média dos veículos ligeiros era de 13,4 anos, enquanto a idade média tanto nos ligeiros de mercadorias, bem como nos pesados, de passageiros e de mercadorias, ronda os 15 anos”.

É certo que as vendas de carros ganharam um novo fôlego nos primeiros seis meses do ano, mas começaram a abrandar no início do verão. De janeiro a agosto foram colocados em circulação 168.942 novos veículos, o que representa um aumento de 4,4% relativamente ao mesmo período do ano. Mas só em agosto foram matriculados pouco mais de 14 mil, uma queda de 8,7% face a igual período do ano passado. 

Comportamento semelhante tiveram os automóveis ligeiros de passageiros novos elétricos, plug-in e híbridos elétricos. Em agosto foram matriculados em Portugal 6587 automóveis deste segmento ou seja, menos 5,2% face ao mesmo mês do ano anterior. Já de janeiro a agosto, as matrículas deste tipo totalizaram 66 728 unidades, o que se traduziu numa variação positiva de 9,8% relativamente ao período homólogo de 2023.

E a compra de carros puxa pelo aumento do crédito. Nos primeiros seis meses do ano, o stock de crédito ao consumo aumentou em 536 milhões de euros, quando no mesmo período do ano passado tinha subido apenas 107 milhões. Os dados foram revelados pelo Banco de Portugal e indicam ainda que, em julho, o montante de empréstimos aumentou mais 141 milhões de euros relativamente a junho, para 21,8 mil milhões de euros, e cresceu 6,6% em relação a julho de 2023, o maior crescimento, em termos homólogos, desde março de 2020. 

Produção também em queda

Tal como se verifica no mercado de vendas, também a produção automóvel está a sentir uma quebra. Segundo os dados da ACAP, em julho foram produzidos em Portugal cerca de 18 mil veículos, uma queda de 32,7% face a igual período do ano passado. Já em termos acumulados, nos sete meses de 2024, saíram das fábricas instaladas em Portugal 197 230 veículos, menos 6% do que em igual período do ano anterior. 

A associação chama a atenção para a importância que as exportações representam para o setor automóvel já que 97,9% dos veículos fabricados em Portugal têm como destino o mercado externo, “o que contribui de forma significativa para a balança comercial portuguesa”.

A Europa continua a ser o mercado líder nas exportações dos veículos fabricados em território nacional – com 85% – com a Alemanha (23,5%), Itália (13,3%), França (10,8%) e Espanha (9,1%) no topo do ranking.

Em termos de grandes regiões, o mercado africano, liderado pela Argélia (5,4%), mantém o segundo lugar nas exportações de automóveis fabricados em Portugal com 8,1% das exportações. A Ásia encontra-se no terceiro lugar com 3,3%.

Componentes desaceleram 

Também a Associação de Fabricantes para a Indústria Automóvel (AFIA) alerta para a tendência de queda da produção para o mercado externo continuar a ser negativa. “As encomendas provenientes da Europa continuam a ser menores do que foram no ano anterior”, referindo que em junho fixaram-se em mil milhões de euros, registando uma derrapagem de 11% face ao mesmo mês do ano passado. No entanto, admite que o acumulado das exportações até junho é 6400 milhões, uma diminuição de 3,8% em comparação com o mesmo período de 2023.

“Este comportamento é essencialmente determinado pela queda das vendas da indústria europeia, porque representando 88,5% das vendas e o facto de caírem 5,1% para esse mesmo mercado, condiciona a produção da indústria nacional de componentes”, salienta. Espanha continua a liderar a lista dos principais destinos dos componentes fabricados em Portugal, registando uma quota de 27,9%, seguida da Alemanha e França com 23,4% e 8,3%, respetivamente.

“Estes resultados deixam-nos pouco otimistas em relação aos tempos que se aproximam, reforçando a necessidade de rever em baixa as expectativas de crescimento que tínhamos inicialmente previsto para 2024”, assume o presidente da AFIA – Associação de Fabricantes para a Indústria Automóvel, José Couto. “Esta situação afeta toda a Europa, logo por arrasto afeta Portugal, porque estamos dependentes da produção da europeia. A produção automóvel agregada da Espanha, Alemanha, França, Reino Unido e Itália, principais parceiros da indústria portuguesa, diminuiu 7,5% no primeiro semestre em comparação com o período de janeiro a junho de 2023”.

De acordo com os dados divulgados pela AFIA, as exportações de componentes automóveis mantêm-se assim responsáveis por 16% das exportações nacionais de bens transacionáveis, ou seja, por cada 100 euros exportados, 16 euros pertencem ao setor dos componentes automóveis.