Os temas acumularam-se durante as férias e o início do último trimestre de 2024 está a revelar-se bem agitado.
OE 2025. Continua o folhetim do aprova não-aprova. Com ele aprendemos que para o PS a barricada da defesa de um orçamento de esquerda é o IRS-jovem. Pasme-se! Não vejo na medida outro mérito que não a redução da carga fiscal; em particular, duvido do seu impacto na contenção da emigração qualificada. Mas é algo prometido pelo PSD e que não difere essencialmente da proposta avançada pelo Governo de António Costa. Mesmo a modesta redução transversal do IRC não deveria ser um anátema, pois chegou a ser avançada pelo anterior ministro da Economia socialista, e mesmo Pedro Nuno Santos já a defendeu como instrumento de política industrial. Como bem notou Francisco Mendes da Silva, o PS ao invés de negociar o OE para que inclua alguns aspetos do seu programa, exige que o PSD não inclua medidas que foram suas (do PSD) bandeiras eleitorais. Não é uma postura negocial aceitável. O PSD não deve negociar como se tivesse maioria; mas o PS não deve negociar como se tivesse ganho as eleições. E se o OE25 não for aprovado? Governa-se com o orçamento Medina e daí não virá grande mal ao mundo.
TAP. Se comprar um carro com o valor de mercado de 100 mil euros e o vendedor, talvez por eu ser um cliente habitual, me fizer um desconto de 10%, direi que poupei 10 mil euros ou seja, ‘capitalizei-me’ por esse montante. É indiferente se esse desconto é um abatimento ao preço ou se, mantendo o preço do carro, o vendedor me adianta 10 mil euros contra a promessa garantida de fecho do negócio ao preço de mercado. (O caso será obviamente diferente o preço de compra aumentar para 110 mil euros.) No essencial é assim que eu vejo a agora polémica operação de capitalização da TAP engendrado em 2015 por David Neelmann. Inteligente e nada estranha em termos económico-financeiros. Só é ensombrada por ter sido autorizada pela calada da noite, na vigésima-quinta hora por um governo demitido.
Presidenciais. São já três os nomes lançados para a ribalta. O de Luís Marques Mendes é há muito antecipado pois tem passado político e uma presença pública regular que permite que lhe conheçamos o pensamento e posições. Dos outros dois – Mário Centeno e Gouveia e Melo – pouco se conhece. Apenas que desempenharam funções públicas com um mérito que, apesar de inegável, foi objeto de enorme empolamento mediático. Avançam tendo como capital quase exclusivo uma aura de homens providenciais. Acho pouco e mau.
Saúde. Mais de um milhão e seiscentos mil cidadãos não têm acesso a médico de família. Para fazer face a esta situação o Governo propõe-se criar unidades de saúde familiar (USF) geridas pelos setores privado e social (chamadas USF de modelo C). Não sei qual o contributo antecipado destas USF para a solução do problema, ou se o seu número é suficiente, ou se existem garantias de qualidade de serviço, ou como será avaliado o seu desempenho. Tudo aspetos que deveriam ser analisados, discutidos e, eventualmente, criticados. Mas não! Discute-se antes se as USF modelo C representam um ataque ao SNS ou se representam o princípio da privatização total do sistema de saúde em Portugal. A esquerda, sempre que se discute saúde remete para o SNS, quase como se de sinónimos se tratassem, como se o SNS fosse o alfa e o ómega. Não obstante o seu papel central, nem tudo o que respeita à saúde em Portugal se esgota no SNS. O que deveria preocupar a todos deveria ser o acesso dos cidadãos a serviços de saúde de qualidade.