Ajudas do Governo aos jovens são bem-vindas mas “é preciso fazer mais”

O Governo decidiu apoiar os jovens na compra de primeira habitação e desde que a medida entrou em vigor, a 1 de agosto, os pedidos de crédito habitação dispararam. Mas as medidas não são suficientes e os problemas continuam: muitos jovens não têm dinheiro para concretizar esse sonho.

Assim que tomou posse, o primeiro-ministro Luís Montenegro tomou medidas que ajudam os jovens na compra de primeira habitação, num país onde é cada vez mais difícil comprar casa, principalmente para quem faz a sua primeira aquisição.

A isenção do IMT ou do imposto de selo permitem aos jovens até aos 35 anos poupar algum dinheiro – que vai sempre depender do valor da casa que queiram adquirir – e a garantia pública até aos 15% também é uma ajuda.

Desde que essa medida avançou, têm disparado os pedidos por créditos habitação. Pelo menos é isso que dizem os dados do idealista, ao revelarem que os jovens até aos 35 anos passaram a representar 49,2% dos pedidos de crédito habitação, comparado a 35,8% em 2023. Olhando para os grupos etários, a faixa de 25-35 anos lidera os pedidos (39,7%), enquanto os jovens até 25 anos aumentaram a sua participação para 9,4%.

Já no que diz respeito ao rendimento e endividamento, os dados dizem que metade dos jovens de 25-35 anos têm rendimentos até 2.000 euros; até 25 anos, 66% ganham abaixo desse valor. E a taxa de esforço média varia entre 29% e 36%.

 Quando ao perfil desses jovens, os jovens com rendimentos entre 2.000 e 4.000 euros são os que mais contratam crédito (37%), com taxa de esforço média de 19%. Seguem-se aqueles com rendimentos até 2.000 euros e que representam 18% dos contratos, com esforço de 33%. Por último, jovens com rendimentos superiores a 10.000 euros brutos também representam 18%, mas com um esforço de 31%.

‘É preciso fazer muito mais’

Paulo Caiado, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), defende que “se essas medidas permitirem que, por si só, alguns jovens consigam aceder a casas que de outro modo não conseguiriam, serão boas medidas”. Até porque dão mais capacidade competitiva aos jovens. “É importante percebermos que, num contexto de mercado caracterizado por escassez de oferta perante fluxos de procura, a realidade é que diferentes compradores concorrem entre si para comprar uma casa. E estas medidas o que fazem é dar aos jovens melhor capacidade competitiva”, defende.

No entanto, é preciso ter em conta que apenas estas medidas não chegam para se resolver um problema que não é de hoje. “É preciso fazer muito mais”, atira Paulo Caiado, que explica o quê: “Nomeadamente, estimular um novo segmento de mercado com casas a preços controlados”. Dessa forma, adianta, “seria possível ter um segmento relevante de mercado onde, de um lado, o Estado tem de dar prioridade a três fatores importantes no preço final de uma casa: o terreno, toda a estrutura fiscal que incide sobre a construção e o prazo de licenciamento de um projeto”.

O presidente da APEMIP não tem dúvidas que o Estado, “ao entregar estes três fatores, pode exigir como contrapartida um preço regulado, estimulando um novo e abrangente segmento de mercado”.

O mercado de arrendamento Sobre estas medidas, André Casaca, consultor e promotor imobiliário, chegou a dizer ao nosso jornal que “a questão essencial é se as medidas do Governo vão realmente melhorar a acessibilidade à habitação para os jovens”, lembrando que em Portugal, “temos um foco desproporcional na ‘acessibilidade à compra de casas’, o que resultou na falta de desenvolvimento de um mercado de arrendamento sólido, que permita comparações fundamentadas entre as duas opções”. O especialista defende que, atualmente, a compra de casa parece ser preferida devido a dois fatores principais: “O preço, que teoricamente torna a compra mais barata do que o arrendamento, e a escassez de opções de arrendamento. Embora a posse de casa seja profundamente enraizada na cultura portuguesa, com cerca de 70% das pessoas a serem proprietárias da casa onde vivem, há um excesso de incentivos à compra e muito poucos ao arrendamento”.

Para equilibrar o mercado, André Casaca defende ser “fundamental aumentar a oferta de habitação no mercado de arrendamento, desenvolvendo projetos arquitetónicos específicos para esta finalidade, diferentes dos destinados à compra e venda”.

E avisa: “Se a oferta de habitação não for ajustada às novas necessidades demográficas e a procura for impulsionada por medidas governamentais de apoio à compra da primeira casa, os ‘descontos oferecidos através da isenção de impostos’ poderão ser anulados pelo aumento dos preços dentro do intervalo estabelecido pelo Governo”.

O jornal teve ainda acesso a um questionário levado a cabo pelos consultores Pedro Almeida e Gonçalo Miguel junto de 367 participantes jovens adultos. Dos participantes, 56,2% diz que já procurou casa para comprar enquanto apenas 27,2% procurou casa para arrendar.

Os números mostram, sem grande surpresa, que o maior obstáculo continua a ser os preços, tanto para compra como arrendamento, apontado por 74,7% dos inquiridos.

Os especialistas fazem ainda a análise a quanto ganham e quanto podem gastar: “A maior parte dos participantes (50,2%) ganha entre 10.200 e 18.000 euros anuais, o que corresponde a cerca de 1.100 a 1.500 euros por mês”. Estes rendimentos “relativamente baixos justificam o facto de 63,7% dos inquiridos conseguirem suportar apenas uma renda entre 500 e 750 euros. A dificuldade em pagar valores superiores é evidente, o que restringe as opções de quem procura uma casa para viver”, lê-se na análise, que acrescenta que cerca de 21% dos inquiridos têm um rendimento anual entre 18.900 e 24.000 euros, enquanto 18,4% ganha mais de 30.000 euros. Feitas as contas, “em termos de despesas com habitação, 21% podem pagar entre 751 e 950 euros, e 15,4% conseguem suportar rendas superiores a 951 euros”.

Mas uma coisa é certa: 65,3% quer comprar casa nos próximos três anos, “o que demonstra que, apesar das dificuldades económicas e dos elevados preços no mercado, o sonho de ter casa própria permanece muito presente nos jovens”.

Com base nos dados recolhidos, Pedro Almeida e Gonçalo Miguel chegaram à conclusão que existe “uma grande contradição entre o que os jovens adultos gostariam de ter e o que efetivamente conseguem pagar”, acrescentando que “embora prefiram casas maiores, a maioria só consegue suportar rendas modestas de 500 a 750 euros por mês, o que limita bastante as opções disponíveis no mercado atual, principalmente tendo em conta o aumento dos preços da construção e da mão-de-obra”.

Casas. As medidas do Governo para os jovens

Isenção de IMT e Imposto de Selo
Na compra de imóveis até 316 772 euros, no continente, e 395 965 euros, nas regiões autónomas, os jovens até aos 35 anos podem beneficiar de uma isenção total do IMT, do Imposto do Selo sobre a aquisição e dos emolumentos (registo da compra e registo da hipoteca, quando aplicável). Caso o imóvel tenha um valor até 633 453 euros, no continente, ou 791 816 euros, nas regiões autónomas, no caso do IMT e do Imposto do Selo, terá uma isenção parcial correspondente à parte até aos 316 772 euros ou 395 965 euros, respetivamente.

Garantia Pública até 15%
Para os jovens que não têm o valor para a entrada na compra da primeira casa, o Estado concede uma garantia de, no máximo, 15% do valor do imóvel. Podem beneficiar do apoio jovens cujo rendimento coletável anual seja inferior a 80 000 euros (o que corresponde ao 8.º escalão do IRS) e que pretendam comprar casa com preço até aos 450 000 euros.

Porta 65 Jovem
O Porta 65 existe desde 2007 e tem como objetivo ajudar os jovens no arrendamento de habitação. Agora há novas regras como a eliminação da renda máxima como critério de exclusão dos candidatos; redução de seis para três meses no número de recibos de vencimento necessários como alternativa à declaração de IRS; Agora, os jovens podem candidatar-se primeiro e depois procurar uma casa, sabendo quanto apoio vão receber. Antes já tinham que ter a casa antes de se candidatar. E há ainda a garantia de uma análise mensal das candidaturas, priorizando os jovens com base no rendimento e na situação familiar, garantindo que os mais necessitados recebam apoio prioritário.