A solução de Costa para dar a volta ao veto de Marcelo

PS vai apresentar alteração à lei em vez de usar maioria de esquerda para contornar o veto presidencial. Solução passa por fazer depender a decisão de subconcessão do parecer das autarquias.

A solução de Costa para dar a volta ao veto de Marcelo

António Costa está decidido a não comprar guerras desnecessárias com Marcelo. A proposta que o PS apresentará hoje no parlamento para o diploma sobre a subconcessão do metro do Porto e dos STCP é mais um sinal disso. Os socialistas decidiram não enfrentar o Presidente da República, encontrando uma solução que julgam ir ao encontro das preocupações expressas por Marcelo Rebelo de Sousa no texto com que vetou a lei.

A solução passa por fazer depender as questões de subconcessão dos transportes públicos do Porto ao parecer favorável das autarquias. “Qualquer decisão relativa à subconcessão ou transmissão de participações sociais nas empresas de transporte público de passageiros da área urbana do Grande Porto carece de parecer prévio das autarquias abrangidas na respetiva área territorial”, lê-se na proposta de alteração do grupo parlamentar do PS a que o i teve acesso.

 “Julgamos que assim vamos ao encontro da preocupação do Presidente”, explicou ao i um alto dirigente socialista.

De facto, no texto do veto à lei que impedia a subconcessão do metro do Porto e dos STCP a privados, Marcelo expressou a sua preocupação com o facto de as autarquias ficarem fora do processo de decisão.

“O regime em apreço, ao vedar, taxativamente, qualquer participação de entidades privadas, representa uma politicamente excessiva intervenção da Assembleia da República num espaço de decisão concreta da Administração Pública – em particular do Poder Local –, condicionando, de forma drástica, a futura opção do governo, em termos não condizentes com o propósito por ele enunciado, e, sobretudo, a escolha das autarquias locais, que o governo se comprometeu a respeitar no domínio em questão”, apontava o Presidente no veto político à lei da Assembleia da República.

“Por princípio, num Estado de Direito Democrático, o legislador deve conter-se, em homenagem à lógica da separação de poderes, não intervindo, de forma casuística, em decisões concretas da Administração Pública”, reforçava Marcelo no mesmo texto. Foi olhando para estas palavras que o PS decidiu introduzir a alteração que deverá hoje ir a votos.

MENSAGEM A MARCELO Por esta limitação à propriedade dos transportes do Porto se tratar de um diploma do parlamento – e não do governo –, bastava que a sua aprovação fosse reconfirmada por maioria simples para se contornar o veto presidencial e a lei ser aprovada.

É por isso que é particularmente significativo o facto de o PS não se limitar a apresentar o mesmo texto no parlamento para o aprovar com os votos de BE e PCP. Os socialistas preferiram introduzir uma alteração no diploma para deixar claro ao Presidente que tiveram em conta as suas palavras. A mensagem é politicamente relevante e surge numa altura em que se espera o veto a uma lei do governo – a lei de acesso aos dados bancários, que está em Belém para apreciação e em relação à qual Rebelo de Sousa já expressou muitas dúvidas. António Costa não quer pôr em causa as boas relações com Marcelo e esta atitude sublinha isso mesmo.

PSD É INCÓGNITA Resta saber como votarão os restantes partidos esta nova versão do decreto. BE e PCP preferiam uma lei que vedasse a subconcessão a privados mas, ontem, fonte do grupo parlamentar socialista admitia ter sinais suficientes das bancadas à esquerda para contar pelo menos com a sua abstenção.

De resto, o texto de alteração proposto pelo PS foi previamente acertado com o PCP, pelo que os comunistas deverão apoiar esta solução.

A posição do PSD era vista no PS como uma incógnita, com os socialistas a puxarem do argumento de que aprovar a lei nestes termos é “ir ao encontro da posição do Presidente”.

O tema é complicado porque a reversão da concessão de transportes a privados tem sido uma das bandeiras da esquerda. Mas esta solução não vai contra o princípio definido pela esquerda, introduzindo uma nuance que reforça o papel da autarquia na decisão final, segundo o que os socialistas consideram ser a principal preocupação do Presidente nesta matéria. “É uma solução de compromisso”, analisa uma fonte do PS.