Monte Branco. Bataglia afunda Salgado

Em um mês esta é a segunda vez que o empresário luso-angolano foi ao DCIAP. Ouvido no âmbito da operação Monte Branco, Bataglia abriu o jogo e empurrou responsabilidades sobre parte do buraco do BESA para Ricardo Salgado 

Hélder Bataglia foi interrogado esta semana no âmbito do processo Monte Branco e terá responsabilizado Ricardo Salgado por uma parte significativa dos créditos que foram concedidos pelo BES Angola (BESA) sem as devidas garantias. Tais financiamentos terão contribuído para o buraco de quase quatro mil milhões de euros que levou ao encerramento deste banco.

O empresário luso-angolano que durante mais de 25 anos foi parceiro do grupo Espírito Santo (GES) em Angola, abrindo as portas à família, identificou inclusivamente aos investigadores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) as offshores e os circuitos que terão servido para escoar o capital.

Segundo o SOL apurou, durante a audição do fundador da Escom, que aconteceu no âmbito do processo Monte Branco, terão sido fornecidos outros dados que poderão vir a ser relevantes para o curso da investigação.

Um dos esclarecimentos de Hélder Bataglia neste último interrogatório foi o negócio da aquisição dos imóveis nas Torres Sky, em Luanda, alegadamente por parte de cinco sociedades offshore detidas por Álvaro Sobrinho e seus familiares, apontando a responsabilidade por estas operações a Ricardo Salgado. Tudo porque o Banco Espírito Santo Angola terá concedido créditos de cerca de 843 milhões de dólares por indicação de Salgado para que tais offshores pudessem adquirir os imóveis à Escom, que pertencia ao GES e que à data estava já muito exposta. Segundo Bataglia, as contas disponibilizadas pelo BESA, por alegada indicação de Salgado, poderão ter sido usadas para outras realidades que estão a ser investigadas pelo DCIAP.

Ouvido duas vezes num mês

Esta é a segunda vez que o luso-angolano é inquirido pelo DCIAP no espaço de um mês. Hélder Bataglia foi ouvido como arguido a 5 de janeiro no âmbito da Operação Marquês, tendo o seu testemunho sido importante para a implicação (e posterior constituição como arguido) de Ricardo Salgado. Tudo porque o empresário responsabilizou o antigo banqueiro pelo pagamento de 21 milhões de euros ao ex-primeiro-ministro José Sócrates como contrapartidas pelas decisões políticas favoráveis aos interesses do Grupo Espírito Santo na Portugal Telecom, entre 2007 e 2010.

Ao traçar o curso dos 21 milhões que passaram pelas suas contas, Bataglia terá assim explicado a proveniência dos 4,5 milhões que Carlos Santos Silva, amigo de José Sócrates, sempre disse terem vindo parar às suas contas na sequência da venda de uma participação sua nas salinas em Angola à Escom.

O SOL já tinha noticiado não ter encontrado registos de que Santos Silva possuísse qualquer participação nessas salinas.

Logo nesta primeira audição, o procurador Rosário Teixeira já tinha colocado algumas questões relativas ao processo Monte Branco, nomeadamente sobre o funcionamento das offshores usadas para fazer chegar os milhões a Santos Silva, bem como sobre a relação que Bataglia tinha com Michel Cannals, o antigo funcionário da UBS que era peça central da Akoya, a sociedade de gestão de fortunas em torno da qual se desenha toda a investigação.

De acordo com a Visão, Bataglia disse que as sociedades usadas seriam «constituídas através do escritório da Dra. Ana Bruno» e que posteriormente à criação eram abertas contas em nome das tais offshores. O empresário luso-angolano afirmou, porém, que a advogada, cujo nome foi noticiado no âmbito da investigação Monte Branco, não tinha o poder de movimentar tais contas.

Ana Bruno tinha uma pequena participação da Akoya, sociedade da qual eram sócios maioritários Hélder Bataglia e Álvaro Sobrinho.

Ricardo Salgado mais uma frente ativa

A meio do mês passado, o antigo presidente do Banco Espírito Santo foi constituído arguido na Operação Marquês. Salgado foi ouvido no âmbito do negócio Portugal Telecom/Oi dias depois do primeiro interrogatório de Bataglia. Em cima da mesa estavam as diversas movimentações financeiras de vários milhões de euros e que, entre 2006 e 2011, tiveram como origem entidades do universo GES e destino final as contas de Carlos Santos Silva.

O Grupo Espírito Santo, enquanto acionista da PT, foi, segundo o MP, um dos grandes beneficiários de todas as decisões tomadas por Sócrates no âmbito do negócio da PT com a Oi. A investigação defende que o antigo primeiro-ministro beneficiou de milhões de euros.

Recorde-se que Zeinal Bava, ex-líder da PT, recebeu duas transferências num total de 18,5 milhões de euros. O MP cruzou informações e as datas dessas transferências cruzam com decisões sobre a venda da Vivo e entrada na Oi. Zeinal Bava «negou tratar-se de qualquer remuneração, contrapartida ou remuneração e esclareceu que se tratou de um valor confiado a título fiduciário, que tinha um objeto contratual definido que não veio a ser concretizado, pelo que o dinheiro, ‘tal como previsto no contrato’, foi devolvido, ‘capital e juros’».

Ricardo Salgado e Hélder Bataglia são já arguidos nos processos Monte Branco e Operação Marquês.