As ‘vacas sagradas’ do Sr. Reitor…

A decisão do reitor de Coimbra, ao proibir o consumo de carne de vaca nas cantinas, ilustra bem a que extremos se pode chegar

Houve tempo, nos idos de 80, em que se plantavam cartazes nas estradas, designadamente no Alentejo, de boas vindas a «zonas livres de armas nucleares». Era uma patetice cultivada por zelosos militantes comunistas, que não trazia mal ao mundo e que entretinha alguns ócios ou, simplesmente, provocava um encolher de ombros. 

As causas foram evoluindo e, embora o risco nuclear não tenha desaparecido – bem pelo contrário –, o esquerdismo radical, apostado em infantilizar o país, derivou para as questões do género, da ‘crise climática’ ou do ‘animalismo’. 
A decisão pasmada do novo reitor da Universidade de Coimbra, Amílcar Falcão, ao proibir o consumo de carne de vaca nas cantinas daquela vetusta instituição, ilustra bem a que extremos se pode chegar, se não houver nenhum travão de bom senso para o disparate. 

Mais espanta ainda que este gesto patético tenha sido produzido por um ilustre lente, catedrático farmacêutico, de quem seria de esperar outro rigor científico e capacidade de discernimento para não descer ao nível da sebenta ideológica, baseada em fundamentalismos tolos, à pala das alterações climáticas – o muito citado «combate de vida», que convenceu António Guterres, enquanto secretário-geral da ONU, a aceitar uma ridícula capa da revista Time onde apareceu fotografado de fato e gravata com água pelos joelhos…

É o mesmo ridículo que cobre o anúncio do reitor coimbrão, na cerimónia de receção aos estudantes, no início do ano letivo. 

Eleito em fevereiro, sob o lema olímpico ’Citius, Altius, Fortius, caiu afinal numa fraqueza rudimentar, ao banir o consumo de carne de vaca das cantinas universitárias com o patusco objetivo de que Coimbra seja a «a primeira universidade portuguesa neutra em carbono até 2030». Claro que o líder do partido ‘animalista’ não tardou em elogiar-lhe «a coragem». Bizarro. 

Enquanto o ‘veganismo’ toma conta da velha Academia, são de temer, em coerência, outras proibições de tudo o que seja portador de proteína animal. São as ‘vacas sagradas’ do reitor, que já serviram para pôr dois ministros – Ambiente e Agricultura – em rota de colisão… 

Razão teve Marcelo Rebelo de Sousa para prevenir, sem «eufemismos», embora noutro contexto, que «vivemos tempos difíceis (…), ameaçados por formas veladas e subtis de ditaduras (…), questionados por posições ou manifestações radicais ditas populistas».

Por coincidência, o discurso coincidiu com o dia em que ficaram conhecidas várias sondagens que colocam o PS à beira da maioria absoluta e mostram os partidos radicais populistas de esquerda a crescer. 

Se acreditarmos nas previsões, tal poderá significar que, a 7 de outubro, o país acordará para a possibilidade real de ter uma arrogante maioria de esquerda, ancorada em dois terços dos assentos parlamentares, o suficiente para lançar uma revisão constitucional, moldando o regime a um ‘colete de forças’, com tiques autoritários. É um cenário inquietante. 

Confiemos, entretanto, que o eleitorado, no tocante ao PS, não tenha esquecido as sequelas da maioria absoluta na era de Sócrates, nem ignore qual é a verdadeira natureza dos partidos comunistas ou neocomunistas, por muito ‘travestidos’ que apareçam de ‘sociais democratas’. 

De facto, o atual PS das ‘contas certas’ foi o mesmo que assinou de ‘corda ao pescoço’ o memorando com a troika, com os cofres do Estado vazios. A austeridade que se abateu sobre os portugueses tem a sua assinatura.

Convirá ainda ter presente que este PS se rendeu, passivo e cúmplice, aos desvarios de um seu primeiro-ministro, acusado em outubro de 2017 pelo Ministério Público da «prática de crimes de corrupção passiva de titular de cargo político (3), branqueamento de capitais (16), falsificação de documento (9) e fraude fiscal qualificada (3)». 

Mas não só. Distinguiu-se, igualmente, ao longo da legislatura, por indícios de favorecimento de amigos e compadres, prática que ficou conhecida por ‘familygate’. 

Ao sentir-se ‘apertado’, António Costa conseguiu dizer, sem corar, que «o nepotismo é inaceitável» e que «ninguém pode em caso algum ser nomeado por ser familiar de…». Viu-se. 

É verdade que não é por se falar muito de ‘maioria absoluta’ que esta se confirma. Mas os próximos de Costa, desde Ana Catarina Mendes a Mário Centeno, andam num reboliço e já a defendem sem a menor parcimónia. 

Costa aprendeu a lição e hoje está ‘de pedal a fundo’, persuadido de que chegou a hora de ‘vingar a afronta’ de 2015. 
Premonitório, já em maio o Presidente da República profetizava que «há uma forte possibilidade de haver uma crise na direita portuguesa nos próximos anos», enquanto se atribuía, nesse contexto, um papel «importante para equilibrar os poderes». 

Poderá estar perto de acertar na profecia, mas, se tal suceder, depressa verificará que se enganou nos pressupostos sobre o seu papel de ‘fiel da balança’.

Se o PS repetir a maioria absoluta, a capacidade de intervenção presidencial ficará substancialmente reduzida, até porque Marcelo não tem a personalidade de Mário Soares, nem será capaz de replicar algo parecido com as suas ‘presidências abertas’, lançadas em ‘santa cruzada’ contra Cavaco. 

Porém, se as esquerdas unidas alcançarem a maioria de dois terços, o Presidente ficará refém do Parlamento e o país sujeito ao frentismo de esquerda , impondo a ‘cartilha’ que não conseguiu por via revolucionária.
A apatia da oposição à direita ajudou. Desde que foi eleito líder, Rui Rio fugiu a confrontar o Governo com os seus erros, como se tivesse assinado ‘um pacto de não agressão’.

Percebeu tardiamente que Costa lhe ‘roeu a corda’, e por muito que insista agora em ter voltado à política para se candidatar a primeiro-ministro e não a deputado, o discurso peca por estar desajustado quando desperdiçou, meses a fio, a oportunidade de consagrar-se como verdadeira alternativa.

Rio ‘ressuscitou’ no frente-a-frente com Costa, e por várias vezes o ‘levou às cordas’, colocando-o na defensiva, apesar do tema da corrupção, envolvendo as suspeitas que recaem sobre Sócrates, ter passado ao lado. 
Tivesse Rio ‘dado corda aos sapatos’ mais cedo, como lhe competia, e não estaríamos hoje no vestíbulo de uma grande incerteza. Mas se ao menos tiver convencido alguns indecisos, já valeu a pena.