Daniela Soares Ferreira e Sónia Peres Pinto
A Câmara de Lisboa vai pagar 11 milhões de euros à organização da Web Summit, apesar do evento ser realizado este ano à distância. A garantia é dada ao SOL por Sofia Vala Rocha, vereadora do PSD na autarquia. A responsável questiona porque é que o contrato não foi renegociado, já que os argumentos da Câmara de que o evento iria beneficiar os hotéis e a restauração, este ano não colhe. «Desta vez, sendo o evento à distância, não faz sentido as contrapartidas serem as mesmas. Nem a hotelaria nem a restauração vão sair beneficiadas», considera.
Em causa está o acordo da autarquia que prevê o pagamento de 11 milhões de euros anuais à organização deste evento, que perfaz um total de 110 milhões de euros, pagos até 2028. «Disse desde o início que o evento não podia ser feito naquelas modalidades». Uma questão que ganha maior revelo quando o evento, este ano, é feito através da internet. «Trata-se de um negócio digital em que ninguém ganha com este encontro». E relembra: «O contrato inicial foi realizado por Pedro Passos Coelho durante a Troika em que a autarquia pagava 1,5 milhões de euros durante três anos». «Entretanto a autarquia, por Fernando Medina, resolveu realizar um contrato com Paddy Cosgrave de 10 anos, o que é uma eternidade para o mundo digital».
Esta questão foi colocada por João Pedro Costa, vereador do PSD na Câmara de Lisboa, ao garantir que Fernando Medina ficou de dar à oposição informações sobre a Web Summit deste ano. «Fiz um pedido expresso em reunião de Câmara que foi acompanhado pelo CDS e o presidente da Câmara comprometeu-se a informar os vereadores sobre o formato e apoios da CML».
E lembra ainda: «Nessa reunião avancei que o formato digital não deixa de trazer enormes oportunidades a Lisboa e ao setor empreendedor nacional». Reconhece, ainda assim, que «a oposição tem tido uma atitude positiva e colaboradora relativamente à Web Summit, até porque foi iniciada num Governo PSD».
Argumentos que não convencem Sofia Vala Rocha. Para a vereadora, o que está em causa é o erário público. «Não havia necessidade de ficar com a Web Summit durante 10 anos aos preços que eles queriam. Não estou a ter uma atitude protecionista mas quero saber quantos postos de trabalho foram criados em Portugal desde que a cimeira tecnológica veio para Portugal». A responsável questiona ainda por que «são atribuídos 11 milhões de euros a este evento quando a autarquia atribui 20 milhões de euros ao comércio e restauração, para oito mil empresários que valem cerca de 80% do setor e que empregam 100 mil pessoas».
A agravar esta situação estão, de acordo com a responsável, as negociações Fundação AIP – que detém a FIL, o Centro de Congressos e a Praça Sony – para criar condições condições para que o espaço entre pavilhões fique unido, o que irá aumentar de forma significativa a área atualmente existente. Outra das alterações diz respeito à cobertura das traseiras da FIL, o que irá permitir instalar ali salas de reuniões. Também a Praça Sony será alvo de alterações. A ideia é construir um pavilhão com vários andares.
Feitas as contas, a expansão da Feira Internacional de Lisboa permite que a área expositiva quase triplique, para cerca de 111 mil metros quadrados. Um investimento contabilizado na ordem dos 150 milhões de euros, daí a Fundação AIP ter apontado um prazo de 10 anos para o desenvolvimento de todas estas obras.
Questionados pelo SOL, nem a autarquia, nem o Ministério da Economia prestaram quaisquer declarações até ao fecho desta edição.
O que ganha Portugal?
Ao certo, não há valores que quantifiquem quanto Portugal tem ganho por ser o palco da Web Summit. O que se sabe é que, no ano passado, a cimeira tecnológica trouxe benefícios evidentes à economia portuguesa e ao setor do turismo, restauração e alojamento. Os participantes do evento terão gasto cerca de 64,4 milhões de euros durante os quatro dias do evento, destacando-se a despesa associada ao alojamento, que representou 125 euros por dia, segundo uma análise da AHRESP.
Foram registados «cerca de 64,4 milhões de euros de gastos dos visitantes nos quatro dias do evento», apurou a Associação de Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) no seu estudo sobre a estimativa do impacto da Web Summit ao nível dos gastos dos visitantes, da procura e do impacto nas atividades do alojamento turístico.
Recorde-se ainda que um estudo do ano passado revelado pelo ministro da Economia, Siza Vieira, indicava que a Web Summit 2019 terá tido um impacto de 180 milhões de euros, valor que representou um crescimento de 75 milhões de euros face à edição de 2018. O valor calculado incluía o retorno direto dos 70 mil visitantes (64 milhões de euros por quatro dias de evento), mas também ganhos na capacidade do país atrair atenção mediática, negócios e empresas tecnológicas.
Ainda assim, a edição do ano passado ficou além das expectativas. Eram esperadas 100 mil participações mas a cimeira tecnológica recebeu ‘apenas’ 70 mil de 163 países, de acordo com os dados oficiais.
O Estado e a Câmara de Lisboa investiram mais de 20 milhões de euros para apoio à realização do evento e esperam um retorno de «centenas de milhões», mas, para já, não há informações concretas que indiquem quais os reais benefícios da Web Summit para Portugal.
A edição de 2020 fica ainda mais comprometida dado o contexto da pandemia, tendo em conta que se realizará em formato digital.