Campanha para todos os gostos

António Costa evita ao máximo as ações de rua e as restrições por causa da pandemia até deram jeito. O PS aposta nas redes sociais e nos contactos com os eleitores através dos outdoors ou de mensagens como o postal de natal. Rio privilegia a rua. 

Campanha para todos os gostos

António Costa de rosto fechado e Rui Rio com um pronunciado sorriso são imagens a que o eleitorado não está muito habituado, mas que os conselheiros de marketing dos dois líderes partidários parecem ter fixado para os outdoors da campanha eleitoral para as legislativas de dia 30 de janeiro.

Para os especialistas ouvidos pelo Nascer do SOL, o ar mais austero de António Costa pretende transmitir uma imagem de estadista e de rigor – mais ‘à Cavaco’ – que lhe permita perseguir a almejada maioria absoluta. Por seu lado, o lado mais sorridente de Rui Rio e dos candidatos sociais-democratas que aparecem a seu lado nos cartazes espalhados pelo país pretende fazer passar uma imagem de confiança numa vitória do PSD, sendo que um ar mais sério ou menos alegre poderia ser lido como uma imagem de derrota.

A três semanas da ida às urnas, a guerra de cartazes já está nas ruas, neste particular com clara vantagem para o PS, que tem visivelmente mais meios. Aliás, uma evidência disso mesmo, foi o postal de natal que António Costa deixou nas caixas de correio dos portugueses no período de Natal e Ano Novo, com a mensagem de Boas Festas.

O PS, além disso, depois de ter mobilizado os seus militantes através de call centers contratados pelas respetivas federações distritais, têm agora as armas apontadas para as redes sociais, utilizando particularmente o Whatsapp com redes ou grupos geograficamente limitados (e correspondentes às federações dos partidos).

O PSD e Rui Rio também não deixam de trabalhar as redes sociais – o líder social-democrata continua a privilegiar o Twitter – mas só na próxima semana deverão começar a ser distribuídos nas caixas de correio os primeiros panfletos com a mensagem de propaganda do partido e a cara do líder e do respetivo cabeça de lista por distrito.

Quanto às redes sociais, António Costa deu o pontapé de saída no dia imediatamente seguinte ao debate entre Rui Rio e André Ventura, com um vídeo a acusar o líder do PSD de defender a prisão perpétua.

«Ontem vi o Dr. Rui Rio considerar em direto com André Ventura diferentes modalidades para restabelecer a pena perpétua. Quero ser muito claro. Em circunstância alguma nós podemos ceder nos princípios ou nos valores. O combate ao populismo exige linhas vermelhas inultrapassáveis», disparou o primeiro-ministro, que acusou Rio de «conveniência ou necessidade eleitoral».

 

Rio arrancou este sábado na estrada

Uma tomada de posição que não produziu os melhores efeitos, já que, mesmo entre militantes socialistas, conforme o Nascer do SOL conseguiu apurar, a mensagem de Costa foi considerada um «erro» – «Parecia mais uma tentativa desesperada de criar factos políticos artificiais».

Ainda assim, os mesmos socialistas consideraram que Rio se deixou enredar na agenda de Ventura e foi claramente derrotado no debate com o líder do Chega, que é mesmo apontado pela esmagadora maioria dos analistas como o mais beneficiado pelo modelo dos frente-a-frente de apenas 25 minutos.

Carlos Carreiras, presidente da Câmara Municipal de Cascais, num artigo de opinião publicado no i, também criticou o modelo de debates, considerando que «são apenas o culminar de um processo de simplificação da vida política e de infantilização do eleitorado que, paradoxalmente, só pode tornar o regime menos livre e menos democrático». E concluiu que beneficiam os extremos e quem tem capacidade para falar mais alto e mais rápido (leia-se, André Ventura).

A verdade é que, independentemente da do modelo, tanto Costa como Rio estão conscientes da importância do confronto entre ambos na próxima quinta-feira, 13 – vá lá saber-se de sorte ou de azar para quem.

As primeiras prestações não correram bem nem ao líder do PS (que se deixou irritar por André Ventura), nem especialmente a Rui Rio (que ainda não conseguiu impôr a sua agenda).

A falta de forma de Rio nos primeiros debates é reconhecida pelo seus apoiantes, que, no entanto, salientam que o confronto que «importa» é o de dia 13 com António Costa.

E lembram a campanha de 2019, em que os debates também não correram particularmente bem a Rio, que apenas conseguiu reverter pontos nas ações de rua, onde António Costa é assumidamente menos eficaz.

O líder do PSD começou ontem a volta pelo país, em Matosinhos, com uma ação que teve o IVA da restauração como tema central.

 

Os ‘efeitos’ da covid-19

Neste ponto, as restrições por causa da pandemia da covid-19 acabam por ser favoráveis ao líder socialista.

Com os infetados com covid-19 a bater recordes no país, esperam-se menos arruadas, menos comícios e menos contactos físicos.

Isto numa altura em que muito se debate sobre como poderão os portugueses em isolamento votar – e todas as dores de cabeça que traz ponderar sequer a suspensão do isolamento para exercer o direito de voto, o que abriria um precedente ‘perigoso’, como alertou Paulo Otero, ao Nascer do SOL. O constitucionalista começou por augurar que, muito provavelmente, o parecer pedido pelo Governo ao conselho consultivo da Procuradoria Geral da República (PGR), para saber se o isolamento impede as pessoas de exercer o seu direito ao voto, já nem deverá chegar em tempo útil de poder permitir uma resposta adequada por parte da Administração Central e das Autarquias.

De facto, apesar de a presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, a socialista Luís Salgueiro, garantir que está tudo pronto para as autarquias responderem aos desafios do voto antecipado e do dia da ida às urnas, em matéria do exercício do direito de voto por parte de eleitores em isolamento profilático ou preventivo não está nada ainda preparado com as autarquias.

E Paulo Otero alerta ainda para um outro pormenor, tipo ‘efeito colateral’, que uma eventual suspensão do isolamento para ir votar poderá acarretar: aqueles que, não estando em isolamento, nem infetados, tendo receio de contactar com alguém infetado nas filas ou nos centros de votação, poderão decidir não se dirigir aos mesmos nestas eleições, contribuindo para o aumento da abstenção.