Pedro Nuno tem ‘credibilidade minada’

Revelação sobre o caso TAP desiludiu socialistas. Marques Mendes diz que ‘aos olhos dos portugueses’ Pedro Nuno ‘mentiu’. José Filipe Pinto não vê condições para o ex-ministro chegar a líder do PS.

Pedro Nuno tem ‘credibilidade minada’

por Joana Mourão Carvalho e Sónia Peres Pinto

A saída limpa do Governo que Pedro Nuno Santos tentou ensaiar acabou manchada. Afinal, o antigo ministro das Infraestruturas  sabia, e autorizou-a, da indemnização paga a Alexandra Reis pela saída da TAP.  Ou melhor: foi informado do montante do acordo e deu «anuência política para fechar o processo».

A informação chegou na passada sexta-feira à noite, num longo comunicado, no qual o ex-ministro explicava que tinha andado a tentar «reconstruir a fita do tempo» sobre o caso de Alexandra Reis desde o dia em que apresentou o seu pedido de demissão, a 28 de dezembro. Após 22 longos dias, eis que Pedro Nuno Santos assumiu o ‘lapso de memória’, por coincidência após a CEO da TAP ter sido ouvida no Parlamento.

De acordo com a sua tese, nem ele, nem a sua chefe de gabinete, nem mesmo o seu secretário de Estado – o mesmo que assinou a anuência política – tinham memória de uma comunicação informal anterior (leia-se uma mensagem de WhatsApp) em que assumiam que era sua «convicção, em face da recomendação da CEO da TAP e da sua equipa de advogados e das informações que receberam dos mesmos, que não era possível reduzir mais o valor da compensação» paga à ex-gestora da TAP.

Certo é que este ‘pequeno’ detalhe, custou muito caro ao ex-governante e, sendo o assunto a TAP, o dossiê que mais tempo o ocupou, a tese de que apenas se tratou de um ‘lapso de memória’ não convence nem a oposição nem os socialistas.

Se, há duas semanas, nas bases socialistas já havia movimentações para se começar a traçar o caminho na corrida pela sucessão de António Costa, com fervorosas declarações de solidariedade, com esta nova revelação o sentimento entre pedro nunistas é agora de clara «desilusão».

Ainda assim, há quem tente explicar a jogada de Pedro Nuno como uma «tática» para não contaminar o seu futuro político. «Assumindo já o erro permite-lhe pelo menos passar a imagem de transparência», conjetura um antigo dirigente socialista ao Nascer do SOL.

No programa O Princípio da Incerteza, da TSF e da CNN Portugal, a deputada Alexandra Leitão, que tinha saído em defesa de Pedro Nuno quando o ministro se demitiu – classificando-o como um «ativo importante no futuro do PS e do país» –, disse agora querer acreditar que «houve um lapso de memória».

«No fundo, eu quero acreditar – porque dou sempre o beneficio da dúvida – que houve um lapso de memória, que obviamente não ocorre no melhor momento ou quanto ao melhor assunto, mas que também quer dizer uma coisa: uma vez tendo Pedro Nuno Santos saído do Governo, não creio que isso, neste momento, tenha efeitos sobre as condições políticas do Governo em si», acrescentou.

Luís Marques Mendes é da mesma opinião. Para o comentador, a revelação do ex-ministro das Infraestruturas não fragiliza de todo o Executivo de António Costa, precisamente porque Pedro Nuno já não está no Governo.

Mas, se o Governo sai ileso deste capítulo da história, o mesmo não pode dizer-se do putativo candidato à liderança do PS. Ao Nascer do SOL, Marques Mendes classifica toda esta situação como «surreal»: «É uma pessoa que disse uma coisa há um mês, e um mês depois disse uma coisa oposta. Supostamente não sabia de nada no princípio e afinal sabia de tudo».

Na ótica do antigo líder do PSD,  na prática, a assunção deste erro tem apenas desgaste político na imagem de Pedro Nuno, contrariando a teoria de que este foi um sinal de transparência: «Mina a sua imagem de credibilidade».

Apesar de se conter em apelidar de mentira a justificação apresentada por Pedro Nuno, Marques Mendes não tem dúvidas de que «aos olhos dos portugueses a ideia que têm é que ele mentiu».

 

‘Não terá condições para líder’

Para o politólogo José Filipe Pinto, Pedro Nuno Santos é «especialista em fazer mea culpa», daí vir agora revelar que afinal estava a par da indemnização de Alexandra Reis, considerando que se tratou de uma «jogada de antecipação», mas que só veio admitir o «erro» depois de a CEO da TAP ter dito no Parlamento que tinha documentos que provavam que tinha informado a tutela e que tinha recebido a luz verde por parte do Ministério. «Pedro Nuno Santos ficou numa situação altamente periclitante, pois poderia ser confrontado mais tarde pela opinião pública que afinal tinha conhecimento da situação, depois de ter negado esse aval. Isso iria fragilizá-lo imenso e iria pôr em causa a sua carreira política. É um erro que tem uma dimensão ética que tem obrigatoriamente que acarretar consequências políticas».

E acrescenta: «O PS não poderia nunca eleger alguém para secretário-geral, tendo uma nódoa destas no seu currículo. Daí ter-se antecipado nesta jogada. Tentou acalmar as ondas de choque que iriam surgir e que poderiam pôr em causa todo o seu futuro político, acenando com um lapso e não com um erro». Um argumento que não convence o politólogo ao reconhecer que o seu futuro «fica altamente comprometido».

Sobre as ambições políticas  de Pedro Nuno Santos não hesita: «Tem o futuro político muito dificultado. Sei que a memória é piedosamente seletiva e só se lembra daquilo que se quer lembrar. Mas tenho muitas dificuldades em perceber que um partido possa ter à sua frente alguém que prestou declarações de uma gravidade enorme e depois foi obrigado a negar perante o que tinha afirmado anteriormente. Pedro Nuno Santos é muito jovem, mas a democracia já começa a não ser assim tão jovem para se poder dar ao luxo de branquear passados e, desta forma, dificilmente terá condições para chegar a líder do Partido Socialista».

No entanto, lembra que Pedro Nuno Santos era líder de uma fação no PS, onde ainda estão Duarte Cordeiro e João Galamba, que continuam a liderar ministérios, «num setor do PS que não se importa de vez em quando de ter um discurso que não vá no sentido do politicamente correto».

Mas estes problemas, de acordo com José Filipe Pinto, refletem a aposta de António Costa em se rodear de pessoas da sua confiança, muitas delas apontadas como seus possíveis sucessores, mas que «afinal de contas têm muitos pés de barro».

Outra dor de cabeça poderá ser Fernando Medina devido às investigações feitas à câmara de Lisboa, altura em que o atual ministro das Finanças era autarca. «Fernando Medina foi o sucessor de António Costa, vamos lá ver se ainda não vamos ter acesso a algumas notícias sobre a gestão de António Costa, que ponham em causa também o exercício do atual Primeiro-Ministro enquanto líder da Câmara de Lisboa», diz ao Nascer do SOL.

Polémicas que levam o politólogo a considerar que o PS está a viver atualmente uma situação muito complicada, apesar de ter um Governo de maioria absoluta. «Há aqui um preço político a pagar por comportamentos pouco éticos. E já se começa a falar em existir quase que uma profissionalização ou nepotismo por parte do PS no que diz respeito às nomeações para cargos não apenas governamentais, mas para cargos que dependam da nomeação por parte do Executivo».

De resto, o regresso de Pedro Nuno Santos à bancada parlamentar do PS_em fevereiro, para assumir o mandato de deputado, também não vai ser sem embaraço, já que pela mesma altura, no Parlamento, vai entrar em funções a comissão de inquérito sobre a tutela política da gestão da TAP, proposta pelo BE, sendo quase certo que o antigo governante vai ser ouvido e terá de responder às perguntas dos deputados.