Costa Silva afronta aparelho do PS

‘No jobs for the boys’ parece ser a máxima do ministro da Economia, que prefere nomear para os organismos do Estado pessoas da sua confiança, mesmo que o currículo esteja ‘ao lado’.

Costa Silva afronta aparelho do PS

Por Daniela Soares Ferreira e Sónia Peres Pinto

O ministro da Economia continua a desafiar o aparelho socialista. Depois de ter ‘despachado’ dois secretários de Estado – trocou João Neves e Rita Marques por Pedro Cilínio e Nuno Cardona Fazenda de Almeida -, agora anda a nomear pessoas de sua confiança para o IAPMEI, que está sob a sua tutela. Ao que o Nascer do SOL apurou, algumas das nomeações são de profissionais que estiveram a trabalhar com Costa Silva na Partex.

Um desses casos, e que tem caudado polémica, foi a nomeação de Luís Pratas Guerreiro para o cargo de presidente da Agência para a Competitividade e Inovação, em substituição de Francisco Sá, que se demitiu em janeiro. Mas o nosso jornal sabe que o pedido de demissão terá sido forçado, já que o ministro da Economia preparava-se para mudar a direção do IAPMEI, escolhendo para a liderança  o seu adjunto, que curiosamente trabalhou com ele na Partex.

E as mudanças não ficam por aqui. O governante prepara-se ainda para afastar a gestão do Instituto Português de Qualidade e para nomear uma nova administração para a Agência Nacional de Inovação, após Joana Mendonça, que assumiu o cargo em maio de 2021, ter também pedido a demissão, em rutura com os Ministérios da Ciência e da Economia. 

«Não tenho até ao momento, e passado mais de um mês, resposta ao meu pedido de aprovação da proposta para o Plano de Atividades em Orçamento da ANI para 2023, já devidamente aprovado em Assembleia Geral e com o devido parecer favorável do Conselho Consultivo da ANI e sem o qual a ANI não pode desenvolver as suas atividades de forma regular. Em particular, a solicitação de uma reunião de trabalho com a Sra. Ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior [Elvira Fortunato] não teve qualquer resposta até ao momento», disse no início deste mês. 

Críticas que não levaram o ministro da Economia a baixar os braços. No Parlamento, disse apenas que as pessoas «não são insubstituíveis», referindo-se à saída de Joana Mendonça, nomeadamente «nos lugares do Governo e serviço público», e pediu aos deputados para não se deixarem «iludir pelas demissões».

Ainda esta semana, o secretário de Estado da Economia afirmou que o cargo de vice-presidente do IAPMEI, criado no ano passado, mas ainda por ocupar, «vai ser preenchido nos próximos dias» e que a equipa do organismo vai ser reforçada, recordando que o cargo «foi criado para reforçar a capacidade do IAPMEI na implementação do PRR [Programa de Recuperação e Resiliência]», e que o objetivo é «dar um sinal de aumentar a capacidade de gestão do IAPMEI a esse nível».

Já quando questionado sobre se as alterações recentes e em curso na cúpula de vários organismos na esfera do Ministério da Economia – o IAPMEI, a Agência Nacional de Inovação (ANI), a AICEP e o Banco Português de Fomento – poderão afetar a execução dos fundos comunitários e do PRR, Pedro Cilínio garantiu que não. «Estamos a fazer as mudanças de forma que as operações continuem dentro da normalidade e, gradualmente, possamos introduzir as melhorias que todos nós queremos ver no desempenho das organizações», disse. 

Também na quarta-feira, a ministra da Presidência anunciou que está em curso o reforço de recursos humanos. «Estamos, neste momento a organizar, creio que alguns já em curso, um recrutamento muito centrado na Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e IAPMEI, organismos fundamentais para a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)» e a introduzir «mecanismos para facilitar a contratação externa de algumas destas equipas» disse Mariana Vieira da Silva, no balanço da execução do PRR.

Peso do PRR

Ao IAPMEI cabe a coordenação e/ou participação nas seguintes componentes do PRR: capitalização e inovação empresarial, descarbonização das indústrias, Empresas 4.0. E, recentemente, o Governo disse querer concluir a «muito breve prazo» o processo de negociação e de contratação das 52 agendas mobilizadoras para inovação empresarial, anunciando até que vai ser reforçado o nível de adiantamento e de pagamento para esse mega projetos no âmbito do PRR. «Uma das medidas que estamos a implementar é aumentar o nível de adiantamento em mais dez pontos, para que todas as Agendas tenham um volume adicional de verbas para arrancarem os seus investimentos», disse o secretário de Estado da Economia.

Também recentemente, o IAPMEI realizou algumas mudanças na estrutura orgânica com o principal objetivo de responder aos novos desafios, principalmente no que diz respeito à implementação do PRR. Francisco Sá alterou as competências do departamento de fiscalização e controlo para desenvolver a auditoria interna e monitorizar, fiscalizar e controlar a aplicação das verbas públicas nos projetos de investimento.

Esta deliberação foi publicada em Diário da República e diz que o departamento de fiscalização e controlo passa a ter de «assegurar a existência e verificar o cumprimento das normas internas necessárias para o cumprimento dos requisitos formais e legais que regem a atividade do IAPMEI», assim como «acompanhar a execução do plano de gestão de riscos de corrupção e infrações conexas e proceder à sua revisão anual» e ainda «identificar e promover as melhores práticas, designadamente, controlando a implementação das recomendações das auditorias, inspeções e ações de seguimento de que o IAPMEI seja objeto».

Recorde-se que o IAPMEI selecionou 13 polos de inovação digital para receber financiamento no âmbito PRR que representam um investimento de 68 milhões de euros, anunciou o Governo. «O IAPMEI selecionou 13 dos 17 polos de inovação digital candidatos para receber financiamento da componente 16 do PRR no âmbito do processo de reconhecimento nacional e de acesso à Rede Europeia de ‘Digital Innovation Hubs’ (DIH)», anunciou o Ministério da Economia e do Mar.

Recorde-se que o montante total do PRR (16,644 milhões de euros), gerido pela Estrutura de Missão Recuperar Portugal, está dividido pelas suas três dimensões estruturantes: resiliência (11, 125 milhões de euros), transição climática (3059 milhões de euros) e transição digital (2460 milhões de euros).

Da dotação total, cerca de 13,9 milhões de euros correspondem a subvenções e 2700 milhões de euros a empréstimos.

Já este mês, o IAPMEI foi alvo de buscas pela Polícia Judiciária (PJ). As averiguações não terão a ver diretamente com o IAPMEI, mas com o Fundo para Revitalização e Modernização do Tecido Empresarial em particular. Fundo esse que serviu para ajudar empresas que se revelaram em situação económico-financeira difícil. 

Pai da ‘bazuca’ abandonou petrolífera

Tal como o Nascer do SOL avançou em setembro de 2021, Costa Silva abandonou a administração da Partex poucos dias antes dos trabalhadores receberem uma nota da empresa a dizer que ia ser liquidada até ao final desse ano.

Recorde-se que a Partex foi vendida em junho de 2019, pela Fundação Gulbenkian, por 622 milhões de dólares (cerca de 555 milhões de euros). A Fundação já tinha manifestado a intenção de sair do negócio da exploração de petróleo, com ativos avaliados em cerca de 457 milhões de euros, para ser mais sustentável, um negócio criado em 1938 pelo seu fundador, Calouste Gulbenkian.

Anos depois e agora com o novo cargo, o ministro da Economia volta a rodear-se de pessoas da sua confiança para organismos públicos. 

E as suas escolhas, especialmente quando os currículos não correspondem ás áreas de intervenção, elevam os protestos no interior do partido.

No aparelho socialista, Costa Silva enfrenta cada vez mais contestação, especialmente porque é  notório que prefere nomear os seus ‘boys’ e ignorar ou mesmo afrontar as recomendações oriundas do Largo do Rato.