Apesar de considerar que o Presidente usou "um tom um pouco excessivo" e até "contraproducente" (na parte em que parecia "apelar" à violação da disciplina de voto dos deputados do PS), Marques Mendes considera que foi a forma encontrada para salientar que está a cumprir o seu papel. "No fundo, ele vem dizer: 'esse acordo, se existir, eu não acho que tenha consistência e, se pudesse, convocava era novas eleições; como não posso, já cumpri a minha parte ao chamar a atenção e ao dizer que estou preocupado com os efeitos, mas agora é com os senhores deputados'."
Governo de iniciativa presidencial 'só em ficção científica'
Para o ex-líder do PSD, o governo de Passos "vai cair no Parlamento, não vale a pena ter grandes ilusões": "Não vai haver violação da disciplina de voto no PS (e até acho que não deve haver, por uma questão de principio, pois há matérias em que a disciplina é essencial".
Depois, em teoria, Cavaco Silva terá três hipóteses. A primeira é um governo de iniciativa presidencial — o que "é ficção científica", salienta Mendes, pois "da mesma maneira que PS, PCP e BE chumbarão o governo PSD-CDS farão o mesmo em relação a um governo de iniciativa presidencial".
A segunda possibilidade seria um governo de gestão: "Não acredito que o Presidente equacione sequer essa hipótese, porque um governo de gestão não decide nada, nem pode aprovar um Orçamento do Estado. Pelas minhas contas, se isso acontecesse, só teríamos o Orçamento de 2016 em novembro desse ano, era o descalabro".
É por isto que o conselheiro de Estado acredita que Cavaco dará posse a um governo de Costa, se os três partidos da esquerda chegarem a acordo. "Além disso, recordo que os governos dependem é da AR. Se esta chumba o governo e diz 'está aqui outro', o Presidente pode não concordar — e já o disse, já fez um aviso para memória futura de que isso até pode trazer um segundo resgate –, mas ele não tem poderes para opor-se".
Para Mendes, Cavaco "deve" é colocar a António Costa exigências em termos de cumprimento de compromissos: com o tratado orçamental e os tratados internacionais, por exemplo, e que seja um acordo para quatro anos de governo.
Apelo à contenção verbal
Mendes notou ainda que "estamos a viver um período muito tenso, em que há crispação a mais e serenidade e tolerância a menos" no discurso dos políticos, e fez um apelo tanto aos intervenientes à esquerda como aos da direita "de contenção verbal": "Ninguém precisa de ser frouxo ao defender as suas convicções, mas pode ser sensato".
Quanto ao próximo governo da coligação, que será feito para chumbar no Parlamento, diz que deve ter a maior qualidade possível e aconselhou Passos a fazer uma mistura de "ministros técnicos e ministros mais de combate político", bem como "um programa de governo ao centro e não acantonado à direita, até com algumas propostas do programa do PS, para dar um sinal de abertura que a coligação nem sempre tem dado" e para fazer a diferença em relação aos socialistas.