O Presidente da República assumiu ser confrontado com a questão sobre se "faria ainda sentido uma cerimónia, aparentemente de mera rotina, num claustro fechado?", invocando as dúvidas que tantas vezes são enunciadas por quem já se mostra cansado deste ritual.
"Não seria preferível viver a data fora deste hemicicilo, junto de mais portuguesas e portugueses, num gesto de abertura da política a problemas concretos do cidadão comum, inovando nas ideias e ultrapassando a sensação de se estar a ver o mesmo, ainda que pessoas e circunstâncias fossem diferentes?", perguntou o Presidente, que acha que a resposta não podia ser mais clara.
"Faz sentido manter viva esta tradição. Hoje, mais do que nunca. Para mostrar que não nos esquecemos da nossa História e que há datas que não foram nem nunca serão indiferentes aos nosso destino coletivo", responde Marcelo, que vê neste momento de crescimento de populismos na Europa e no mundo a altura ideal para que se valorize a casa da Democracia que é o Parlamento.
Para Rebelo de Sousa, faz sentido celebrar Abril no Parlamento "para sublinhar que a Democracia tem uma casa em que se entrechocam as mais variadas visões da vida e da sociedade, e que nem mesmo o tom áspero dessas discussões pode servir de pretexto para questionar a riqueza da diversidade democrática" e "para reforçar que é, precisamente, porque entre nós há tanta diversidade e tão vigorosos combates políticos que o nosso sistema de partidos é dos mais estáveis na Europa, não deixando espaço a riscos anti-sistémicos conhecidos noutras paragens".
Os heróis são os portugueses, diz Marcelo
Mas mais do que celebrar os heróis da Revolução que ficaram com os nomes impressos na História, Marcelo quis dedicar o dia à luta pela Democracia que é feita por todos os portugueses, todos os dias, na forma como se envolvem na sociedade, na política e nas diversas formas de associação.
"Sim, porque não podemos olvidar que, se há heróis da nossa Democracia, para além dos que a prepararam e no 25 de Abril lhe abriram caminhos de futuro, esses heróis são os portugueses", vincou Marcelo Rebelo de Sousa, que quis saudar as conquistas dos portugueses.
"É dos portugueses, todos eles, o mérito das primeiras vitórias que fomos tendo, nos últimos anos, nas nossas Finanças, na nossa economia, na nossa sociedade", sublinhou o Presidente, que acredita que "é dos portugueses, todos eles, o papel decisivo de sobretudo criar um futuro melhor".
"Os portugueses, ao sedimentarem a Democracia, o fizeram e o fazem a pensarem na Pátria, como patriotas. Patriotas, digo bem. E não tenhamos medo das palavras e do que elas encerram", declarou o Presidente, que não hesita em opor o patriotismo aos nacionalismos que crescem no mundo.
"Um nacionalismo patriótico e de vocação universal, não um nacionalismo egocêntrico, agarrado a um pretenso passado recriado, porque não real e insuscetível de enfrentar o futuro", defendeu Marcelo, recordando que o risco está nas falhas de um sistema que se afasta dos cidadãos.
"Os chamados populismos alimentam-se das deficiências, lentidões, incompetências e irresponsabilidades do poder político. Ou da sua confusão ou compadrio com o poder económico e social", frisou.
O elogio do poder local
Em ano de autárquicas, o Presidente da República quis também deixar uma mensagem especial para os autarcas e trabalhadores do poder local, que considera serem "um bastião da nossa Democracia".
"Porque viveram e vivem, sol a sol, próximos das pessoas. Sabem os seus nomes, conhecem as suas queixas, não governam papéis, lidam com vidas concretas", explicou o Presidente, que considera os autarcas como um elemento essencial do sistema democrático.
"Já disse e repito, o poder local foi e é um fusível de segurança singular da nossa Democracia", afirmou.
O aviso ao Governo
Num discurso com menos recados políticos internos do que o do ano passado, Marcelo Rebelo de Sousa voltou a uma mensagem que tem sido recorrente desde que chegou a Belém e que deve continuar: o do sublinhar da importância de pôr o país a crescer mais.
"Os dois anos e meio que faltam para o termo da legislatura parlamentar terão de ser de maior criação de riqueza e melhor distribuição", avisou Marcelo.
"Governo, seus apoiantes e oposições, que legitimamente aspiram a voltar a governar, estarão, por certo, atentos a este imperativo, na multiplicidade enriquecedora das suas opções", acredita o Presidente, que deixou apenas um pedido de mais "reformas" nas entrelinhas do que disse.
"Mas se Portugal tem de fazer mais e melhor, para sermos justos havemos de admitir que somos uma Pátria em paz, com apreciável segurança, sem racismos e xenofobias de tomo, aceitando diferenças religiosas e culturais como poucos, com rede de instituições sociais devotada, poder local incansável e sistema político flexível e nessa medida, mesmo se carecido de reformas, mais sustentável do que muitos outros nossos parceiros europeus", afirmou o Presidente, que acha que é nessa receita que está a razão de o país ter "resistido à nova vaga dita populista que percorre esse mundo fora".
"Com quase nove séculos de História, não trocamos o certo pelo incerto. Não sacrificamos uma Democracia, ainda que imperfeita, seduzidos por cantos de sereia de amanhãs ridentes, em que do caos nascerá o paraíso", acredita Marcelo