A maioria dos trabalhadores da Autoeuropa (63%) voltaram a chumbar o pré-acordo para os novos horários de trabalho assinado entre a comissão de trabalhadores (CT) e a administração da fábrica de Palmela. O pré–acordo, rejeitado por mais de três mil colaboradores, previa que os trabalhadores tivessem de trabalhar aos sábados e também a laboração contínua em três turnos diários depois de agosto de 2018.
Para Arménio Carlos, “depois daquela decisão, com uma percentagem tão significativa de oposição dos trabalhadores ao pré-acordo, só resta uma coisa a fazer à administração, que é chamar a comissão de trabalhadores e os sindicatos e irem ao encontro das suas reivindicações”, revela ao i.
O líder da CGTP admite ainda que a Autoeuropa “pode negociar com quem quiser, mas a questão de fundo é que, independentemente de só negociar com a CT, não pode deixar de ouvir a opinião dos sindicatos, neste caso concreto, do SITE Sul”.
Ao que o i apurou junto de várias fontes, o SITE Sul, sindicato afeto à CGTP que foi responsável pela convocação da greve em agosto passado e que tem assento na CT através de elementos, “incendiou” um possível entendimento entre trabalhadores e empresa. De acordo com as mesmas fontes, a estrutura sindical está a pressionar a administração da fábrica de Palmela a negociar com os sindicatos em vez de o fazer com a CT. A Autoeuropa tem afirmado várias vezes que só negoceia com as comissões de trabalhadores, considerando esta política como uma prática habitual para manter a paz social. “O sindicato está a dar um sinal claro à administração. Já houve dois pré-acordos assinados com comissões de trabalhadores distintas e os dois foram recusados”, revela uma das fontes.
De acordo com a referida fonte, houve uma indicação do PCP para o sindicato ser menos ativo nas reações em relação ao pré-acordo, mas a estrutura sindical optou por ignorar essa indicação “para cavalgar numa agenda própria”.
A verdade é que, nas vésperas da realização do referendo, o SITE SUL afirmava que as negociações na Autoeuropa não deviam ser encerradas e deviam ser contempladas questões como a “salvaguarda de que o futuro regime de horário de trabalho, a implementar após as férias, seja de adesão individual, respeitando assim a vontade de cada trabalhador, a retribuição de todo o trabalho extraordinário em conformidade com os valores atualmente praticados e que a laboração contínua deve ser discutida fora do atual processo”.
Antigos dirigentes apontam dedo
A verdade é que já não é a primeira vez que surgem estas acusações. O ex-coordenador da CT, Fernando Sequeira – que se demitiu em agosto depois de o pré-acordo ter sido chumbado –, chegou a acusar o SITE Sul de estar “a preparar ‘assalto’ à comissão de trabalhadores da Autoeuropa”. O responsável chamou ainda a atenção para que, legalmente, quem define os horários dos trabalhadores são as empresas. “O parecer dos representantes dos trabalhadores não é vinculativo e, por isso, a comissão tem optado pela negociação”, salientou em agosto passado.
Também nessa altura, António Chora, o líder histórico da CT da fábrica de Palmela, não poupou críticas ao SITE Sul, falando em “assalto ao castelo”. De acordo com Chora, a estrutura sindical “montou-se em cima de quatro ou cinco populistas. É lamentável, porque é um sindicato com história”, acrescentou.
Futuro em risco?
Para já, a administração da Autoeuropa diz apenas que “lamenta o resultado do referendo, estamos a analisar o seu impacto e oportunamente comunicaremos os próximos passos”. Já a CT garante que “pretende reiniciar o processo negocial com o objetivo de alcançar um novo entendimento”. Ainda assim, a entidade liderada por Fernando Gonçalves volta a garantir que as “condições estabelecidas, ao contrário do que alguns pretenderam fazer crer, representavam uma melhoria para os trabalhadores em relação ao que já anteriormente tinha sido proposto e igualmente rejeitado”.
A verdade é que este impasse voltou a fazer soar campainhas em torno do futuro da fábrica de Palmela. O Sindicato Nacional da Indústria e da Energia (SINDEL), afeto à UGT, já veio admitir que está “muito preocupado” com a rejeição deste segundo pré-acordo.
Também o ministro do Trabalho revelou que a atual situação na Autoeuropa constitui um sério risco, daí ter apelado a uma rápida convergência entre administração e trabalhadores, porque “o tempo corre contra” o futuro da empresa.
“Estamos numa situação preocupante, já que duas comissões de trabalhadores assinaram nos últimos meses, em momentos diferentes mas próximos, dois pré-acordos com a administração da empresa que viabilizam o crescimento da produção necessária para assegurar que a Autoeuropa, por si só, dá resposta às necessidades do novo modelo que ali nasceu (o T-Roc]”, declarou Vieira da Silva.
Recorde-se que o acordo previa, numa primeira fase – de fevereiro a julho – a aplicação de um modelo transitório para permitir a adaptação ao modelo de laboração contínua. Já na segunda fase, a aplicar após férias, a fábrica iria funcionar em modo contínuo.