A pouco mais de dois meses das eleições europeias, Almeida Henriques deixa um aviso a Rui Rio. «Só há um resultado aceitável: ganhar as eleições». Em entrevista ao SOL, um dos principais críticos do presidente do PSD diz que, para já, o partido está «unido» e «mobilizado» para o combate eleitoral. Mas Almeida Henriques não deixa de frisar que «as pessoas têm uma oportunidade na vida e quando não a aproveitam, devem seguir o seu caminho». Oportunidade esta que foi dada pelo Conselho Nacional, de 17 de janeiro, a Rui Rio. Além disso, o autarca de Viseu e ex-governante de Passos Coelho, entende que o PSD tem de clarificar com quem vai governar se não conseguir maioria absoluta.
O partido ficou unido depois do Conselho Nacional?
O Conselho Nacional teve pelo menos um mérito, que foi agitar o partido e mostrar que, no fundo, as coisas não estavam a correr da melhor maneira. Espero que tenha tido o efeito de espevitar e levar a que o partido seja de facto uma alternativa ao atual Governo do PS. Espero que Rui Rio aproveite esta oportunidade. Tem a obrigação de ganhar as próximas eleições legislativas.
Só as legislativas?
E as europeias. Neste momento, Rui Rio tem todas as condições criadas. Não só porque tem o partido estabilizado, unido e mobilizado para as próximas eleições , mas porque, por outro lado, o Governo também está a facilitar a vida a Rui Rio. Há toda esta contestação social que tem ocorrido nos vários setores, mais os indicadores de algumas nuvens negras no horizonte que provam que não se fizeram as reformas estruturais que deviam ter sido feitas. Rui Rio tem todas as condições e não tem nenhuma desculpa para falhar o objetivo de ganhar as eleições.
E se falhar?
Se falhar, o partido terá de encontrar outras soluções. Não ganhando deve tirar as suas ilações. As pessoas têm uma oportunidade na vida e quando não a aproveitam, devem seguir o seu caminho.
Há algum outro resultado aceitável para o PSD, que não seja ganhar as eleições?
Só há um resultado aceitável: ganhar as eleições. Tudo o que não seja ganhar as eleições, ainda para mais nesta conjuntura, significa que o PSD não conseguiu fazer passar a mensagem de que tem um projeto alternativo. O PSD não pode ser um partido que concorra para segundo lugar ou para ser a muleta de um partido. Um dos virtuosismos do nosso sistema democrático é que há dois partidos, o PS e o PSD, que podem fazer acordos em determinados momentos, mas têm de ser sempre alternativas. Até para que os cidadãos saibam que podem optar por um ou por outro.
As europeias são prova de vida de Rui Rio à frente do PSD?
São as primárias das legislativas. É fundamental que o PSD as ganhe para preparar o resultado nas legislativas.
Se Rio não ganhar as europeias deve tirar já as ilações? Ou deve apresentar-se às legislativas?
Este ciclo tem três eleições e deve ser cumprido. Foi este o mandato do Conselho Nacional.
Teria feito diferença no resultado final do Conselho Nacional se Luís Montenegro tivesse falado?
Acredito nisso e lutei, aliás, por isso. O princípio do contraditório não foi honrado dentro do Conselho Nacional. Sendo Luís Montenegro a pessoa que induziu a que este Conselho Nacional se tivesse realizado, tinha feito a diferença ter tido espaço para explicar as suas ideias.
Luís Montenegro seria hoje o presidente do PSD se tivesse falado?
O resultado podia até ser o mesmo. Mas para a vivência interna do partido teria sido mais útil se Montenegro tivesse estado presente. Assim como teria sido mais útil que a questão do voto secreto tivesse sido assumida desde logo. Os estatutos são muito claros e escusava-se de se ter gerado toda aquela confusão. E, na verdade, acabou por se escrever direito por linhas tortas.
Montenegro tem condições para voltar a tentar ser uma alternativa no PSD nos próximos tempos, ou não?
Neste momento, prefiro não me pronunciar sobre isso. Prefiro pensar. O PSD tem um presidente eleito, que vai a votos, vamos cerrar fileiras em torno dele – se atingirmos os objetivos, encantados da vida. Se não, falaremos aí de futuro.
Além de Montenegro, que outras alternativas vê no PSD?
Há vários quadros no partido com qualidades para poderem liderar. Não escondo a enorme simpatia que tenho por Luís Montenegro, aliás, dei a cara por ele durante o Conselho Nacional. E continuo a achar que é a pessoa mais bem preparada para assumir a liderança e para promover uma forte unidade dentro do partido. Mas penso que, neste momento, essa questão não se coloca. Temos de pensar nisso depois das eleições.
E Carlos Moedas pode ser alternativa?
É um dos grandes quadros e o partido não pode deixar de contar com ele.
Santana Lopes lançou o desafio de se fazer uma frente unida de direita pré-eleitoral. Rui Rio já respondeu e não se mostrou disponível. Concorda com esta posição?
O PSD tem de ir a votos sozinho. Cada um dos partidos do centro direita tem de ir a votos sozinho para mostrar o que vale. Mas tem de se pôr sempre em cima da mesa a possibilidade de um entendimento de um bloco mais à direita como alternativa a esta geringonça que nos tem governado. Mas esse é um assunto para se discutir depois das eleições, nunca antes. Obviamente que é importante que os eleitores também saibam, à partida, com o que podem contar. Desta vez, o PS tem de assumir que, se não ganhar com maioria absoluta, manterá uma lógica de aliança à esquerda. E o PSD também que diga que, se não tiver maioria absoluta, com quem vai governar. Para que não aconteça o que aconteceu há três anos. O PSD ganhou as eleições e, sem que tenha sido discutido em campanha eleitoral, surge a geringonça, que não foi uma opção colocada aos eleitores.
Como olha para o Aliança? Acha que pode vir a ter força e roubar votos ao PSD?
Preferia que Pedro Santana Lopes não tivesse saído do PSD. E que Rui Rio tivesse feito um esforço para que Santana Lopes se tivesse mantido no partido. Santana Lopes criou o Aliança mas não deixou de ser um social-democrata. Teria sido mais útil se, dentro do PSD, tivesse havido uma abertura e um diálogo que criassem as condições para que o Aliança não tivesse sido criado.
Mas acha que vai ser prejudicial para o PSD em termos de votos?
O futuro o dirá, mas a verdade é que à direita, hoje, sobretudo com o Aliança e com outros movimentos que estão a surgir, há um espetro novo. Enquanto que à esquerda há uma estabilidade, à direita há realidades novas que só agora as eleições europeias e depois as legislativas nos dirão quanto é que cada um destes partidos valem. Podem ser partidos que se consolidem, que será negativo para o PSD e para o seu resultado, como podem ser flops.
Têm vindo a público vários casos de ligações familiares entre funcionários de autarquias. Como vê estes casos?
Não é só o autarca. Temos um Governo em que os laços familiares são cada vez maiores. E entre as várias estruturas do Estado Central também acontece. Nas minhas equipas nunca colocaria nenhum filho ou nenhum familiar direto ou indireto porque temos de separar águas.
Estes casos fazem com que o papel do autarca caia em descrédito?
Todos os casos que possam pôr em causa a credibilidade do titular A ou B acabam por afetar a classe política como um todo. Porque são todos medidos pela mesma bitola. E isso é negativo para a democracia. Mas também acho que, de reforma em reforma, se tem dado sempre, cada vez mais, um tiro no pé. Cada vez mais há limitações. E qualquer dia vai ser impossível recrutar pessoas com qualidade para a atividade pública e política. É preciso encontrar um equilíbrio.
Como se consegue isso?
Do ponto de vista do comportamento ético, há que ter regras muito precisas com a separação da vida privada com a vida pública. Mas, ao mesmo tempo, deve haver alguma abertura para revisitar o estatuto do eleito, que tem de ser valorizado.