“Esses senhores que falam de liberdade querem impor um pensamento único”

Artur Mesquita Guimarães não deixou que dois dos seus filhos frequentassem as aulas de Cidadania e Desenvolvimento. O Ministério da Educação chumbou os alunos e o pai meteu o ministério em Tribunal. O tribunal deu-lhe razão. Ao SOL, diz que são os pais que devem fazer esses ensinamentos em casa.

Por que não deixou que os seus filhos frequentassem a disciplina de Educação e Cidadania? O que o choca mais nesta disciplina?

A disciplina incide naquilo que são as competências educativas que tocam aos pais. Há aqui uma sobreposição das disciplinas sobre aquilo que são os conteúdos que tocam aos pais. E porquê? Porque formam a consciência dos miúdos. É claro que não está aqui em causa a igualdade de género ou o respeito pelos animais, por exemplo. Com certeza que isso não estará mais no que é dito na disciplina do que estará no que é dito em minha casa, mas isso seguramente. Até porque somos católicos e se estivermos a falar de um ambiente que é um ponto de referência na educação dos nossos filhos… Não está em causa isso. O que está em causa é, de facto, uma sobreposição e nós, no fundo, o que dissemos à escola – a carta que apresentámos à escola que deu origem a todo este processo – é que esta disciplina incide sobre as temáticas que nos compete a nós, pais, cuidar delas, pelo que está expresso na Constituição da República Portuguesa e nas leis da República e até nos Direitos Humanos, por exemplo. Essa é que é a questão de fundo. E nessa carta, o que nós dizemos é que não autorizamos essa participação por questões sexuais, igualdade de género, entre outras, que são imbuídas de ideologia – e nós temos a nossa – mas também de outros conteúdos como a solidariedade, por exemplo. Apesar de tudo diz lá que se nos derem a conhecer o conteúdo específico para a aula concreta do que é que vai ser abordado, à partida os nossos filhos não estarão autorizados a participar mas também o poderão fazer se nós entendermos. O problema é que isto nunca foi entendido pela escola numa fase inicial. A escola não conhece a Constituição, a escola não conhece as leis da República, a escola não conhece os Direitos Humanos e a única coisa que conhece é o estatuto do aluno que está no fim. E a escola enviesou a conversa para o lado do estatuto do aluno – também é curioso porque depois ficámos a saber que os pais no estatuto do aluno só são considerados como pessoas não gratas – onde não está refletido este sentido da constituição, das leis da República e dos Direitos Humanos, não estão lá espelhados. Quando entregámos a primeira carta na escola demos conta disso ao senhor ministro da Educação, ao senhor primeiro-ministro e até ao Presidente da República. A escola e o Ministério manifestamente dão contas de uma obsessão em querer a todo o custo impôr a participação dos alunos na disciplina mesmo que seja contra a vontade dos pais e enviesou o seu fundamento numa lei, num estatuto do aluno que é uma legislação meramente normativa e que, de facto, tem vindo a mostrar que não está completa.

Se houvesse outra disciplina com a qual não concordasse, admitia que os seus filhos frequentassem essa disciplina?

Não ando aqui atrás de questões para arranjar problemas. Para já porque não tenho tempo, trabalho para pôr a mesa em casa aos meus filhos e para as pessoas sobre as quais tenho responsabilidades nessa matéria que são os trabalhadores da empresa da qual sou gerente e sócio. Não está em cima da mesa qualquer cenário desse tipo. Fui confrontado com uma circunstância e devido ao respeito pela minha dignidade, pela liberdade, pela dignidade dos meus filhos, pela liberdade dos meus filhos, e pelo respeito por aquilo que a constituição e as leis do Estado esperam que um pai corresponda, eu correspondi. Mas não ando a criar problemas nem cenários hipotéticos para justificar a posição que tomei agora.

Durante este processo qual foi a opinião dos seus filhos? Alguma vez lhe pediram para frequentar a disciplina?

Não. Nem nunca nos pediram para deixar de ir às aulas de Português ou de Educação Visual, por exemplo. É um cenário que não se coloca. O que tem acontecido é o contrário. Eles encaram isto com total naturalidade, é uma questão que tem a ver com os pais e não propriamente com a decisão deles. Nunca se colocou essa questão. O que tem acontecido é engraçado: no fim de uma aula de Cidadania em que os nosso filhos não participaram – foram para a biblioteca estudar ou ficaram a ler um livro, enfim, ocuparam o tempo da forma que lhes foi mais útil – os colegas disseram-lhes: ‘Epá, nem sabes o que é que aconteceu, tu é que tens sorte em que o teu pai não te deixe vir à aula’. E os meus filhos respondem muito naturalmente e dizem para eles dizerem aos pais para meterem a carta também. E as crianças dizem que nessas coisas nem têm coragem para falar com os pais. Isto já aconteceu. Estou a constatar um facto, não estou a discutir a matéria que foi abordada e nós também sabemos que os miúdos às vezes até só pela vontade de não estar na aula podem vir com este tipo de coisas. Eu não sei o que lá se passou. Não sei se estiveram a falar de solidariedade, se estiveram a falar de meio ambiente ou tecnologia… Esses comentários podem ser apenas comentários de miúdos que nos dizem pouco mas também nos podem dizer muito. Os meus filhos nunca me pediram para ir à aula nem nunca nos questionaram porquê que não vão. Eles têm noção do que está em causa até porque, no que diz respeito ao processo dos nossos filhos, eles sabem tudo de trás. Desde o ano letivo de 2009/2010, concretamente, que há uma lei que comporta aulas de educação sexual nas escolas. Não é bem no contexto presente, havia contornos mais flexíveis mas desde aí que os nossos filhos nunca foram às aulas de Educação Sexual. Ao dizer que eles nunca foram às aulas de Educação Sexual não digo que eles não têm educação sexual. Claro que têm. Nós somos católicos. Naturalmente que falamos de sexualidade e particularmente a vivência da sexualidade. Quando educamos para a vivência da sexualidade, naturalmente que temos que falar dos diversos panoramas desta questão. Não há tabus em nossa casa e se assim fosse nem podíamos educar. As realidades têm de ser conhecidas. Quando falamos de adultério, adultério é adultério, quando falamos de homossexualidade, falamos de homossexualidade, não tem problema nenhum. Os meus filhos não vivem numa redoma. Provavelmente viverão numa redoma – mas não quero aqui insinuar nada contra ninguém – outros que sob uma capa de uma pseudo liberdade provavelmente escondem realidades que aos nossos filhos não são escondidas seguramente. Eles são educados para viverem em sociedade com o máximo respeito pelos outros e pelo meio em que vivem. Somos tão católicos que cumprimos o mandamento ‘amar aos outros como a nós mesmos’. Essa é a linha de orientação de referência que temos para a educação dos nossos filhos. 

 

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