Está dado o tiro de partida para as legislativas. Bastaram dois dias de debates para o caldo entornar entre o PSD e o PS (que ainda nem se defrontaram). O tema foi um diz-que-disse de Rui Rio: a prisão perpétua. O PS aproveitou a ambiguidade das palavras do líder do PSD sobre o assunto para fazer combate político. Em poucas horas o PSD veio a público rejeitar a interpretação que delas fizeram os socialistas, notando que “em política não pode valer tudo” e que António Costa tentou “enganar os portugueses”, colocando na boca de Rio o que este “nunca disse”.
Tudo começou no debate, transmitido na segunda-feira à noite, entre André Ventura e Rui Rio. Quando o assunto da prisão perpétua, uma das imagens de marca do Chega, veio à baila Rio ingressou numa explanação dos vários regimes que existem, demarcando-se daqueles em que alguém pode ser preso até ao fim da vida. “Se estamos a falar na prisão perpétua ponto final paragrafo, isso nós somos contra”, afirmou, abrindo espaço para a interpretação de não ser contra os regimes que preveem uma prisão perpétua “mitigada” ao fim de “12-15 anos”.
Desta troca de palavras, José Luís Carneiro, secretário-geral adjunto do PS, interpretou que Rio estava a “negociar em direto e ao vivo” uma cedência na “proibição da prisão perpétua” com Ventura, acusando-o de populismo. “Rui Rio cedeu ao populismo e atravessou uma fronteira daquilo que é aceitável, em face dos nossos valores constitucionais (…). Esteve hoje [segunda-feira] a negociar em directo e ao vivo com o doutor André Ventura e admitiu ceder numa matéria tão sensível como a prisão perpétua”, disse à Lusa ainda na noite de debate.
Passou a noite, surgiu o dia. José Silvano, secretário-geral do PSD, respondeu a José Luís Carneiro, afirmando que o PS está desesperado e que “vê fantasmas com ligações à extrema-direita para que o eleitorado do centro não vote em Rui Rio”.
Perto da hora de almoço, António Costa entra na discussão e a parada – que até agora tinha ficado pelos números dois – sobe de tom. O secretário-geral do PS publicou um vídeo em que visava Rio por ter admitido, “por conveniência ou necessidade eleitoral”, equacionar “as diferentes modalidades para restabelecer a pena de prisão perpétua” em Portugal. Vestindo a farda “humanista” – que é “tradição” portuguesa e está na matriz do o nosso código penal –, Costa notou não podermos ceder, “em circunstância alguma”, nos “princípios ou nos valores”, sendo que “o combate ao populismo exige linhas vermelhas inultrapassáveis” e que “os valores do humanismo que inspiram a nossa sociedade não são transacionáveis”. E rematou: “Um político responsável tem sempre os seus princípios e os nossos valores no centro”. Mas o ping-pong não ficou por aqui.
Passadas duas horas da publicação do vídeo de Costa, a Secretaria-Geral do PSD fez chegar às redações uma declaração que “relembrava” que “em política não pode valer tudo”, pedindo ao “PS (e à empresa de marketing que o inspira), para que se mantenha a serenidade e se faça uma campanha séria, esclarecedora e em torno das ideias que cada um defende para o país”. Considerou, ainda, a reação de António Costa “inédita”, acusando-o de “deturpar” as afirmações do presidente do PSD “numa clara tentativa de enganar os portugueses, colocando na sua boca o que nunca disse”. Os sociais-democratas criticaram, também, a declaração de José Luís Carneiro, considerando-a “enganadora”. A minuta deixa ainda “um sério aviso à continuação deste tipo de prática”, observando que “não contribui em nada para a dignificação do debate político” e que pode “levar a uma campanha de informação”.
Por fim, não poderia haver festa sem que Rui Rio – o próprio – se lhe juntasse. Fê-lo através do Twitter, partilhando o vídeo de Costa e comentando, em tom irónico que se o último “continuar a deturpar desta forma” o que ele diz, “mais uma semana” e estará a acusá-lo “de defender que as mulheres devem andar de burca”. O debate entre os dois candidatos será na quinta-feira 13 de janeiro, às 21h00, em simultâneo na RTP1, SIC e TVI.