Notícia atualizada às 19h45
Depois de o primeiro-ministro, António Costa, arrancar com o primeiro dia do debate sobre o Orçamento do Estado (OE) para 2022, o líder do Executivo deu a palavra aos partidos para discutir o documento que foi aprovado pelos portugueses "de forma absolutamente inequívoca”, segundo Costa.
PSD, pela voz de Paulo Mota Pinto, mira para as questões do presente com afirmações e fantasmas do passado
O primeiro partido ao qual foi concedida a palavra foi o PSD, que, sem o ainda líder Rui Rio na bancada parlamentar – ausente pela morte de um parente -, começou por dizer na voz de Paulo Mota Pinto, líder parlamentar, que o OE é “o mesmo” que o PS negociou com a “extrema-esquerda”, embora o contexto mundial tenha sido alterado.
Fez questão de realçar que o aumento da inflação fará com que os funcionários públicos perderão, até ao final do ano, meio salário, visto que as remunerações não irão seguir este aumento. “É na realidade um imposto escondido e muito regressivo”.
Paulo Mota Pinto recordou ainda que o próprio ministro das Finanças, Fernando Medina, admitiu que os portugueses vão perder o poder de compra e por isso perguntou a Costa se reconhece o mesmo. O líder parlamentar do PSD sublinhou também que o país “nunca com nos mandatos” do PS de Costa conseguiu crescer, ao contrário dos países do leste europeu que aumentaram o seu PIB, por exemplo.
Para Mota Pinto, o primeiro-ministro tem condições “únicas” reunidas para potenciar o crescimento da economia. “Tem condições únicas que ninguém teve em democracia: maioria absoluta, Presidente da República e partido da oposição dialogantes”. “Vai desperdiçar esta oportunidade única por falta de coragem?”, questionou o social-democrata.
Voltando ao passado, Mota Pinto lembrou a promessa de Costa de aumentar o salário mínimo para 900 euros em 2026 e deixou a pergunta ao líder do Executivo: tendo em conta a inflação, será este valor atualizado para 950 ou até mesmo para “quase mil euros” ou “tudo não passou de um logro?”, atirou o líder parlamentar do PSD.
Ainda com vontade de remexer no passado, Mota Pinto referiu-se aos Governos de José Sócrates – ex-primeiro-ministro que foi alvo recentemente de criticas por António Costa, que disse que Sócrates “aldrabou” o PS.
Para terminar a sua intervenção, Mota Pinto perguntou a Costa como é que o Governo “vai responder ao repto” de Marcelo para reforçar o orçamento da Defesa.
António Costa respondeu, começando por dizer que se diz “perplexo” com o que o Mota Pinto apontou sobre o rendimento dos portugueses, voltando à notar que o PSD esteve contra o aumento do salário mínimo nacional.
Com esta afirmação, a bancada do PSD expressou-se ruidosamente – uma vez que durante a sua campanhia eleitoral, o PSD já se mostrava contra a subida – e Costa respondeu com: "Eu sei que é chato, mas é a vida".
Chega insiste com Costa, tanto na defesa como na economia
André Ventura insiste com António Costa para perceber se este vai admitir se vai haver perda de poder de compra este ano. “Vai ou não haver perda de poder de compra? Diga aos portugueses se sim ou não”. O líder do Chega disse que essa perda vai acontecer e está “maquilhada pela maior máquina de propaganda desde o 25 de Abril”.
"E isso tem uma palavra. Quando há um orçamento que aumenta em alguns casos os impostos e noutros reduz despesa mas tem como consequência a perda de poder de compra dos portugueses, tem uma palavra quer goste, quer não, 'austeridade' e essa palavra que o senhor primeiro-ministro tem de reconhecer no orçamento", sublinhou.
No seu discurso, Ventura também abordou o enquadramento fiscal, no qual o Governo promete uma melhoria, principalmente para os jovens, através do IRS Jovem e de dois escalões novos no IRS. “Leve lá o enquadramento fiscal, os funcionários públicos perderam 12% de poder de compra nos últimos seis anos. Não há um português que acredite nisso”, apontou.
Ao recordar os altos valores da dívida pública portuguesa, “a 12.ª maior do mundo, o que devia envergonhar qualquer Governo”, Ventura mencionou o nome de José Sócrates, desta vez, para falar sobre o pedido de ajuda externa, pedindo a Costa que “leve a comparação muito a sério”.
Quanto ao orçamento para a Defesa, o líder do Chega fez questão de saber se Governo vai disponibilizar mais dinheiro. “Vai ou não o PS na especialidade aumentar os valores previstos para a Defesa? A explicação que ouvimos do Governo é que vai ter mais dinheiro do que o executado. Vai ou não haver uma verba maior?”.
Costa respondeu a Ventura. “Deste Orçamento não resulta maior austeridade”, afirmou, ao acusar o líder do Chega de fazer “pergunta capciosa” sobre o poder de compra dos portugueses. “O OE não decreta a inflação. Tem, sim, um conjunto de medidas que combate a inflação”.
Quanto à defesa, o líder do Executivo disse que o Governo vai continuar a reforçar o orçamento, ao frisar que o investimento português em percentagem do PIB é mais alto do que em países como Itália e Alemanha, entre outros.
Iniciativa Liberal prefere "serviço de streaming" e acusa mais uma vez o Governo de não conseguir fazer crescer o país
Depois de Costa atacar a direita a dizer que “tem uma nova cassete” – a do crescimento -, João Cotrim Figueiredo, da Iniciativa Liberal, ironizou a dizer que prefere um “serviço de streaming” a uma cassete, de modo a reforçar a necessidade de olhar para o futuro.
O líder da Iniciativa Liberal acusou mais uma vez o Governo de não ter a capacidade de colocar o país a crescer, argumentando que "já em 2024 as taxas de crescimento da Roménia e da Letónia são muitíssimo superiores à portuguesa".
"Atrevo-me a dizer com elevado grau de certeza que até ao final do seu mandato pelo menos estes dois países nos vão ultrapassar também", vincou Cotrim Figueiredo.
Quanto ao OE, o líder liberal perguntou se é em 2023 que o PS vai “regressar à sua matriz menos marxista?”, dado que este Orçamento foi criado ainda com o apoio do PCP e do Bloco de Esquerda.
"Os portugueses entenderam reforçar a posição do PS, reduzir as bancadas da extrema-esquerda a um terço do que eram e o orçamento fica o mesmo. Portanto, os portugueses votam diferente, os senhores fazem igual", rematou.
E ainda sobre a ligação do PS com o PCP, Cotrim Figueiredo perguntou a Costa se hoje manteria a aliança com o partido comunista, mesmo com a sua posição mais controversa sobre a invasão da Ucrânia.
António Costa respondeu ao vincar apenas as diferenças entre os dois partidos em matéria de política externa e de Defesa.
"Como é sabido, o entendimento que houve com o PCP, e que o PCP entendeu não prosseguir, sempre deixou muito clara a identidade de cada um. E isso permitiu entendermo-nos sobre o que tínhamos entendimento possível e a divergência sobre aquilo que sempre nos tinha distinguido, designadamente as matérias de política externa e em política de defesa", afirmou o líder do Governo.
Já quanto ao crescimento do país, Costa apontou factos que podem, segundo o primeiro-ministro, provar que o país está a "crescer acima da média europeia" e "não a empobrecer".
"O senhor deputado quer passar sempre a ideia de que o país empobreceu, mas verdade é que o PIB per capita cresceu mais de 20% em termos nominais entre 2015 e 2019. E, se for mesmo incluir os anos duros que vivemos com a covid-19, em 2021 o PIB per capita ainda era mais de 8% superior àquilo que era anteriormente", disse Costa.
PCP diz que OE não está adaptado aos atuais problemas
Jerónimo de Sousa, líder do PCP, considerou o OE incapaz de responder aos atuais problemas, uma vez que "todos os problemas de agudizaram" desde que o Governo apresentou a primeira proposta de Orçamento, em outubro de 2021.
Para Jerónimo de Sousa, o Governo deve proceder ao “aumento geral dos salários, de todos os salários, no setor público e no setor privado”, sendo que hoje é ainda “mais necessário para fazer face ao aumento do custo de vida”.
Nas palavras do líder do PCP, a proposta de OE2022 também "não avança com medidas de controlo de fixação de preços na energia, nos combustíveis e noutros bens essenciais, não assume a criação de uma rede pública de creches, nem procura garantir transporte público em todo o território, avançando para a sua gratuidade".
Nomeadamente, sobre o aumento extraordinário das pensões, os "dez euros já foram, entretanto, comidos pelo aumento dos preços", apontou Jerónimo de Sousa.
Na sua resposta, António Costa disse que respeita a decisão do PCP "de manter o voto contra", no entanto, não aceitou os argumentos de Jerónimo, “porque não correspondem à realidade que está neste orçamento”.
Costa apontou que há mais medidas nesta proposta que não constavam naquela que foi rejeitada há seis meses pelo PCP, como o aumento extraordinário das pensões e a gratuitidade das creches.
Quando à redução dos preços da energia, o primeiro-ministro remeteu para a medida que anunciou na sua intervenção com qual a abriu o primeiro dia de debate: a nova descida do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) permitirá diminuir a carga fiscal em 20 cêntimos por litro, resultando assim numa redução de 62% do aumento do preço da gasolina e 42% do gasóleo.
Bloco de Esquerda critica à lupa "quebra real de salários e pensões"
Tal como o PCP, a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, criticou o Governo de propor uma "quebra real de salários e pensões", ao sublinhar, em resposta a Costa, que "qualquer aumento de salários seria uma ilusão" consumida pela inflação.
"Na verdade, hoje, os seus argumentos que lhe ouvi distinguem-se muito pouco dos argumentos de sempre da direita. Na campanha prometeu uma melhoria de rendimentos, o primeiro Orçamento do Estado desta maioria absoluta garante quebra real de salários e pensões", frisou Catarina Martins.
Costa respondeu ao contrapor: o OE2022 "tem um conjunto significativo de medidas de melhoria do rendimento".
"Neste momento, qualquer aumento de salários seria uma ilusão que seria rapidamente consumida pela inflação que necessariamente iria aumentar por via de mais esse aumento", atirou Catarina Martins.
Ao perguntar ao chefe do executivo socialista se, como próprio Governo reconhece, "os preços não vão baixar e os salários e pensões não são atualizados à inflação", Catarina Martins questionou como é que "se pode concluir outra coisa deste orçamento que não uma opção do governo do Partido Socialista pela quebra permanente e real de salários e pensões em Portugal".
Para justificar a sua tese, a líder do BE apresentou dois exemplos: a de um trabalhador que ganha 1250 euros por mês e um pensionista que terá um aumento extraordinário de 10 euros, acrescentando que "até os mais pobres dos mais pobres terão perda de rendimento com este orçamento".
Costa garantiu que a proposta do Executivo repõe "o princípio da atualização anual dos salários da função publica", o que considerou não ser "coisa pouca".
"O que é que acontecerá no próximo ano? Veremos. Há uma coisa que garantimos: voltará a haver atualização anual de salários. qual o montante? começaremos por negociar com as estruturas sindicais no âmbito da negociação coletiva na administração pública e teremos em conta qual vai ser a evolução efetiva da inflação este ano e qual é a capacidade efetiva do Estado", assinalou o primeiro-ministro.
PAN contente por rever medidas que apresentou no OE, no entanto diz que "muito ficou de fora"
O partido que menos “espezinhou” na proposta socialista foi o PAN que notou que algumas das medidas que apresentou ao PS em especialidade, na negociação do Orçamento passado, foram acolhidas para o novo OE. No entanto, Inês Sousa Real, deputada única do PAN, indicou que “muito ficou de fora” em matéria ambiental.
"Não podemos deixar de nos congratular por olhar para este Orçamento e ver que tem, em alguma medida, a marca do PAN, e por ter acolhido algumas das medidas que propusemos na negociação do Orçamento passado, mas muito ficou de fora", disse Inês Sousa Real.
A deputada do PAN ainda aconselhou Costa "a acertar os ponteiros do relógio no que diz respeito ao relógio climático", mas fez questão de criticar que haja "um corte de 1% no Ministério do Ambiente" face ao Orçamento rejeitado em outubro e "apenas 400 mil euros para a estratégia de mobilidade ciclável".
Também pediu mais medidas para o combate à seca, para conter a expansão do regadio, e ainda para reduzir o preço dos passes sociais tornando-os "tendencialmente gratuitos" e para estender as tarifas sociais da energia a mais famílias.
O primeiro-ministro salientou que a proposta do Governo contém "sete páginas e meia de medidas acordadas com o PAN" e referiu que "foi certamente por isso que a senhora deputada votou favoravelmente" a primeira versão deste Orçamento em outubro do ano passado, no entanto corrigiu-se logo de seguida:"Absteve-se, absteve-se".
"E seguramente na especialidade poderemos ter em conta as propostas que venha a apresentar", sublinhou António Costa.
Livre diz que Governo tem de "subir de nível" ao pedir reuniões técnicas sobre o OE
Rui Tavares, deputado único do Livre, pediu a Costa reuniões técnicas sobre o OE, admitindo medidas faseadas até 2023. Note-se que ainda não é conhecido o seu sentido de voto.
O representante do Livre recordou a posição do líder socialista na campanha eleitoral para as legislativas de 30 de setembro de que "uma maioria absoluta não muda nada na disponibilidade para fazer compromissos".
"Eu já ouvi aqui vários ministros e secretários de Estado a demonstrar abertura para dialogar a este nível, o que registo e muito me alegra, mas agora é preciso subir de nível", vincou Rui Tavares, pedindo para se "passar a uma fase de reuniões e conversações do ponto de vista técnico e de orçamentação".
"Para percebermos quais são os custos, podendo faseá-los para o Orçamento de 2022 e 2023, tirando partido do facto de que neste ano em poucos meses vamos estar a discutir dois orçamentos diferentes", salientou.
Costa respondeu de forma positiva: "Relativamente à questão concreta que coloca, se temos a disponibilidade para uma reunião de trabalho, varias reuniões de trabalho, reuniões técnicas, políticas, claro, com certeza que sim. É só marcar. Portanto, com certeza, toda a disponibilidade".