por Felícia Cabrita e Joana Faustino
Isabel Santos, eurodeputada do PS, aparece de novo envolvida nos apoios à Organização Não Governamental (ONG) que está no centro do Qatargate, o escândalo de corrupção que atingiu o Parlamento Europeu. Segundo o jornal belga Le Soir, a socialista portuguesa ajudou a financiar a Fight Impunity (“combate à impunidade”), organização da qual era membro honorária desde 2021 e que, está aparentemente focada na defesa dos direitos humanos, mas que não passará de uma fachada para ações de lóbi internacional a favor de Doha e de Marrocos, a troco de ‘luvas’.
A Fight Impunity foi criada em 2019 pelo antigo eurodeputado italiano Pier Antonio Panzeri. Este, segundo declarações de Isabel Santos ao i, convidou-a para pertencer ao conselho da organização, como membro honorária, durante uma conversa “muito informal”. A Fight Impunity nunca foi registada, porém, no Registo de Transparência criado pelo Comissão Europeia e onde se encontram outras ONG, como a Oxfam e a Human Rights Whatch, nem apresentou contas ao Estado belga durante os três anos que já leva de existência. Este facto, não foi, contudo, impedimento para que fosse financiada pelo Parlamento Europeu (PE).
Assim que se soube do escândalo associado à Fight Impunity, Isabel Santos afastou-se imediatamente da organização, tendo inclusivamente, dito ao jornal Observador que está “chocada e surpreendida” com o que agora veio a público.
O que na altura não se sabia e que entretanto foi avançado pelo Le Soir, é que tanto Isabel Santos como a belga Marie Arena – ambas eurodeputadas do grupo Socialistas e Democratas (S&D) – apoiaram o financiamento de um projeto-piloto, apresentado por aquela ONG, que dá pelo nome de Observatório para a Impunidade, com 175 mil euros – dos quais 43 750 chegaram mesmo a ser pagos no ano passado.
Isabel Santos afirma, contudo, que o projeto-piloto não foi apresentado pela ONG, mas sim pelo Parlamento Europeu e que “cabe depois à Comissão Europeia” gerir esse projeto. No entanto, o próprio documento de trabalho dos projetos-piloto do Parlamento Europeu, que a própria enviou ao nosso jornal, põe em causa a sua argumentação. Segundo este documento, os projetos desse tipo têm de ser apresentados por membros, comités ou grupos políticos e não pelo próprio Parlamento.
Apesar disto, a eurodeputada insiste: “Quando o Parlamento financia, cabe-lhe a ele checar as instituições”.
“Se alguma vez esse subsídio foi atribuído, essa gestão é feita pela Comissão e não pelo Parlamento”, contrapõe ainda a socialista ao i. “Eu desconhecia que a instituição não estava no registo. Era uma instituição que eu via participar na Comissão de Direitos Humanos, a organizar atividades no PE – e tudo isso me fazia pensar que era uma instituição que estava devidamente escrutinada”, referiu.
No entanto, ao atuar como atuou, propondo um financiamento a uma instituição a que estava ligada, Isabel Santos estava numa situação de conflito de interesses.
Recorde-se que o escândalo começou quando a então vice-presidente do Parlamento Europeu, Eva Kaili, entretanto demitida, foi detida, no dia 9 deste mês, em Bruxelas, no âmbito de uma investigação por crimes de corrupção, relacionada com financiamentos feitos por parte do Qatar e de Marrocos. A grega foi apanhada em flagrante pelas autoridades belgas com malas cheias de dinheiro em casa. Na próxima quinta-feira, vai ser apresentada ao juiz que lidera o caso.
No âmbito desta investigação, foi também detido Pier Antonio Panzeri, antigo responsável do subcomité de Direitos Humanos do Parlamento Europeu e da delegação para as relações com o Norte de África e atual líder da ONG Fight Impunity. Também ele foi detido depois de terem sido encontrados na sua casa 600 mil euros.