A venda da Efacec escapou por um triz à queda do Governo. A alienação da empresa foi concluída à segunda tentativa à Mutares e dias antes de António Costa ter apresentado demissão. É certo que conseguiu chegar à reta final após uma injeção mensal de 20 mil euros por parte da Parpública e em troca as receitas derraparam, assim como as encomendas e, em contrapartida, a dívida e os prejuízos aumentaram.
A injeção de capital por parte do Estado tem sido alvo de críticas com os partidos, nomeadamente os de direita e o Bloco de Esquerda, a acenarem com a necessidade de avançar com uma comissão de inquérito. Em causa está o ‘financiamento’ de 400 milhões para depois o Governo ter vendido por 15 milhões.
Uma operação que não é vista com bons olhos por Luís Mira Amaral. «A Efacec é uma empresa de bens transacionáveis e à partida não se vê qualquer lógica para ter sido intervencionada pelo Governo. No entanto, o Executivo achou que era estratégica porque fazia carregadores para automóveis elétricos e o Governo gosta muito de automóveis elétricos», revela ao Nascer do SOL.
O economista recorda ainda as declarações do ex-ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, que quando nacionalizou afirmou que a empresa seria vendida no mês seguinte ou dois meses depois. «Andaram este tempo todo a perder dinheiro e isso só representa perdas para o contribuinte. Mesmo depois de privatizada não vamos recuperar nem pouco mais ou menos o valor que foi investido».
A importância da Efacec voltou a ser reiterada pelo atual ministro da Economia e com António Costa Silva a referir que é possível recuperar o dinheiro – ou pelo menos parte – investido pelo Estado na Efacec. Apesar de o Governo não ser acionista e de o grupo português ficar a 100% nas mãos da Mutares, está em causa um «mecanismo de partilha de valor» com a empresa alemã. Quer isto dizer que, caso a Efacec venha a distribuir dividendos, o Estado recebe 75%. Caso a empresa seja vendida (mas nunca antes dos próximos três anos), o Estado vai ficar com dois terços dessa possível futura alienação.
Garantia essa que entretanto já foi posta em causa pelo Presidente da República. «Admito que o senhor ministro ache que [o negócio] é bom. Agora é bom em termos do que desejaríamos e sonharíamos para a Efacec num contexto diferente? Eu acho que está aquém daquilo que, ao longo do tempo, pensámos, sonhámos e admitimos que fosse possível para a empresa», referiu Marcelo Rebelo de Sousa.
Raio-x
Mira Amaral admite que essa tem sido a tendência seguida pelo Governo nas várias empresas públicas. Exemplo disso, é o que se verifica na CP e na TAP, mas reconhece que se tratam de empresas com lógicas económicas diferentes e com dimensões distintas. «A CP por maior que seja a dívida não pode desaparecer porque precisamos da empresa para transportar o pessoal. A TAP pode desaparecer ou ser vendida a um estrangeiro que faça o serviço para Portugal, mas ao contrário do que é dito pelo Governo que tem defendido o seu peso nas exportações, o valor acrescentado é baixo, porque se deduzirmos a importação de combustível e dos equipamentos, o valor acrescentado nacional é baixo. No caso da Efacec estamos a falar apenas de uma empresa de bens transacionáveis», salienta.
A Efacec, empresa ligada às áreas de energia, indústria e mobilidade, contava, no final de 2022, com 1.928 trabalhadores. Nesse mesmo ano, apresentou perdas de 52 milhões de euros.
Um cenário diferente tem a TAP e a CP. A primeira, que conta com quase sete mil trabalhadores, foi alvo de uma injeção de 3,2 mil milhões de euros. No final de 2022 apresentou lucros de 65,7 milhões de euros, mas os resultados dispararam nos primeiros nove meses do ano ao apresentar um resultado de 203,5 milhões de euros.
Por sua vez, a CP com 3.750 trabalhadores apresentou, no ano passado, oito milhões de lucros. Trata-se do primeiro resultado positivo da sua história e viu agora a sua dívida de dois mil milhões ser perdoada. Um perdão visto pelo Governo como «indispensável para que a CP tenha capacidade de investir na melhoria, modernização e expansão dos serviços», permitindo ainda o «acesso ao financiamento para a aquisição de material circulante, em condições equiparadas a qualquer outra empresa».
Em marcha está a adjudicação do concurso público para a aquisição de 117 novas automotoras. O presidente da empresa, Pedro Moreira, disse que poderá avançar «entre esta semana e a próxima». Já relativamente à aquisição de 14 comboios de alta velocidade para operar na futura linha Porto – Lisboa, o responsável indicou que o plano de negócios aponta para a necessidade de «pelo menos» 14 unidades. Isto significa que poderá ser acionada uma cláusula de opção de compra nos formatos «seis mais quatro mais quatro» ou «quatro mais quatro mais quatro», até rondar as 30.
TAP: futuro em aberto
Para já, o futuro da TAP está em suspenso devido à queda do Governo e, por isso, tudo pode acontecer. A privatização da empresa não está contemplada no Orçamento do Estado para o próximo ano, isto é, está dependente do Executivo que irá assumir as rédeas do país. No entanto, se Pedro Nuno Santos ganhar as eleições internas do PS e na eventualidade de chegar a primeiro-ministro, o processo pode parar ou a TAP poderá não ser totalmente privatizada. O ex-ministro defendeu que a companhia aérea deveria pertencer maioritariamente ao Governo, uma vez que foi este que a salvou. A ideia de privatização tem avançado desde a saída do ministro, mas enquanto ainda era ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos chegou a dizer: «Foi sempre claro que, num mercado tão fortemente globalizado e competitivo, a TAP não conseguiria sobreviver, a médio prazo, sozinha. A integração da TAP num grupo criaria sinergias importantes e traria resiliência para enfrentar a volatilidade tão característica da aviação. Esta pode ser mesmo a única maneira de assegurar a viabilidade de uma empresa estratégica para o país».
Mira Amaral não hesita: «Se Pedro Nuno Santos ganhar, a TAP fica na gaveta. Se Pedro Nuno Santos chegar a primeiro-ministro – espero que não aconteça mas em teoria o povo é que vai decidir – e se for coerente com a ideologia dele põe Mariana Mortágua como ministra das Finanças».