Longe vão os tempos das reguadas e os quadros de ardósia ou o pó do giz também vão deixando de ser uma realidade. Talvez já mal se use a tão famosa tabuada do Ratinho. Há umas décadas nem todos iam à escola, outros andavam lá poucos anos e, aos dias de hoje, ainda é possível encontrar quem não saiba ler nem escrever. Mas já não são muitos e o ensino evoluiu, tal como os tempos.
Só para se ter uma noção da antiguidade da educação, em Portugal tem cerca de 700 anos mas só há pouco mais de seis décadas é que o ensino primário passou a ser obrigatório. Já o ensino secundário, apenas conseguiu essa obrigatoriedade em 2009. Disciplinas como Área de Projeto já não existem mas deram lugar a outras como Cidadania e Desenvolvimento que tanta polémica chegou a causar.
“Os professores eram muito exigentes, embora as disciplinas não fossem muitas”, começa por contar ao i Maria Lima que, aos 59 anos, recorda o seu tempo da primária. “Não sei se em Lisboa era diferente uma vez que nasci e fui criada numa aldeia. Os professores sabiam que a nossa vida não era só aquela, havia o trabalho do campo para fazer também. Podiam facilitar em tarefas mas não facilitavam durante as aulas. Eram sagradas a atenção e a concentração”, conta-nos. Estudou até ao atual 4.º ano que na altura era o obrigatório e o resto da escolaridade veio a tirá-la mais tarde, já em adulta, por iniciativa própria. “Tenho pena de não ter estudado mais mas naquela altura as nossas obrigações eram outras”, conta-nos.
É por isso que da sua educação para a das filhas vê uma grande diferença. “Nós não usávamos mochilas com tantos livros e tantos materiais. Havia disciplinas com vários volumes de livros e ainda os cadernos de atividades”, lembra. “Para não falar no número de disciplinas que não era nada pouco”. No entanto, considera que essa mudança do seu tempo para os das filhas – hoje já na casa dos 30 – foi positiva. “Como se costuma dizer, ‘o saber não ocupa lugar’, e ainda que não usem tudo o que estudaram, sabem certamente mais que a mãe e podem aplicar os seus conhecimentos no seu dia-a-dia”.
As principais mudanças notam-se, principalmente, quando falamos com quem ainda estuda aos dias de hoje. “Conseguimos fazer muitas coisas através do computador ou do tablet, mesmo durante as aulas”, diz Ricardo, de 13 anos, ao nosso jornal. Usar computador ou tablet nas aulas há uns anos era impensável, mas hoje parece imprescindível. “Não uso muitos cadernos porque consigo anotar tudo no computador”, garante. E até os recados chegam por e-mail. Há uns anos era quase proibido andar sem a caderneta do aluno na carteira.
E se muda a forma como se estuda, também os números dos que estudam mostram mudanças. Os dados não enganam e mostram que Portugal é, hoje, um país muito mais letrado do que era há muitos anos. Dados do último relatório anual Educação em Números da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC) mostram que no ano letivo 2022/2023 estavam 1.340.413 alunos matriculados, no ensino básico e secundário, mais 12.990 do que no ano letivo anterior.
Se olharmos, por exemplo, do 25 de Abril de 1974 para cá as mudanças são muitas, como revelou a Pordata este ano. Até porque, sabe-se, o acesso ao ensino foi uma das grandes conquistas da Revolução. Em 1970, por exemplo, um em cada quatro português era analfabeto. Um valor que correspondia a 1,8 milhões de pessoas (das quais 64% eram mulheres).
Nessa altura, a taxa de analfabetismo era de 25,7%. E claro, com uma grande diferença entre homens e mulheres.
E se em 1974 apenas 18% dos portugueses chegavam ao terceiro ciclo e só 5% terminou o secundário, hoje em dia os números são totalmente diferentes: 94% da população tem o primeiro ciclo e 88% concluiu o secundário. E mesmo o ensino superior mostra evolução porque se tornou uma realidade. Em 2023, há cinco vezes mais alunos do que em 1978 (446 mil vs. 82 mil), e há mais mulheres do que homens. De acordo com os Censos de 1970, apenas 49 mil pessoas em Portugal tinham o ensino superior, não chegando a 1% da população com 15 ou mais anos. Os Censos de 2021 registaram 1,8 milhões de pessoas com este grau de ensino, o equivalente a 20% da população; 60% são mulheres.
Os dados para Portugal no que diz respeito ao ensino nem são maus. O relatório Education at a Glance 2023 da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) destacava o crescimento verificado entre 2015 e 2021 na percentagem de jovens entre os 25 e os 34 anos que concluíram o ensino superior (de 33% em 2015 para 44% em 2021), bem como a diminuição dos que não tinham qualificações de nível secundário (16 pontos percentuais, de 33% para 17%), ao passo que a percentagem de jovens entre os 25 e os 34 anos com qualificações de nível secundário aumentou 5 pontos percentuais, sobretudo em resultado do aumento da percentagem de jovens com qualificações de nível secundário profissional (de 14% para 20%). Os números adiantam que ainda há 17% da população entre os 25 e os 34 anos que não chegou sequer ao ensino secundário, três pontos percentuais acima da média da OCDE, ainda que, nos últimos cinco anos, o número de jovens adultos que não completaram o ensino secundário tenha diminuído significativamente (16%).
É que ainda existe abandono escolar que, se há uns anos era uma realidade, hoje não tanto. Números do Eurostat recentes revelam que Portugal foi o país da União Europeia (UE) onde o abandono escolar precoce mais caiu em dez anos – entre 2013 e 2023. No entanto, olhando só para o último ano, esse indicador agravou-se. Quer isto dizer que, depois de seis anos consecutivos de queda do número de alunos a abandonar a escola antes do tempo, em 2023 a taxa passou de 6,5% para 8%.