PGR: partidos garantem que não há limite de idade

A regra de aposentação aos 70 anos aplica-se ou não ao PGR? Juristas acham que sim, PSD e PS concordam em discordar desta opinião.

O novo procurador-geral da República (PGR) tem 69 anos, é procurador-geral-adjunto e está jubilado desde 2020. Desde que foi conhecida a sua nomeação pelo Governo, abriu-se nos meios político e judicial a discussão sobre se, por fazer 70 anos em 2025, Amadeu Guerra pode ou não completar o mandato. Em causa está a lei do estatuto dos magistrados que impõe os 70 anos como idade limite para o desempenho de funções. Se for tida em conta esta lei, o novo procurador atinge o limite de idade já em janeiro do próximo ano, com apenas cerca de três meses cumpridos, num mandato que é de seis anos.


Questionado sobre a eventual incompatibilidade do PGR escolhido pelo Governo, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, afastou as dúvidas alegando que o lugar de PGR é um cargo de nomeação política e não um lugar de carreira da magistratura, pelo que a lei não se aplica.
Apesar das garantias dadas pelo Governo, a verdade é que o tema continua a levantar dúvidas e, já depois das explicações, o vice-presidente do Conselho Superior de Magistratura, Azevedo Mendes, e o antigo PGR Cunha Rodrigues vieram aconselhar uma alteração ou aclaração da lei que evite problemas no futuro.

PSD e PS concordam que PGR não tem limite de idade


Questionados esta semana pelo Nascer do SOL, os deputados Pedro Neves de Sousa (PSD) e Pedro Delgado Alves (PS), ambos com assento na Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, consideraram que é uma ‘não questão’ a existência de um limite de idade para que Amadeu Guerra possa exercer o seu mandato.


«Este é um lugar de nomeação política e a pessoa indicada nem sequer tem de ser obrigatoriamente um magistrado. Se fosse, por exemplo, um advogado, em tese até poderia ter 90 anos», diz Pedro Neves de Sousa, rejeitando a hipótese de que haja um limite de idade para o exercício do cargo de PGR.


Pedro Delgado Alves concorda, acrescentando que as dúvidas que têm sido levantadas não se aplicam ao procurador já que essa «é uma lei que se aplica apenas a magistrados de carreira». Ora, apesar de Amadeu Guerra ser um magistrado, «trata-se de uma designação política e não de um lugar de carreira».


Quanto a possíveis contestações por parte de cidadãos que sejam alvo de acusação do Ministério Público, ou os seus advogados, os dois deputados não veem aí qualquer motivo de preocupação. «Isso não tem qualquer possibilidade de avançar porque o PGR nunca é o titular dos processos», refere Neves de Sousa, acrescentando que o procurador-geral da República é apenas a figura que está no topo da hierarquia e, segundo a lei, está até impedido de intervir na investigação, razão pela qual a ligação aos processos não pode ser feita.


Pedro Delgado Alves, que faz questão de dizer que se pronuncia a título individual e não em nome do Partido Socialista, faz uma comparação: «O lugar de PGR é semelhante ao dos juízes do Tribunal Constitucional (TC), ou seja, são lugares de indicação política (no casos dos juízes do TC, por eleição direta da Assembleia da República e, no caso do PGR, por indicação do Governo e nomeação do Presidente da República). Em nenhum destes lugares há limite de idade», garante.


Os dois deputados não veem motivo para questionar a legitimidade de Amadeu Guerra a partir do momento em que o magistrado cumpra os 70 anos, pelo que não é provável que venha a haver qualquer alteração ou aclaração à lei que regula a carreira dos magistrados. «Isto não é uma questão de magistratura. Além disso, se porventura essa alteração fosse feita, seria até duvidoso, porque não se pode legislar ad hominem», acrescenta o deputado social-democrata que coordena o PSD na comissão parlamentar de assuntos constitucionais.

Conhecer os cantos à casa


Amadeu Guerra, por enquanto, está em estado de graça. Com quatro décadas ao serviço da magistratura do Ministério Público, conhece bem os quatro cantos à casa. Foi magistrado no Tribunal do Trabalho e no Tribunal Criminal da Boa Hora, ambos em Lisboa. Foi vogal da Comissão Nacional de Proteção de Dados e procurador-geral adjunto e coordenador do Tribunal Central Administrativo do Sul. Além disso, exerceu vários cargos ao nível da União Europeia, em organismos como o Grupo de Trabalho de Polícias e a Instância Comum de Controlo da Europol.


Mas foi enquanto diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) – o departamento da Procuradoria-Geral da República que coordena a nível nacional e realiza a investigação da criminalidade mais complexa e altamente organizada – que deixou a sua impressão digital mais forte. Nos seis anos em que esteve à frente do DCIAP, ali foram investigados casos como o roubo das armas de Tancos, o BES, o processo Aquiles (no âmbito do qual foi condenado Carlos Dias Santos, ex-coordenador de investigação criminal da Polícia Judiciária, por auxílio a organização criminosa) e a Operação Marquês.


Mas é na Operação Marquês que se escondem, por enquanto, os seus inimigos. Aqui, está em causa não apenas a corrupção de um primeiro-ministro, mas também um conjunto de factos e uma teia alargada de interesses e ligações que abalaram o regime. Por isso, a ver vamos.