Adiar, só nos descredibiliza!

Um país que demora bem mais de 50 anos a decidir a localização de um aeroporto, pode ser chamado de ‘país europeu’? Infelizmente é o nosso.

1. Um destes dias, numa ida ao Alentejo para tratar das minhas ‘azêtonêras’, ao passar ali pelas bandas de Alcochete, diz-me a minha Mulher: «Quando penso que há mais de 50 anos o meu Pai (trabalhava na TAP) entrou em casa todo preocupado porque iria ter de procurar casa ali para as bandas de Rio Frio, por causa da mudança do aeroporto…». Desatámos a rir!

Se pensássemos um pouco deveríamos chorar. Um país que demora bem mais de 50 anos a decidir a localização de um aeroporto, pode ser chamado de ‘país europeu’? Infelizmente é o nosso, incapaz de tomar uma decisão estratégica desta envergadura. Como é evidente, aqui se demonstra que ‘bem pior que uma decisão errada, é adiarem-se decisões’. Na verdade, adiamos sem razão ou com demasiadas ou insondáveis razões para adiar, no fundo demonstrando muita incompetência de quem nos governa há décadas.

Imaginam empresas de sucesso a adiar decisões estratégicas durante dezenas de anos? Nem por dois ou três anos sequer ou são ultrapassadas pela concorrência. Aqui nesta matéria não há esse risco, mas mais depressa os espanhóis fazem um aeroporto em Badajoz do que seremos capazes de decidir onde localizar o novo aeroporto. Risível para qualquer estrangeiro, um encolher de ombros generalizado em Portugal pelo torpor que nos tolhe, pela indiferença com que os eleitores valorizam estas indecisões, esquecendo os milhões de euros enterrados em estudos, para gáudio dos seus autores, que os impostos coletivos amargamente suportam.

Tal como na Saúde, ouçam-se os especialistas e decida-se. Muitos dos que percebem do assunto, defendem Alcochete (apesar de se apontar um custo superior) e, alguns, até Alverca. Montijo é solução económica, mas não parece ser a solução de futuro. Na minha vida profissional, algo aprendi: decisões estratégicas não se podem adiar! Ou ainda: se é para fazer, faça-se bem feito, encontre-se a melhor solução e vejamos como a poderemos financiar. Chumbado Montijo por duas autarquias obrigatórias de ouvir, avancemos para uma alternativa (Alcochete?), pensando exclusivamente no interesse público, sem considerar interesses privados. 

Mas avancemos, ou daqui por 50 anos os meus netos acrescentam mais outra estória às preocupações do meu sogro há mais de 50 anos.

2. A Justiça anda pelas ruas da amargura, sobretudo entre o povo que não compreende certas decisões que os advogados pagos a peso de ouro interpretam judiciosamente, falando de cátedra para o povo atónito. A ideia, justa ou injusta, perpassa nas redes sociais e nas ruas: os ricos e os poderosos estão acima da Lei! Bem podem os advogados arguirem que a justiça tem os seus trâmites que o povo não compreende como nuns casos até é célere e noutros não, sobretudo quando envolve gente poderosa em que a estratégia é adiar e obviamente há processos a ‘caírem’ por prescrição.

Não há fumo sem fogo e há demasiados anos que se fala da necessidade da reforma da Justiça para acelerar as decisões dos tribunais e do reforço de meios para o Ministério Público. Aqui, todos os partidos que têm sido Governo são culpados. A vontade de mudar não é percetível e a democracia leva tratos de polé. Os extremos políticos agradecem as benesses que os democratas lhes concedem para ganhar votos, como se viu na tempestividade das reações dos partidos às decisões do julgamento, perdão, da instrução, de Ivo Rosa. Se a Relação irá destruir estas decisões, em parte ou no todo, saberemos daqui a mais uns tempos. 

Mas algo sabemos: passa um tempo precioso para quem opta pela prescrição como estratégia ‘core’ dos julgamentos e fica com menos tempo quem gostaria de ver mais justiça com menos tecnicalidades.
 
P.S. 1 – Leio a lista das comissões pagas pelos clubes de futebol publicada pela Federação Portuguesa de Futebol e só me ocorre perguntar: até quando os clubes portugueses, financeiramente débeis e depauperados, continuarão a encher os bolsos aos empresários? Ou que interesses existirão para se manter este ‘status quo’? Sem comentários adicionais, limito-me a referir que, segundo os números oficiais da FPF, desde a época 2016/17 até 2020/21, o Benfica pagou Eur 124,1 milhões, o Sporting ‘apenas’ Eur 54,3 milhões e o FC Porto ‘anda pelo meio’ com Eur 70 milhões. 

P.S. 2 – João Ferreira, personagem que considero bem simpática (como Jerónimo, aliás) vai pela 6.ª vez em 8 anos a eleições como cabeça de lista do PCP e sempre com resultados ‘aquém das expectativas’. Caramba, o PCP não tem mais ninguém? Ainda por cima nestas eleições para a CML em que a esquerda se precisa de unir à volta de Medina ou a CML pode vir mesmo a cair para Moedas? Não têm consciência que estão a colar a imagem de um derrotado a um futuro candidato a secretário-geral?