José Magalhães volta a falar em cacetes e algemas para membros do PSD

Magalhães apelou à violência e manteve a sua posição. Ventura gostou e convida-o para “reunião”.

Após o apelo de José Magalhães a “cacetes terapêuticos” aos membros do PSD Seixal que decidiram alterar placas toponímicas naquele concelho, André Ventura viu na autoridade defendida por José Magalhães uma mais-valia para o seu partido e convidou-o para uma “reunião” de recrutamento para o Chega. Em declarações ao i, André Ventura, embora dizendo-se surpreendido com a posição do deputado socialista, afirmou-se confiante na mutação de José Magalhães para uma “versão 3.0” – a “versão Chega”.

A Polémica Na madrugada de domingo para segunda-feira, o PSD Seixal, com o anunciado “objetivo de limpar o comunismo” da cidade, procedeu ao ‘rebatismo’ de cinco placas toponímicas que consideravam de esquerda (incluindo uma com o nome de Camões) para outros mais “apropriados”. Fizeram-no pela calada, durante a noite, sendo que na manhã seguinte espalhafataram as suas façanhas nas redes sociais. O atentado toponímico e tamanho espalhafato levou a reações imediatas, sobretudo à esquerda – tal como o i noticiou na sua edição de ontem: em comentários numa publicação do Facebook, Rui Francisco, vereador comunista em Odivelas, queria “ir as trombas” ao PSD Seixal e José Magalhães, deputado socialista, questionava se “uns cacetes terapêuticos não resolveriam o problema”. Neste contexto, o PSD apresentou uma queixa-crime contra ambos e pediu proteção policial para Bruno Vasconcelos, dirigente do PSD Seixal. E é aqui que a porca torce o rabo: se, por um lado, o vereador comunista apagara o seu comentário e confessara ao i ter-se “arrependido automaticamente”, já Magalhães não só não o apagou, como, à Lusa, o cimentou com as seguintes palavras: “A terapia do cacete deve ser preventiva. Se os desordeiros, ao chegarem ao lugar onde querem violar a lei, encontrarem a autoridade pública de olhos abertos e cacete à cintura, atrevem-se? Quem diz cacete diz algemas. Quanto às queixinhas, sejam homenzinhos e tenham modos! Putos medricas dão pena”.

Poderão estas palavras de José Magalhães ser consideradas perigosas e irresponsáveis? Será que o deputado já está há tantos nos meandros de poder – há quase 40 que é deputado (com interrupções) – que se sente inimputável? Será que o seu discurso – que afirma que devemos “ser homenzinhos” e que os “putos medricas dão pena” – cabe na sociedade que está a desconstruir os conceitos de género, a apontar o dedo à masculinidade tóxica e a combater o bullying como nunca antes? Caberá a atitude de José Magalhães na política do século XXI?

“Inimputabilidade é muito comum no PS” No entender de Carlos Guimarães Pinto, fundador do Iniciativa Liberal, o “sentimento de inimputabilidade é muito geral e muito comum em alguns deputados do PS”. Ao i, conta já o ter notado também noutros deputados socialistas, como “Ascenso Simões e o próprio João Galamba”. Para o antigo líder do Iniciativa Liberal, o “PS está há demasiado tempo no poder e isso faz crescer um sentimento de inimputabilidade que atravessa o partido”, fazendo notar-se mais “nas personagens com o caráter mais propenso a esse tipo de atitudes”. 

Uma visão corroborada por Francisco Camacho, líder da Juventude Popular. Ao i, explica estarmos “perante mais um caso de prepotência grosseira a que o Partido Socialista e muitos dos seus representantes nos têm habituado nos últimos ano”. Notando estarmos num tempo em que “oportunamente se identificam as ameaças às democracias liberais”, afirma ser “surpreendente” alguém estar no hemiciclo há 12 legislaturas e ter “uma cultura democrática tão hostil, primária e iliberal”. 
Também André Ventura vê na longevidade parlamentar de José Magalhães um problema: “Já devia estar há muito tempo fora dos corredores da Assembleia da República, afinal 1977 já é muito longe”. 

Relativamente ao vocabulário utilizado por José Magalhães – “dar cacetes terapêuticos”, “ser homenzinho” ou “os putos medricas dão pena” –, Guimarães Pinto considera que “não devemos ir para um extremo nem para outro: nem para o snowflake, em que tudo é ofensivo, nem para o extremo em que se pode dizer tudo e insultar à vontade”. Explica não gostar do “controlo de linguagem”, que considera “negativo”: “Acho que é bom que os políticos tenham alguma liberdade na linguagem que usam”. Contudo, atribui-lhes balizas: “Sem insultar, sem instigar à violência, sem irem pelo caminho da infâmia e sem irem pelo caminho da difamação”. Para Guimarães Pinto, “todos temos dias maus” e não “faz sentido nenhum eliminar uma pessoa do espaço público por qualquer coisa que digam”. Quanto à eventual masculinidade tóxica presente no discurso de José Magalhães, Guimarães Pinto, apesar de considerar que estas expressões “já não fazem muito sentido”, sai à defesa do socialista, explicando serem “expressões do tempo dele”. “Não aprovo o sentido das palavras, mas não é o mesmo avaliar o que dizem as pessoas de 60 anos e as pessoas com 20 anos. Se fosse uma pessoa 40 anos mais nova dar-lhe-ia outro significado. Usou uma expressão que há 30 anos ninguém reagiria. Usou-a a vida toda e esta só ganhou um significado diferente nos últimos dez anos: no caso dele compreende-se. Temos de ter a capacidade de avaliar subjetivamente esse tipo de coisas”. Para o professor de Economia, devemos, sim, julgar “a forma agressiva” das declarações, “independentemente da expressão que usa”.

“José Magalhães tem toda a razão” Já André Ventura, embora se mostre surpreendido por estas palavras virem de José Magalhães, admite ao i rever-se nelas: “Quanto aos putos medricas, tem toda a razão, dão pena. Mas isso não parece do José Magalhães, mais parece um porta-voz do Chega”. Vai mais longe e… convida Magalhães para juntar-se ao seu partido: “Se ele quiser ter uma reunião comigo para esse efeito, temos as portas abertas. Aliás, gostamos da ideia dos cassetetes e da autoridade… Não parece é muito do José Magalhães! Pode ser que haja uma versão José Magalhães 3.0, a versão Chega, essa seria muito mais interessante para os portugueses”. 

Francisco Camacho, por sua vez, considera que o discurso de José Magalhães “é própria de quem lida mal com as instituições e aprova a autoridade em função do seu gosto”. Considera que o conteúdo é “típico dos tempos em que a esquerda acreditava na reeducação revolucionária do proletariado com base na coação” e que José Magalhães “dá força ao preconceito geracional ao tentar desqualificar os membros do PSD em função da sua idade” (que realça não deixar de ser uma “postura curiosa face à imaturidade da sua reação”). O jovem Camacho, que evidencia estas declarações estarem “alinhadas com a desconfiança injustificada com que se encara as novas gerações e sua participação democrática”,  acusa o deputado de “ausência de senso” e pede a António Costa e a Ana Catarina Mendes que dele se demarquem “categoricamente”. De outro modo, explica, “serão coniventes com uma visão de partido e do Parlamento que alberga gente que não sabe estar em democracia”.