Gerir a crise nos bastidores

Na busca de uma solução para a crise no BES, a ministra das Finanças e o vice-primeiro-ministro estiveram sempre na mais estrita articulação. E o Governo procurou gerir as reacções políticas e a comunicação de forma a evitar que o pânico se instalasse.

Gerir a crise nos bastidores

Por essa razão, assim que foi anunciado pelo governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, o plano de recapitalização do BES no domingo à noite, a ministra das Finanças reagiu de imediato mas em comunicado. No texto, Maria Luís Albuquerque garantiu que “a solução de financiamento encontrada – um empréstimo do Tesouro ao Fundo de Resolução a ser reembolsado pela venda da nova instituição e pelo sistema bancário – salvaguarda o erário público” e acrescentou que “os contribuintes não terão de suportar os custos relacionados com a decisão” e que “a nova instituição será detida integralmente pelo Fundo de Resolução”.

E no dia seguinte foi a vez do primeiro-ministro surgir, em traje descontraído e em plenas férias no Algarve, a afirmar que a solução encontrada é a que “melhor defende os contribuintes”, sublinhando ainda que foi “favoravelmente” recebida pelos mercados. 

Uma fonte da maioria de Governo justificou ao SOL esta opção com o objectivo de tentar evitar alarmismos. “Se a ministra tivesse dado uma conferência logo às 23h no domingo após o anúncio do governador do Banco de Portugal isso sim é que poderia fazer com que houvesse uma corrida às agências do banco na manhã de segunda-feira”, contra-ataca a mesma fonte.

A reacção dos governantes foi em cadeia e o mais tranquila possível. Também na segunda-feira à noite, Maria Luís deu uma entrevista à SIC, onde defendeu que “tem de haver punições severas, contra-ordenações em matéria que é competência dos reguladores, uma investigação judicial que seguirá os seus termos”.

Já na terça-feira surgiu então o vice-primeiro-ministro (um dos governantes, a par da ministra das Finanças, para quem Passos Coelho remeteu mais esclarecimentos sobre o assunto quando falou logo na segunda-feira) a sustentar que a solução de dividir o BES em dois foi a “mais aceitável” de entre as possíveis, acrescentando que nacionalizar a entidade bancária seria uma “tragédia”. “Nacionalizar é passar para o contribuinte a factura do prejuízo”, reforçou Paulo Portas.

Ainda na resposta às críticas da oposição, outra das preocupações da maioria PSD/CDS foi evitar quaisquer acusações de promiscuidade. “Caso a ministra das Finanças aparecesse ao lado do governador do Banco de Portugal a anunciar ao país a solução para o BES, haveria logo leituras de promiscuidade entre o Governo e o regulador”, alega um dirigente do PSD.

PS cada dia mais descomprometido

A primeira reacção dos socialistas à intervenção no BES foi de apoio ao Governo. Mas ao longo da semana a posição dos socialistas foi-se tornando mais crítica. “A solução anunciada pelo Governador do Banco de Portugal e pelo Ministério das Finanças cumpre para já a exigência do PS”, afirmou o secretário nacional do PS Eurico Brilhante Dias, designado por António José Seguro para a primeira reacção. Muito embora tenha levantado questões que precisavam de ser esclarecidas pelo Executivo.

Na quarta-feira, o PS pôs-se à margem. Primeiro António Costa, na entrevista à Visão. “Pode ser que tudo corra bem. Espero que sim. Mas não é a solução mágica que nos apresentaram”. “Quem paga os juros e quem tem de pagar o empréstimo? O Estado, logo, os contribuintes”. 

Seguro, em simultâneo, deu uma conferência de imprensa no Rato, parecendo reflectir o distanciamento costista. Levantando dúvidas sobre as condições do empréstimo (“É preciso que todos nós tenhamos uma atenção e um cuidado muito grande em seguir esse dinheiro de modo a que os contribuintes não venham a ter mais surpresas”). E atacando a demora da regulação e do Governo em reagir à crise. “Tem que haver o apuramento de responsabilidade e tem que haver responsáveis, tem que haver caras”, exigiu. 

Ontem, na audição da ministra das Finanças sobre o BES, o líder parlamentar Alberto Martins foi directo nos ataques políticos. A quebra do BES demonstra “o falhanço da supervisão bancária, o falhanço da troika – que esteve sem ver nada durante três anos – e o falhanço do Governo”, disse.

sofia.rainho@sol.pt

manuel.a.magalhaes@sol.pt