António Guterres percebeu que o seu sonho de vir a ser designado Secretário-Geral das Nações Unidas é actualmente uma impossibilidade objectiva. Os pretendentes são muitos, têm mais peso que Portugal – e não é sequer certo que o próximo nome escolhido para o exercício deste cargo provenha do continente europeu. Guterres, embora tenha recebido o apoio do Governo Português e do próprio Passos Coelho, já terá sondado várias pessoas nos meandros da organização internacional que regula as relações entre as Nações: todas muito cépticas quanto ao sucesso da sua candidatura a Secretário-Geral. Guterres – como é seu hábito – joga, assim, pelo seguro: troca o cargo que ambicionava, que desejava muito ser – pelo cargo que, embora não o entusiasme, serve para encerrar a sua carreira política de forma sossegada. No fundo, para Guterres, escolher a candidatura a Presidência da República foi como escolher entre ir de férias para um hotel de luxo na Califórnia ou para a casa da sua família em Castelo Branco. Guterres preferiria ir para a Califórnia, mas, não podendo, lá vem para Castelo Branco (que remédio!). Confirma, pois, a tese de que Guterres quer imitar o percurso político de Cavaco Silva- Guterres acha que merece terminar a sua carreira em Belém, pois julga que foi o melhor Primeiro-Ministro da história de Portugal (pântano? O país está no pântano? Vou-me embora que Portugal caiu no pântano? Ah, desse “pequeníssimo pormenor”, Guterres já se esqueceu…);
António Guterres realizou que este era o timing adequado para aparecer. O momento em que poderia capitalizar mais popularidade. Porquê? Primeiro, porque o PS vive um momento de grande tensão –e Guterres é o único elemento de união entre António Costa e António Seguro. Em segundo lugar, porque a direita está dividida quanto ao candidato a apoiar. O PSD está dividido – a direcção parece querer apoiar um candidato e os militantes e os dirigentes das estruturas locais querem outro (Santana Lopes no primeiro caso; Marcelo Rebelo de Sousa, no segundo). E o PSD ainda não se meteu com o CDS – que quer Marcelo Rebelo de Sousa. O que significa que Pedro Santana Lopes, ao querer avançar e dividir o espaço político do centro-direita por mero capricho pessoal, objectivamente, está a fazer um favor enorme a António Guterres! Em terceiro lugar, em virtude da circunstância de António Guterres considerar que teria de criar um facto político rapidamente para impedir que o caso BES o contagiasse politicamente. Porquê? Muito simples: porque a promiscuidade do poder político com o poder financeiro, designadamente com o BES, atingiu o seu grau máximo com Guterres. Esta personalidade socialista foi o responsável pela criação do epíteto de “Dono Disto Tudo” atribuído a Ricardo Salgado. Aquilo que nós, portugueses, estamos a viver é o desmoronamento do Portugal construído por António Guterres – que se revelou insustentável e cheio de casos de falta de transparência e abuso de poder (para não dizer coisas muito piores…);
Por último, António Guterres considera que o momento adequado para se assumir como candidato é aquando da sua saída de um cargo internacional que não implica a tomada de decisões impopulares. Assim, Guterres quer aproveitar a boleia de popularidade que lhe é dada pelo seu cargo de Alto-Comissário para os refugiados na ONU.
Quanto ao calendário de António Guterres, é fácil antecipar o filme: em Novembro, regressa a Portugal, desdobrando-se em entrevistas de balanço da sua actividade na ONU até ao Natal; em Janeiro, dá uma grande entrevista de vida e começa a ajudar António Costa a afirmar-se como líder do PS; muito provavelmente, em Março, Guterres anunciará a sua candidatura (o anúncio terá de ser antes das eleições legislativas: Guterres não quer correr o risco de uma derrota menos expressiva no PS com os danos colaterais que tal poderia acarretar); as eleições legislativas, com grande probabilidade, serão antecipadas pelo Presidente da República para Maio; no Verão, Guterres lança um biografia oficial; e depois, inicia a volta pelo país. Este é o roteiro que Guterres tem na cabeça, sempre aconselhado pelo seu amigo Jorge Coelho. Que regresso tão bom para a política portuguesa! Afinal, a culpa morre sempre solteira para os políticos portugueses….