Remodelação impossível

Nem o CDS acreditou numa remodelação alargada. Apesar de entre os centristas haver o desejo de refrescar o Governo, até no partido de Paulo Portas se percebeu desde logo que a saída de Miguel Macedo por causa do escândalo dos vistos gold nunca seria o momento para Passos Coelho fazer mudanças de fundo.

Remodelação impossível

“É claro que no CDS se queria uma remodelação, mas quem manda é o primeiro-ministro e já se percebia que isso não ia acontecer”, admite um destacado dirigente do CDS, acrescentando que o desejo de mudança existia, contudo, não só entre centristas. “Vários dirigentes do PSD comentaram comigo que gostariam que houvesse uma remodelação. Mas ninguém ficou surpreendido”. 

Uma fonte centrista do Executivo explica que até o facto de a pasta em causa ser a Administração Interna (MAI) fazia prever este desfecho. “Talvez só nas Finanças fosse tão ou mais urgente substituir um ministro demissionário como no MAI. O tempo de substituição nunca seria compatível com uma remodelação alargada”, aponta a mesma fonte.

No PSD, o sentimento é idêntico. “Uma remodelação serve para ganhar fôlego político. Fazê-lo a reboque de uma saída motivada por um processo judicial seria a pior asneira possível”, diz um vice-presidente social-democrata.

Por outro lado, a defesa pública que Passos fez dos ministros mais fragilizados do Executivo retirou-lhe margem para agora os afastar. “Já reafirmou a confiança em Nuno Crato e deu a entender que Paula Teixeira da Cruz é inamovível. Como poderia agora substituí-los?”, questiona o dirigente do PSD.

Avesso a mudanças de equipa, Passos queria, de resto, segurar Miguel Macedo. Prova disso foi o tempo que demorou a aceitar o pedido de demissão. 

Macedo disse que queria sair logo na sexta-feira, menos de 24 horas depois das notícias sobre o processo dos vistos gold. Mas Passos pediu-lhe para ponderar durante o fim-de-semana e só aceitou a saída no domingo, depois de perceber que a decisão de Macedo era irredutível. O ministro tinha chegado à conclusão de que estava “diminuída” a sua autoridade no Ministério e de que seria um erro político não sair.

Curiosamente, a saída de uma figura destacada do PSD, como Miguel Macedo, deu lugar à entrada de uma independente. Com esta alteração, o CDS sai por cima na relação de forças dentro da coligação.

Até a preocupação de manter os secretários de Estado – para garantir a continuidade das políticas – teve o efeito de segurar João Almeida, uma figura destacada do CDS e do círculo mais próximo de Paulo Portas, no MAI.

Por outro lado, mesmo que quisesse mexer no elenco governativo, Passos seria quase forçado a manter todos os ministros centristas. Com os casos mais polémicos a caírem sobre ministros sociais-democratas, do lado de Portas não havia sinais de estar disposto a mudar os rostos do CDS no Governo.

CDS aliviado com escândalos todos do lado do PSD

Entre os centristas não se esconde, aliás, o alívio por o ónus das polémicas estar todo do lado do PSD. E nem o episódio de um suposto atirar de culpas de Luís Montenegro para Paulo Portas no caso dos vistos gold alterou essa satisfação.

Uma fonte da maioria conta que o comentário do líder da bancada do PSD, remetendo os esclarecimentos sobre o caso para Portas, foi uma “escolha infeliz de palavras” e não mais do que isso.

Montenegro tinha, aliás, combinado com Nuno Magalhães anunciar em conjunto a decisão de viabilizar o pedido do PCP para a audição de Portas – que decorreu ontem – no Parlamento. E só a tentativa de justificar o motivo pelo qual seria Portas e não Miguel Macedo a dar explicações aos deputados fez Luís Montenegro identificar o líder do CDS como “o porta-voz do Governo” indicado para falar sobre vistos dourados.

Portas não tem, porém, qualquer responsabilidade no programa de vistos, que é tutelado conjuntamente pelo MAI, pela Justiça e pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros. Motivo suficiente para o líder da bancada do PSD ter acabado por ligar a Nuno Magalhães para pedir desculpa, enterrando o assunto da gaffe sem mais consequências políticas.

Os centristas defendem, de resto, que a ida de Portas à Assembleia foi até um bom momento para demonstrar que, mesmo sendo “o pai da ideia” dos vistos gold, o líder centrista é alheio a qualquer suspeita de corrupção.

margarida.davim@sol.pt e sofia.rainho@sol.pt